Bolsonaro pressiona senador a pedir abertura de impeachment de ministros do STF

Às vésperas da instalação de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) no Senado sobre ações do governo federal na pandemia, o presidente Jair Bolsonaro pressionou o senador Jorge Kajuru (Cidadania-GO) a ingressar com pedidos de impeachment contra ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Em conversa por telefone divulgada pelo próprio senador em suas redes sociais, Bolsonaro dá a entender que, se houver pedidos de impeachment contra ministros da Corte, pode ocorrer mudanças nos rumos sobre a instalação da comissão.

"Você tem de fazer do limão uma limonada. Tem de peticionar o Supremo para colocar em pauta o impeachment (de ministros) também", disse Bolsonaro ao senador. "Sabe o que eu acho que vai acontecer, eles vão recuperar tudo. Não tem CPI… não tem investigação de ninguém do Supremo", disse Bolsonaro, durante a conversa. Kajuru respondeu que já tinha entrado com pedido de afastamento do ministro do STF Alexandre de Moraes, ao que Bolsonaro respondeu: "Você é 10".

O presidente também cobrou que a CPI, se instalada, trabalhe para apurar a atuação de prefeitos e governadores. Segundo Kajuru, a conversa com Bolsonaro foi feita no sábado, 10. "Nós dois estamos afinados. CPI ampla e investigar ministros do Supremo. Ponto final", disse Bolsonaro ao senador.

Na quinta-feira, 8, o ministro do STF Luís Roberto Barroso determinou que o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, instale a CPI da Covid. O pedido ao Supremo foi apresentado por Kajuru e pelo senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE). Pacheco travava a instalação da CPI, apesar de a comissão ter recebido as assinaturas de apoio necessárias para ser aberta.

No dia seguinte, Bolsonaro acusou Barroso de "militância política" e cobrou que o ministro mandasse abrir análises de pedidos de impeachment de ministros do STF no Senado, afirmando que há "milhões de assinaturas" da população para este tipo de análise. O governo Bolsonaro trabalha para enfraquecer a CPI, investigar prefeitos e governadores na mesma comissão e desgastar ministros do STF com a tramitação de pedidos de impeachment no Congresso.

"A CPI hoje é para investigar omissões do governo Bolsonaro, ponto final. Se não mudar o objetivo da CPI, ela vai só vir pra cima de mim. Tem que mudar a amplitude dela", comentou Bolsonaro. "Se não mudar, a CPI vai simplesmente ouvir (o ex-ministro da Saúde Eduardo) Pazuello, ouvir gente nossa, para fazer um relatório sacana."

Na ligação, Bolsonaro também atribuiu o número de mortes da covid-19 à suposta omissão de prefeitos e governadores, ignorando que ele mesmo boicota medidas que dão certo contra o vírus, como o distanciamento social e o uso de máscaras. "A questão do vírus, não vai deixar de morrer gente, infelizmente, no Brasil. Poderia morrer menos gente se os governadores e prefeitos que pegassem recursos e aplicassem realmente em postos de saúde, hospital", afirmou Bolsonaro.

<b>Em análise</b>

O Senado tem hoje dez pedidos de impeachment contra ministros do STF na gaveta de Pacheco. Somente contra Moraes são seis pedidos. Além dele, também há requerimentos para investigar Gilmar Mendes, Edson Fachin e Cármen Lúcia.

O senador Carlos Viana, vice-líder do governo, também tenta coletar assinaturas pra uma CPI que investigue a interferência entre Poderes e dali saia um pedido de impeachment contra o próprio Barroso.

Na quarta-feira, o plenário do STF vai analisar a liminar de Barroso que determinou a instalação da CPI. Segundo um ministro ouvido pelo Estadão, a maioria dos ministros vota a favor da medida, mas com a ressalva de que ela só deverá ser instalada quando os trabalhos voltarem a ser presenciais. Isso significa que a CPI não seria mais imediata. A conversa de Bolsonaro com Kajuru, contudo, poderia mudar essa posição. Na avaliação desse ministro, se ficar caracterizado que Bolsonaro pretende intimidar os ministros ao estimular pedidos de impeachment dos magistrados, não haverá como retardar os trabalhos da CPI.

Procurados pelo Estadão, o Palácio do Planalto e Rodrigo Pacheco não quiseram comentar a gravação. A interlocutores, o presidente do Senado disse que não vai tratar a atitude de Bolsonaro como interferência à atuação da Casa. O senador Kajuru informou que foi ele próprio que entrou em contato com Bolsonaro, por telefone.

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