Por volta do século V a.C., o estrategista militar chinês Sun Tzu escreveu a seguinte frase: “Numa batalha, não encurrale o inimigo. Deixe sempre uma saída. Senão, não restará outra alternativa a não ser lutar pela própria vida. Então, cada soldado inimigo valerá por dez dos seus”.
Não seria um absurdo dizermos que, durante a Guerra dos 12 Dias, Estados Unidos e Israel encurralaram o perigoso Irã. Ah, caro leitor, se antes dos ataques os persas já nutriam dentro de si uma impetuosa ambição de obter armas nucleares, o que não pensam neste momento? Politicamente enfraquecidos, sancionados economicamente, com seu regime ameaçado, sem o apoio militar de seus aliados mais próximos, com suas proxies destruídas e com um número crescente de insurgentes dentro do país.
Seria inocência de nossa parte acreditar que, após os fortes ataques às suas centrífugas, os iranianos desistiriam de seu projeto nuclear, há muitos anos ambicionado. Hoje, mais do que nunca, os aiatolás acreditam que precisam da bomba, pois, como diria Sun Tzu, dadas as adaptações necessárias ao contexto, não restam alternativas a não ser lutar pela sobrevivência de seu regime.
Mas tanto os israelenses quanto os americanos sabem disso. No entanto, cessadas (por ora) as hostilidades, ainda não é possível mensurar o quão danificadas foram as usinas iranianas. Decerto, na pior das hipóteses, a iminente bomba nuclear dos persas foi atrasada em alguns bons anos, o que deve dar fôlego aos judeus, que também buscam solução para o conflito em Gaza. Já na melhor das hipóteses, o programa foi integralmente destruído, como têm alegado Washington e Tel Aviv.
Os persas, no entanto, rechaçam essas declarações e se proclamam como os vencedores do conflito. Segundo eles, não houve danos significativos a nenhum equipamento, já que, prevendo os ataques, alegam ter retirado todo o material das usinas. De fato, imagens de satélites mostram grandes movimentações nos arredores das centrífugas dias antes dos bombardeios. Ainda assim, não é possível cravar que todo o material foi mesmo retirado dos locais, já que são de difícil manejo e não podem ser armazenados em qualquer lugar. Fora isso, os iranianos também se orgulham de ter resistido aos ataques americano-israelenses e conseguido emplacar retaliações em ambos os países, ainda que não tenham gerado danos importantes.
O resumo da ópera é que o país não abrirá mão do enriquecimento de urânio e seguirá com seu programa nuclear, mesmo que tenha de refazê-lo quase que por completo, a depender da efetividade dos bombardeios da última semana. Nesse cenário, novos ataques devem acontecer, e o conflito, até então cessado, continuará com o início de uma nova temporada.
Nesta semana, Trump chamou novamente o Irã às mesas de negociações. O republicano quer ser o presidente americano que conseguiu pôr fim aos dois principais conflitos globais da atualidade (o outro é a guerra entre Rússia e Ucrânia) e se consolidar como o mais hábil mediador do mundo. Uma das promessas de campanha de Trump é justamente pacificar o Oriente Médio, fazendo com que os Estados Unidos parem de gastar trilhões de dólares em guerras vistas como “intermináveis”, como acusou o ex-presidente Joe Biden de fazer.
Mas sua base mais fiel, os MAGA (Make America Great Again), não apoia as intervenções em território estrangeiro, o que coloca Trump em situação delicada, já que não pode abandonar seu mais importante aliado no Oriente Médio, e também não pode desagradar seu eleitorado, já que no próximo ano os EUA passarão por eleições parlamentares, as chamadas midterm elections, que podem tanto consolidar como arruinar os últimos anos de Trump na Casa Branca.
Essa crescente onda isolacionista nos EUA explica o posicionamento de Trump na guerra. Imediatamente após atacar as bases de Fordow, Isfahan e Natanz, o republicano fez questão de afirmar em sua rede social, a Truth, que seus soldados “já estavam retornando para casa após um ataque muito bem-sucedido”. Dessa forma, o republicano sinalizou tanto para aqueles que acreditam que os americanos são a superpotência que deve resolver os conflitos do mundo, quanto para aqueles que defendem o isolacionismo, já que Trump realizou apenas um ataque pontual, não envolvendo os Estados Unidos diretamente no conflito.
Já em Israel, pela primeira vez em um bom tempo, Netanyahu viu sua popularidade e a de seu partido, Likud, subir. Desde os ataques do Hamas em 7 de outubro de 2023, o premiê enfrenta forte crise interna que ameaça a permanência de seu governo. Até hoje, ninguém sabe como o país, que possui um dos mais notáveis serviços de inteligência do mundo, foi atingido pelos terroristas na fronteira com Gaza. Na ocasião, mais de 1.100 civis foram mortos e mais de 250 sequestrados (sendo que alguns estão sob domínio do grupo até hoje).
Após atacar o programa nuclear iraniano, que ameaça a existência dos judeus, Netanyahu ganhou pontos e algum fôlego com a população israelense.
Uma pesquisa realizada pela emissora pública israelense Kan em 25 de junho, um dia após a entrada em vigor do cessar-fogo com Teerã, mostrou que o Likud conquistaria 31 cadeiras no Parlamento israelense se as eleições fossem realizadas hoje, bem acima das 23 da última pesquisa da emissora, realizada antes da guerra, o que o torna o partido mais forte do país no momento (embora com uma cadeira a menos em relação ao seu status atual).
Apesar disso, mais da metade dos entrevistados acredita que o premiê deve deixar a política assim que os conflitos na região terminarem.
A pesquisa da emissora Kan também avaliou o medo dos israelenses em relação ao Irã após o conflito, que terminou na terça-feira, e indicou que 52% dos consultados afirmaram temer a República Islâmica.
Em relação ao sucesso da operação, quando perguntados se “Você acha que Israel e Estados Unidos danificaram significativamente as capacidades nucleares do Irã?”, 48% responderam “sim”, enquanto 30% afirmaram que “não”.
Por outro lado, 40% da população acredita que o cessar-fogo com o Irã não durará, em comparação com 30% que acreditam nessa possibilidade, enquanto 26% dizem não saber.
A Coluna de Política Internacional do GWeb é assinada pelo jornalista e cientista político Vinicius Vilares. Os posicionamentos expressos no texto não refletem, necessariamente, a opinião do portal.


