Em uma nova reunião com o vice-presidente Hamilton Mourão, investidores estrangeiros disseram que o trabalho ambiental feito pelo governo brasileiro ainda é insatisfatório e que continuarão a monitorar as medidas que prometem ser adotadas na região amazônica para avaliar a exposição a riscos financeiros decorrentes do desmatamento. O encontro virtual de sexta-feira (29) se deu dias depois de o general defender no evento de Davos Digital a ajuda da iniciativa privada no processo e criticar a falta de financiamento internacional para atividades sustentáveis no País.
"Gostaríamos de continuar apoiando o crescimento econômico brasileiro como investidores, mas a tendência de aumento do desmatamento no Brasil torna cada vez mais difícil para empresas e investidores atender às suas ambições ambientais, sociais e de governança", disse o CEO da Storebrand Asset Management, Jan Erik Saugestad, após o encontro, em relação à sigla ESG, que vem norteando o destino das aplicações de recursos em todo o mundo. "Para nós, como investidores, é importante entender os impactos e dependências do negócio e traduzi-los em riscos." O grupo atua para tentar conter o desmatamento em países em que têm investimentos e é formado por 55 instituições financeiras, que administraram aproximadamente US$ 7 trilhões em ativos.
Saugestad relatou que o vice-presidente afirmou que o esforço de combate ao desmatamento foi bem-sucedido, com redução de 17% no segundo semestre de 2020. "Isso é muito positivo e esperamos que a tendência continue. Embora o índice tenha sido reduzido em relação aos níveis do segundo semestre de 2019, se comparado a outros anos, ainda está muito alto e ainda está muito longe da meta de 2020 fixada na lei climática brasileira", apontou o norueguês.
Para o executivo, é positivo o compromisso de Mourão com o combate ao desmatamento ilegal e o fim das operações militares em curso na Amazônia, com o papel devendo ser passado para o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) em abril. Ele salientou, porém, desconfianças sobre se os recursos e o poder destinado ao órgão para agir serão suficientes para entregar resultados.
"Tínhamos grandes esperanças em relação à proibição de incêndios instituída pelo governo brasileiro em julho. No entanto, os dados sugerem que a tarefa não foi bem-sucedida", comentou, citando dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que revelam que tanto o número de incêndios quanto a área queimada na Amazônia e no Pantanal foram mais elevados em 2020 do que no ano anterior. Isso, de acordo com ele, indica "problemas significativos relacionados à aplicação da proibição".
O sócio da britânica BlueBay Asset Management, Graham Stock, ressaltou que os dados sobre incêndios florestais e desmatamento na região amazônica no ano passado mostram que a situação está piorando. "Parabenizamos o enfoque do vice-presidente nesta questão e a oportunidade de reafirmar nossas preocupações, mas também esperamos ver um progresso mais concreto em 2021", advertiu.
Saugestad acrescentou que deseja ver um firme compromisso político do governo brasileiro para reduzir o desmatamento se refletindo em ações reais "nos próximos meses".
O grupo capitaneado pelo CEO da Storebrand já havia participado de uma videoconferência com Mourão em julho do ano passado, quando foram cobradas ações mais efetivas do governo brasileiro em termos ambientais. Naquele mês, o vice-presidente também se reuniu com executivos dos três maiores bancos privados nacionais para lançar o fundo para Amazônia. Ainda em julho, durante a segunda reunião do Conselho da Amazônia, ele disse que vivia momento de pressão sobre queimadas e desmatamentos. Há pouco mais de seis meses, o grupo de investidores também discutiu sobre o tema com representantes do Congresso.
Apesar das desconfianças atuais, os investidores que formam o Diálogo de Política de Investidores sobre Desmatamento (IPDD, na sigla em inglês) agradeceram a vontade do general de continuar um diálogo construtivo e disseram esperar que as conversas continuem.
Em nota, argumentaram que, como instituições financeiras, têm o "dever fiduciário" de atuar no melhor interesse de longo prazo de seus clientes. "Reconhecemos que as florestas tropicais são essenciais para prevenir as mudanças climáticas, proteger a biodiversidade e manter os serviços ecossistêmicos, e que os povos indígenas desempenham um papel crucial na proteção das florestas", escreveram.
"Para promover um ambiente de negócios mais sustentável e favorável, o governo do Brasil deve demonstrar compromisso claro com a eliminação do desmatamento e proteção dos direitos dos povos indígenas. Estamos preocupados com o impacto financeiro que o desmatamento pode ter sobre nossos clientes e empresas investidas, potencialmente aumentando os riscos de reputação, operacionais e regulatórios", enfatizaram em outro trecho.
Na sexta-feira, após a videoconferência, a assessoria de Mourão informou que o vice-presidente apresentou ao grupo a iniciativa "AMACRO", um programa piloto para desenvolver de forma sustentável a economia de uma parte da região amazônica previsto para ser lançado em abril.