O Tesouro Nacional começa 2021 com uma fatura trilionária a ser paga aos investidores. A dívida que vence este ano já somava R$ 1,31 trilhão no fim de novembro, valor que deve crescer com a incorporação de mais juros. O desafio chega num ano decisivo para ditar os rumos das reformas consideradas essenciais para o equilíbrio fiscal do País – e, consequentemente, para a capacidade de pagar toda essa dívida no futuro.
Nos últimos meses, o governo precisou se endividar mais para bancar o aumento das despesas para combater a covid-19. A combinação da maior necessidade de financiamento com a aversão ao risco dos investidores, turbinada pela desconfiança em relação à continuidade do processo de ajuste fiscal no Brasil, levou o Tesouro a concentrar boa parte das emissões em títulos de prazo mais curto.
A previsão do órgão é que, no fechamento de 2020, a dívida vencendo em 12 meses seja equivalente a 17,4% do Produto Interno Bruto (PIB), o maior patamar desde 2005. Para os próximos três anos, as simulações mostram uma proporção ainda maior, de 20,1% do PIB. Em regra, a concentração de vencimentos no curto prazo representa maior risco de financiamento, uma vez que o País precisa trocar os títulos vencidos por novos mais frequentemente, ficando sujeito às condições do mercado.
O coordenador-geral de Planejamento Estratégico da Dívida, Luiz Fernando Alves, diz que é natural que o aumento da concentração de vencimentos da dívida no curto prazo não se desfaça instantaneamente. Segundo ele, o Tesouro seguirá perseguindo uma dívida mais longa, mas o avanço nessa direção será um processo gradual que dependerá, inclusive, da velocidade na aprovação das reformas.
Por isso, a agenda de reformas fiscais é tida como essencial. Sem isso, haverá maior dificuldade em retomar a melhora na composição da dívida pública, deixando o País dependente da rolagem da dívida no curto prazo por mais tempo. A redução do endividamento, por sua vez, depende de o Brasil voltar a arrecadar mais do que gasta – o que só está previsto para ocorrer em 2027.
"A mensagem principal é que nos próximos dois, três anos é muito provável que a gente ainda siga com uma proporção de vencimentos da dívida em patamares mais altos do que as médias dos últimos anos", afirma Alves. "Com uma dívida mais alta, a mudança no volume de vencimentos em cada ano tende a ser mais alta de maneira estrutural", acrescenta ele.
<b>Volume</b>
O volume de vencimentos em 2021 equivale a 28,8% do estoque de toda a dívida pública interna e já representa quase o dobro da média de resgates nos últimos três anos. Só no primeiro quadrimestre serão R$ 669 bilhões. Depois disso, há um grande volume em setembro, com R$ 229,1 bilhões. Uma parte dessa dívida foi contratada ainda em 2015, quando a situação das contas exigiu maiores emissões, feitas sobretudo com títulos que vencem agora em 2021. Mas a pandemia também vai cobrar sua fatura.
Para fazer frente a essas necessidades, o Tesouro reforçou as emissões no fim de 2020. Em outubro, chegou a captar R$ 173,3 bilhões, o triplo da média de um mês regular. "Vemos um novo nível do tamanho dos leilões da dívida pública, e acho que essa é uma característica que veio para ficar por algum tempo", afirma o coordenador. Segundo Alves, o próprio tamanho da dívida acaba gerando expectativa de que o Brasil demandará empréstimos robustos, ainda mais considerando que o País segue gastando mais do que arrecada – ou seja, registra rombos sucessivos nas contas.
O coordenador de operações da Dívida Pública, Roberto Lobarinhas, observa que, embora o maior volume de emissões tenha vindo para ficar por algum tempo e se demore para sair dessa dinâmica, os últimos leilões têm apontado melhores condições para emitir títulos de prazo maior. "Apesar de não mudar a direção do transatlântico, é um sinal muito positivo já para 2021", afirma.
O Tesouro também tem usado as emissões maiores no fim do ano passado para reforçar o chamado colchão da dívida, uma reserva mantida pelo órgão para honrar os vencimentos em caso de excessiva volatilidade. "Já temos o suficiente para pagar os primeiros quatro meses de vencimento da dívida e mais um pouco", diz Alves.
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>