O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva adotou nesta segunda-feira, 29, um tom cauteloso e mais brando na comparação com países vizinhos da América do Sul ao se manifestar sobre o anúncio da reeleição do ditador Nicolás Maduro, na Venezuela. Marcado por indícios e denúncias de fraude, o processo eleitoral venezuelano impôs um dilema diplomático para o governo petista, que historicamente respaldou o regime chavista no país vizinho.
Maduro foi proclamado ontem mesmo pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE) como o candidato vencedor na disputa presidencial realizada no domingo, 28. Sem citar os sinais de que o processo foi fraudado, o Itamaraty solicitou a divulgação das atas eleitorais para um posicionamento sobre o resultado da disputa, seguindo a manifestação de um dos poucos centros de observação da permitidos pela ditadura chavista a operar na Venezuela, o Centro Carter.
Como mostrou a <i>Coluna do Estadão</i>, o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, orientou a embaixadora do Brasil na Venezuela, Glivânia Maria de Oliveira, a não comparecer à proclamação de vitória de Maduro. O assessor especial da Presidência para Assuntos Internacionais, Celso Amorim, se reuniu no fim da tarde de ontem com o ditador venezuelano. À noite, o auxiliar de Lula ainda deveria se reunir com o candidato da oposição no país vizinho, Edmundo González Urrutia.
Amorim foi escalado pelo presidente para acompanhar in loco as eleições na Venezuela. "Como em toda eleição, tem que haver transparência, o CNE ficou de fornecer as atas que embasam o resultado anunciado. Também não vou endossar nenhuma narrativa de que houve fraude. É uma situação complexa e nós queremos apoiar a normalização do processo político venezuelano", disse o assessor especial.
Chefes de Estado de regimes diversos no continente, incluindo Javier Milei, na Argentina, e Gabriel Boric, no Chile, ameaçaram não reconhecer a vitória do chavismo. Lula permaneceu em silêncio ao longo do dia e não havia dado declarações sobre o assunto até a noite de ontem.
<b>Declaração conjunta</b>
Conforme a <i>Coluna do Estadão</i>, diplomatas de Brasil, Colômbia e México articulavam uma declaração conjunta para cobrar da Venezuela a divulgação das atas eleitorais da votação.
Desde que Lula voltou ao poder, há um ano e meio, o governo petista tem adotado um tomo moderado em relação à ditadura chavista apesar da contínua perseguição a opositores e ao cerceamento do direito de voto dos venezuelanos. De modo geral, o Brasil evitou criticar os abusos de Maduro até praticamente março deste ano, quando o Itamaraty divulgou uma nota condenando a proibição da inscrição de Corina Yoris para substituir Maria Corina Machado como candidata opositora.
Maduro então passou a ver Lula e o governo brasileiro com suspeita. Nos últimos dias, ironizou o petista, dizendo que ele devia "tomar chá de camomila" para se acalmar após o ditador alertar sobre um possível "banho de sangue" caso fosse derrotado e o brasileiro se dizer "assustado" com a declaração. O chavista também criticou o sistema eleitoral brasileiro, o que fez com que o Tribunal Superior Eleitoral suspendesse o envio de uma missão ao país.
A oposição na Venezuela afirmou ter tido acesso a apenas 40% das atas eleitorais, que endossariam a vitória de González Urrutia por cerca de 70% dos votos (mais informações nesta página). As sessões ficaram abertas até depois do horário em áreas predominantemente chavistas. Em áreas opositoras, houve relatos de intimidação e criação de empecilhos para o exercício do voto.
O CNE não apresentou dados definitivos que embasassem os resultados. Segundo o órgão ligado a Maduro, ele teria vencido com 51% dos votos ante 44% de González Urrutia. O conselho eleitoral afirmou que os números já eram "irreversíveis" com 80% das urnas apuradas. A diferença entre o número total de votos, porém, foi de um pouco mais de 704 mil votos, o que levantou questionamentos sobre essa irreversibilidade.
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>