Um grupo de mães e pais vai entrar esta semana com uma ação popular contra a Prefeitura de São Paulo para pedir a abertura das escolas particulares e públicas para aulas regulares ainda este ano. Em uma semana, mais de 8 mil pessoas assinaram o manifesto que apoia o movimento. A capital só permite atividades extracurriculares para o ensino infantil e fundamental – o médio foi liberado para aulas no dia 3. Com a piora da pandemia no Estado, o grupo teme que o prefeito reeleito Bruno Covas (PSDB) queira fechar as escolas novamente.
A mobilização surgiu na semana passada em um grupo de WhatsApp de pais da Saint Pauls School, escola britânica de elite da capital. Eles então se organizaram, procuraram ajuda jurídica e começaram a rodar um abaixo-assinado para outras escolas de São Paulo. Entre as cerca de 20 autoras da ação há mães de Miguel de Cervantes, Porto Seguro, Chapel School, Avenues, Santa Cruz, Viva, Gracinha, Pentágono, Mobile, Dante, entre outros. Responsáveis de alunos de escolas estaduais também assinaram o manifesto.
O grupo entende que há segurança para manter a educação funcionando, desde que respeitando os protocolos sanitários e o distanciamento. Eles se baseiam em pesquisas científicas que indicam que crianças transmitiriam menos o coronavírus e têm menos complicações. Grupos de pediatras da capital também divulgaram nota na semana passada com o mesmo pedido.
"As mães inicialmente estavam muito bravas com as escolas e aí começaram a entender que há decisões governamentais por trás e que, como sociedade civil, podíamos lutar contra", diz a administradora e uma das autoras da ação Lana Romani, de 43 anos, mãe de três filhos em escolas particulares da capital. "Sabemos que somos privilegiadas, que nossos filhos podem fazer aulas online com todo conforto, mas nosso pleito é por todas as escolas. Os impactos vão ser sentidos numa geração inteira." Para ela, há uma "inversão de valores", já que restaurantes, bares e festas estão sendo permitidos pela Prefeitura, enquanto a educação não é liberada para dar aulas e apenas para atividades extracurriculares, que não suficientes.
Os exemplos vindos da Europa nesta segunda onda ajudaram a fortalecer o argumento. Em outubro, quando países como França, Alemanha, Bélgica e Inglaterra voltaram a fazer lockdown e a fechar bares, restaurantes e academias, as escolas permaneceram abertas. Autoridades como o presidente francês Emmanuel Macron e a chanceler Angela Merkel defenderam publicamente a manutenção da educação, entendida como prioridade para o desenvolvimento das crianças e dos países.
No Brasil, as escolas fecharam logo no começo da pandemia, no meio de março. Mas uma nova posição também tem ganhado força no País. Segundo apurou o Estadão, o governo de João Doria também estuda permitir que a educação continue funcionando mesmo com possíveis restrições que devem ser anunciadas esta semana com a piora nos índices da covid-19. No entanto, a Prefeitura pode ser mais restritiva, como já ocorreu na primeira liberação das escolas feita pelo Estado em setembro, não acompanhada pela capital.
No Rio Grande do Sul, o governador Eduardo Leite (PSDB) mudou as regras na semana passada e autorizou que as escolas permaneçam abertas mesmo durante a fase vermelha no Estado, considerada de alto risco de contágio. Até então, a educação só podia funcionar quando as regiões estivessem na etapa de risco médio. Em live, ele disse que "saúde não é apenas não contrair o vírus" e, sim, garantir o desenvolvimento cognitivo, emocional e nutricional das crianças. Cerca de 35% da população gaúcha está em áreas de bandeira vermelha.
<b>Lockdown</b>
Segundo o advogado do grupo, Daniel Neves, também pai assinante do manifesto, a ação vai se basear na quebra de isonomia e irrazoabilidade. "Tudo está liberado, esportes coletivos, festas, fica muito claro que são dois pesos e duas medidas", diz. "Não estaríamos brigando se houvesse um lockdown, o que não dá para aceitar são todos os ramos de atividade funcionando plenamente e não as escolas".
Para a designer Patrícia Leme, de 47 anos, mãe de dois alunos do Dante, é preciso passar uma mensagem contundente para a sociedade de que "as crianças não podem estar no fim da fila". Mesmo que o grupo não ganhe a ação agora, elas dizem que continuarão pedindo a abertura para 2021, o que inclui exigir que o poder público invista para preparar as escolas estaduais e municipais para cumprir os protocolos. "As mães precisam ficar mais confortáveis em lutar." O texto do manifesto pede a "retomada gradual das atividades escolares regulares presenciais em todas as escolas do Município que se adequarem aos protocolos de higiene e distanciamento" e diz que cabe "às famílias a decisão sobre levar seus filhos para a escola."
Outra coordenadora do grupo, a advogada Isabel Quintella, de 41 anos, mãe de duas filhas, diz que ainda há falta de informação dos que afirmam que seus filhos só voltarão para a escola "depois da vacina". "Muitas mães sequer sabem que as crianças não serão vacinadas tão cedo", diz. "Hoje já sabemos como funciona um pouco melhor a pandemia, podemos nos informar melhor para decidir se mandamos ou não para a escola", completa Patrícia.
<b>MEC não deve homologar aula remota em 2021</b>
O Ministério da Educação (MEC) não deve homologar a decisão do Conselho Nacional de Educação (CNE) de permitir o ensino remoto até dezembro de 2021. A intenção do governo federal, segundo fontes, é a de estimular uma volta presencial das escolas, mas acaba deixando uma lacuna nas diretrizes para Estados e municípios. Uma resolução do CNE com o artigo que permite continuar a educação online por causa da pandemia está desde o dia 7 de outubro aguardando o aval do governo federal.
Com a negativa, Estados e municípios ficarão sem diretrizes oficiais sobre o assunto para escolas públicas e particulares. Os conselhos estaduais e municipais costumam esperar a homologação do MEC para fazer seus documentos locais com base na resolução federal. Segundo especialistas, isso pode levar à judicialização já que a continuidade de ensino remoto é dada como certa em 2021.
Mesmo com uma eventual redução no número de casos, secretários de Educação afirmam que vai ser preciso ao menos usar o ensino híbrido. Isso porque os protocolos exigem distanciamento nas salas de aula. Para que os alunos fiquem a 1,5 metro um do outro não é possível que todos estejam ao mesmo tempo presencialmente. Não há espaço suficiente na maioria das escolas.
Em live na semana passada com o presidente Jair Bolsonaro, o ministro da Educação, Milton Ribeiro, disse que o "parecer do MEC é em defesa do ensino presencial" sem mencionar o documento. Até a semana passada havia a expectativa de que o MEC homologasse a resolução sem restrição. Também durante a transmissão ao vivo, Bolsonaro reclamou que muitas crianças não conseguem fazer aulas a distância, apesar de a filha dele não ter problemas porque "a mãe fica em cima".
Apesar dessa lacuna no ensino básico, segundo apurou o Estadão, o MEC deve editar uma portaria para dar suporte ao ensino remoto nas universidades privadas.
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>