Noticia-geral

A ciência que surge com apoio do cidadão comum

O engenheiro aposentado Tasso Napoleão se apaixonou pelo cosmos quando tinha 6 anos. Aos 10, ganhou seu primeiro telescópio e desde então, paralelamente aos estudos e à carreira, vem desbravando o universo como astrônomo amador. Aos 66 anos, Napoleão é o que podemos chamar de um cidadão cientista.

A história do engenheiro não é única. No Brasil, começam a ganhar espaço iniciativas que envolvem o conceito de ciência do cidadão, isto é, que contam com pessoas comuns e pesquisadores amadores para produzir dados que levam a conhecimento científico de verdade. Em áreas de pesquisa como biodiversidade e mudanças climáticas, instituições já começam a perceber que podem se beneficiar da participação popular – seja para mapear espécies de animais em regiões extensas, seja para coletar dados meteorológicos em tempo real em múltiplos locais. Mas é no campo de Napoleão que atuam por enquanto a maior parte dos cidadãos cientistas brasileiros.

Ao longo dos anos, o engenheiro frequentou cursos do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) da Universidade de São Paulo (USP), estreitou o contato com astrônomos profissionais e criou clubes de ciência amadora. Hoje, coordena um grupo de observadores que colabora diretamente com o IAG, onde também coordena um curso voltado para astrônomos amadores. “Nosso grupo trabalha há seis anos com a busca de supernovas. Há 17 desses objetos astronômicos descobertos por brasileiros e o nosso grupo foi responsável por 15 .”

Segundo ele, há uma grande sinergia entre amadores e profissionais. “Os cientistas têm telescópios muito mais potentes à disposição, mas o tempo de uso é muito restrito e caro. Os amadores têm redes espalhadas em todo o globo e todo o tempo que quiserem – podemos varrer 700 galáxias por noite. Por isso há complementaridade.”

Há grupos que se dedicam a outras especificidades da astronomia, como o Sonear, coordenado pelos astrônomos amadores Cristóvão Jacques, João Ribeiro e Eduardo Pimentel, que mapeia asteroides próximos da Terra. “Investimos nisso porque o Hemisfério Sul é muito pouco vigiado e há muitas lacunas no conhecimento. Já descobrimos 25 asteroides e 5 cometas”, diz Jacques. Os dados são sempre enviados à União Astronômica Internacional, que confirma as descobertas. Os artigos científicos publicados dão crédito aos astrônomos amadores, que podem batizar o novo asteroide ou cometa.

Agricultura. A colaboração das pessoas comuns também poderá ajudar a evitar que eventos extremos, causados pelas mudanças climáticas, causem prejuízos a agricultores do semiárido. Esse é o objetivo do projeto Agrisupport, criado pelo Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), do governo federal.

Segundo Ana Paula Cunha, uma das pesquisadoras do Cemaden que coordenam o programa, os agricultores inserem, em um aplicativo no celular, dados relacionados às suas técnicas de manejo, datas de plantio, monitoramento da produção ou previsão de colapso da safra. “O aplicativo não é nada mais que um coletor de dados, que serão, depois de integrados e cruzados com as informações climatológicas de que dispomos, utilizados para nos ajudar a modelar prognósticos de produtividade agrícola relacionados às condições hidrológicas, incluindo as previsões de inundações e secas.”

Na primeira fase, a plataforma foi calibrada em dois projetos-piloto, no norte de Minas e no nordeste do Pará. “Constatamos que funciona perfeitamente e agora vamos à segunda fase do projeto, que é de coleta sistematizada das informações. No próximo calendário agrícola, teremos pelo menos 500 pontos com dados coletados – praticamente toda a zona rural do semiárido.”

Animais. Um dos principais projetos de ciência do cidadão planejados no País é uma parceria entre instituições brasileiras e americanas para coletar dados sobre animais, plantas e solos em Roraima. Liderado no Brasil por Pedro Galetti Jr, da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), e nos Estados Unidos pelo biólogo português José Fragoso, da Universidade de Stanford, o projeto tem o objetivo de engajar moradores locais para obter uma imensa série de dados e avaliar a influência da fauna e da flora nos estoques de carbono da região – questão crucial também para as ciências do clima.

Em Roraima, a população local registrará os animais que são caçados, coletará espécies da fauna e amostras de solo, e fará medidas de tamanho das árvores para calcular sua biomassa e determinar a quantidade de carbono. O projeto, que ainda precisa ser aprovado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), contará com 15 pesquisadores e 50 cidadãos cientistas. “Os dados serão anotados em um smartphone. Vamos saber quantos animais estão na floresta em diferentes períodos e se há sustentabilidade para caça na região, por exemplo. Esperamos também encontrar muitas espécies novas”, diz Fragoso. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Posso ajudar?