O Comitê Paralímpico Brasileiro vai reeleger nesta segunda-feira o presidente Mizael Conrado para um novo mandato de quatro anos. Ex-atleta de futebol de 5 (para cegos) e bicampeão paralímpico, ele será eleito por aclamação, assim como aconteceu em 2017. O primeiro mandato começou com expectativa de alcançar marcas históricas e com o desafio de arcar com a manutenção milionária do Centro de Treinamento, inaugurado em maio de 2016, em São Paulo. Terminará com as contas em dia e com um projeto ambicioso de licenciar produtos relacionados à modalidade, como uma animação de super heróis deficientes. Mas também existe a frustração pelo adiamento da competição mais esperada, os Jogos Paralímpicos de Tóquio, e a incerteza sobre renovação dos patrocinadores.
O ano de 2020 chega ao fim, mas ainda cheio de desafios. Há um grande ponto de interrogação de como serão os preparativos finais da delegação brasileira antes do início do evento no Japão. As dúvidas dizem respeito a como será aclimatação e a meta de terminar entre os dez primeiros no ranking de medalhas. Por enquanto, há pouca coisa de concreto. As passagens aéreas dos atletas não foram compradas ainda, por exemplo.
"Tóquio não definiu seus protocolos. Tudo é especulação. Temos de esperar. Temos de fazer o que está ao nosso alcance. Se preocupar com o que não se tem controle é perder energia. A única coisa que penso é deixar os atletas prontos com o que temos no momento", disse Mizael Conrado, em entrevista ao <b>Estadão</b>.
Até o adiamento dos Jogos, o planejamento do CPB seguia o enredo que talvez nem o mais otimista dos dirigentes poderia imaginar. Os Jogos Parapan-Americanos de Lima, no ano passado, provaram que o trabalho estava dando resultado. O Brasil bateu recorde de medalhas entre todas as participações anteriores, com marcas inéditas também de conquistas de ouro. Foram 308 pódios, sendo 124 em primeiro lugar.
No Mundial de Atletismo, o Brasil terminou em um inédito segundo lugar no quadro de medalhas, com 39 pódios, sendo 14 deles no lugar mais alto. "Todos os países foram com times completos. Os Mundiais espelham o que acontece nos Jogos Paralímpicos. Terminamos com 14 ouros, a mesma quantidade de ouros do total conquistado nos Jogos do Rio. Havia a convicção de fazer dos Jogos de Tóquio algo épico", diz Mizael, agora sem saber como a disputa será.
ANTES E DEPOIS DO CT – A gestão de Mizael começou praticamente ao mesmo tempo do fim da construção do Centro de Treinamento Paralímpico, obra que ele ajudou a pensar e tirar do papel enquanto era vice-presidente nos dois mandatos de Andrew Parsons (2009 a 2016), brasileiro hoje mandatário do Comitê Paralímpico Internacional (IPC).
Existe um esporte paralímpico antes e depois da construção do CT, que fica na rodovia dos Imigrantes, em São Paulo. Por causa de sua construção, o CPB mudou sua sede de Brasília para a capital paulista. E, pela primeira vez em sua história, a entidade passou a gerir um espaço com custo fixo de R$ 30 milhões por ano – o edital de gestão da área foi assinado com o governo do Estado de São Paulo em outubro de 2017 e tem validade de cinco anos, com possibilidade de renovação por mais cinco.
De uma entidade de 89 funcionários no Distrito Federal, hoje conta com 280 pessoas. A meta inicial era ter 30% das vagas do CPB oferecidas a pessoas com deficiência. O número hoje está na casa dos 25%. No local, treinam diariamente as seleções permanentes de natação, atletismo e tênis de mesa do País. As outras modalidades utilizam o espaço uma semana por mês, quando suas respectivas federações convocam as seleções.
FORMAÇÃO E INCLUSÃO – Além de ser exemplo de inclusão, o Cento de Treinamento também nasceu com o objetivo de oferecer capacitação para formação de atletas e de auxiliá-los fora do treino. Entre 2018 e 2019, foram oferecidas 300 bolsas para universidades. Um outro programa espera, até 2025, capacitar 100 mil professores de educação física para trabalhar com atletas deficientes. Mizael olha para isso como um marco de sua gestão, que poderá se repetir por mais quatro anos.
"Em 2017, elaboramos um plano estratégico compreendendo os dois próximos ciclos paralímpicos (2020 e 2024). O grande objetivo, além dos resultados esportivos, era agregar questões importantes, como o tema da inclusão", conta Mizael. O Comitê visa estimular a participar de atletas o tempo todo. O CPB passou a priorizar o treinamento de pessoas com deficiências severas e a incluir mais mulheres no treinamento – a participação feminina aumentou em 20% nos últimos quatro anos. Também foi criado o Centro de Formação, que até o início da pandemia atendia cerca de 600 crianças. O programa foi cancelado até março do próximo ano por causa do coronavírus e 35 professores tiveram de ser demitidos.
Outro programa de formação impactado foi o Festival Paralímpico. No ano passado, o evento teve a participação de 10 mil crianças e aconteceu simultaneamente em 48 cidades. Neste ano, ele precisou ser feito online por causa da pandemia.
Os atletas de outros Estados também não tiveram a oportunidade neste ano de participar do Camping Paralímpico, quando competidores e técnicos de outras regiões do País são convidados a passar dez dias no CT. Nesse período, são avaliados pelos profissionais do CPB e voltam para casa com protocolo nutricional e de treinamento. O programa acontece nas férias escolares, em janeiro e julho. No primeiro momento é feita a avaliação e depois a continuidade para acompanhar o resultado.
NOVAS FORMAS DE ARRECADAÇÃO – Apesar de todos os problemas, a pandemia não deve ter grande impacto nas contas do CPB. A entidade deve faturar cerca de R$ 185 milhões em 2020, com 80% do valor vindo das loterias – via lei Agnelo Piva. Também patrocinam a entidade a Toyota, Braskem, Ajinomoto e Caixa Econômica Federal. A principal preocupação para o início do novo mandato é a renovação com a Caixa. O contrato termina em março. "Estamos agora em fase de negociação com boas perspectivas", disse Mizael.
Em 2021, o CPB pretende ainda mudar a maneira como arrecada verbas. A principal novidade será a criação de uma área para licenciamento de produtos, algo como a Turma da Mônica faz. Criar produtos relacionados ao tema da inclusão é seu desafio. A primeira ação será o lançamento de uma série com 26 episódios de uma animação para crianças. "Pensamos em licenciar produtos do público infantil à maioridade. Estamos no processo de aprovar a marca dos produtos infantis. Queremos ressignificar a busca por recursos em um projeto que pensa no prazo de 10 a 12 anos."
O projeto de animação está em fase de capacitação financeira e de licenciamento da marca. O nome do CPB não será diretamente vinculado na ação. A expectativa é que tenha um custo de R$ 5 milhões por temporada. Mizael fala em criar super heróis deficientes e colocá-los no mercado.