O governo Bolsonaro não instalou barreiras sanitárias em ao menos três terras indígenas prioritárias que deveriam ter sido contempladas com medidas preventivas à covid-19, aponta manifestação da Procuradoria-Geral da República enviada ao ministro Luis Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal. Os bloqueios haviam sido determinados em agosto e deveriam ter sido implementados até o final de setembro.
Na terça-feira passada, 1º, Barroso mandou a União explicar como pretende cumprir a decisão e os novos prazos para as medidas protetivas. O ministro também intimou a PGR a se manifestar, que reiterou a necessidade do governo em instalar as barreiras.
De acordo com a subprocuradora-geral Eliana Peres Torelly de Carvalho, a União estimou que conseguiriam instalar os bloqueios sanitários nas terras indígenas Alto Rio Negro, Enawenê Nawê e Vale do Javari até o dia 28 de novembro, após a chegada da Força Nacional nas regiões. No entanto, até hoje o governo não comprovou que a medida foi efetivamente cumprida.
Duas reuniões foram realizadas em novembro entre representantes do governo, da PGR, e da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib). Na ocasião, a Funai alegou que, em relação à T.I Alto do Rio Negro haveria uma base móvel com patrulhamento fluvial. Integrantes da Apib, contudo, relataram preocupação com os povos indígenas e falaram que tal medida seria insuficiente para protegê-los. O questionamento não foi acolhido pelo governo, que também não comprovou a implantação da medida sanitária.
A barreira na T.I Vale do Javari, por sua vez, estava suspensa em razão da redução da navegabilidade dos rios. No entanto, a União ainda não informou qual a previsão para a implantação do bloqueio sanitário e tampouco comprovou seu restabelecimento nas reuniões com representantes dos povos indígenas. O governo também não garantiu o funcionamento da barreira na T.I Enawenê Nawê.
"Destaca-se, novamente, que as barreiras sanitárias previstas na Prioridade 1 deveriam estar em atividade até o final de setembro", frisou a PGR. "Reitera-se também os graves problemas operacionais e estruturais das Bases de Proteção Etnoambiental (BAPEs), cujas deficiências de infraestrutura e recursos humanos restarão agravadas com a agregação da função de operar como barreiras sanitárias".
A ordem para construção das barreiras sanitárias como estratégia para preservar indígenas isolados é uma das cinco medidas determinadas por Barroso para conter o avanço da covid-19 entre essa população. A decisão foi dada após o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) vetar uma série de dispositivos da lei que regulamenta o combate ao novo coronavírus entre indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais.
Em decisão, o ministro Luís Roberto Barroso classificou a ausência das barreiras como um quadro gravíssimo e apontou descumprimento à decisão que foi proferida pelo STF para a implantação de medidas sanitárias contra covid nas terras indígenas.
"A situação é gravíssima, dado o avanço da pandemia, e, a se confirmar esse quadro, estará havendo descumprimento da medida cautelar proferida. Em um Estado de Direito, poucas coisas são tão graves como o desrespeito a uma decisão judicial, tanto mais quando emanada do Supremo Tribunal Federal", registrou o ministro.
Entre as iniciativas que já foram determinadas pelo ministro estão o planejamento de ações com a participação das comunidades, a apresentação de planos para contenção de invasores e do próprio vírus nas reservas e a garantia de acesso a toda essa população ao Subsistema Indígena de Saúde.
No mês passado, a Advocacia-Geral da União apresentou ao Supremo uma nova versão do plano geral para o combate à pandemia do coronavírus entre os povos indígenas, mas o ministro decidiu não validar a versão por considerá-la genérica e pediu que um novo documento fosse apresentado. Em agosto, Barroso já havia mandado o governo ajustar o Plano de Barreiras Sanitárias.
<b>COM A PALAVRA, A AGU</b>
A reportagem entrou em contato com a Advocacia-Geral da União e ainda aguarda resposta. O espaço permanece aberto a manifestações.
<b>COM A PALAVRA, A FUNAI</b>
A reportagem entrou em contato com a Funai e ainda aguarda resposta. O espaço permanece aberto a manifestações.