Foram apenas três jogos, mas, desde que chegou ao Cruzeiro, Luiz Felipe Scolari ainda não perdeu. Em duas vitórias e um empate, o técnico já promoveu mudanças na escalação e alterou o ambiente do time, visivelmente mais confiante. Para tanto, Felipão vem apostando no trabalho de uma psicóloga, no seu estilo motivacional e em jogadores mais experientes.
A situação do time inspira cuidados. Vivendo uma dura crise financeira, o clube está longe de brigar pelo acesso para retornar à Série A do Campeonato Brasileiro, que seria o objetivo mais óbvio para a equipe, uma das mais vitoriosas do País. Pelo contrário, o Cruzeiro busca no momento é se afastar da zona de rebaixamento, correndo risco de uma nova queda, desta vez para a Série C. No momento é o 16.º colocado, uma posição acima da zona da degola, com 20 pontos.
Ao ser contratado, no dia 15 de outubro, Felipão já chegou mudando o discurso do time. A narrativa sobre volta à primeira divisão deu lugar a declarações cautelosas, no estilo "um dia de cada vez". "O mínimo para não cair à Série C é de 45 pontos. Nós só temos apenas 20. Não adianta ficar enganando ninguém. Temos que correr atrás de no mínimo 25 para depois correr atrás de outras coisas", disse o treinador, que ganhou sete dos nove pontos em disputa em seus três primeiros jogos.
Com a postura mais prudente, ele reforçou sua função extra de "escudo" do elenco. Felipão passou a concentrar as atenções da imprensa e da torcida. Internamente, passou a fortalecer a confiança dos jogadores com seu conhecido estilo motivacional, às vezes até passional. Nesta busca, passou a trabalhar com a psicóloga Michelle Rios para extrair o melhor de cada atleta, ciente de que no momento o clube não tem condições de trazer reforços de peso.
O choque de confiança deu resultado nos três primeiros jogos sob o seu comando. O time está mais atento e concentrado em cada partida. Os jogadores estão arriscando mais em campo, deixando a apatia de lado e mostrando mais competitividade. Desta forma, Felipão alcançou o seu primeiro objetivo: voltar a vencer.
A meta seguinte é melhorar a performance coletiva. Se a autoconfiança voltou ao elenco, as limitações táticas e técnicas seguem presentes. "Eu diria que a identidade está sendo criada à medida que os jogos estão sendo jogados, na medida no que estamos nos conhecendo nos treinamentos e no dia a dia da Toca (da Raposa). Algumas coisas eu tenho cobrado, outras coisas eu tenho feito quase que como um professor de escola, orientando muitos jovens, que precisam de muito carinho e ensinamento", afirmou o experiente treinador.
Na escalação, as mudanças são mais sutis. Felipão fez poucas alterações desde a estreia. Mas já deixou claro que pretende dar maior espaço aos veteranos. "Não se faz um campeonato de Série B com meninada, com 10 ou 12 meninos, não se faz", reforçou o treinador. Não por acaso a primeira mudança no elenco foi a troca do jovem meia Maurício, de 19 anos, pelo atacante William Pottker, de 26.
Pottker deve se tornar o parceiro de Marcelo Moreno no ataque, com Arthur Caíke de opção no setor. O atacante veterano boliviano, de 33 anos, é o exemplo típico do que Felipão está mudando no Cruzeiro. Com o treinador, Moreno voltou a ser titular, empurrando Airton e Sassá para o banco de reservas. Felipão espera que ele recupere a sua melhor forma técnica como fez em 2014, quando ajudou o Cruzeiro a ser campeão brasileiro, com 24 gols em 57 jogos.
Na defesa, retomaram seus postos o lateral-direito Raúl Cáceres e o zagueiro Manoel, o que explica em parte as boas atuações do Cruzeiro nos últimos três jogos. O lateral se recuperou de lesão, enquanto Manoel está reabilitado após contrair o novo coronavírus. No meio de campo, Felipão segue apostando na experiência de Marquinhos Gabriel, apesar das críticas da torcida.
Outro trunfo do técnico em seu retorno ao time foi o período privilegiado de treinos. Ele já teve por duas vezes quase uma semana inteira livre para treinar a equipe mineira, uma vez que o Cruzeiro já foi eliminado na Copa do Brasil e agora disputa apenas a Série B.