Uma pessoa se apaixona por outra quando descobre nela algo muito importante para si. A paixão, neste caso, corresponderia a uma vivência intensa e profunda de fusão psíquica entre seres de identidades diversas capaz de propiciar a sensação de anexação da característica de um ser pelo outro ser, que valoriza muito aquela característica.
Ocorre que ninguém se apaixona por quem de algum modo não esteja também tocado pelo sentimento que despertou. Quando as duas partes envolvidas nesta experiência emocional se retroalimentam mutuamente, caminham na direção da plenitude dela, que, então, adquire uma densa e ainda misteriosa riqueza. Nada, então, absolutamente nada conseguirá impedir que o apaixonamento mútuo se constitua numa escavação psíquica-existencial com a qual cada uma das duas pessoas envolvidas nele abra com determinação na vida da outra o lugar que passará a ocupar definitivamente nela: nem a certeza da finitude do apaixonamento, advinda da percepção óbvia da impossibilidade de permanecer nele por longo tempo, devido sua alta voltagem emocional; nem os abismos emocionais que cercam os maravilhosos estados de felicidade e euforia do apaixonamento, criados por inevitáveis ciúmes, medos de perda, e todo tipo de insegurança entranhada em nós; nem o duro peso da verdade inafastável de que estamos programados para, a partir de certo momento da história de qualquer relacionamento, começarmos a destrui-lo posto que somos animais equipados de agressividade destinada a uso contra quem nos é próximo ou contra nós mesmos.
Na verdade, até os sofrimentos atrozes embutidos na experiência do apaixonamento contribuem para torná-lo marca definitiva e inapagável na trajetória de qualquer pessoa. Mas, obviamente, não é o sofrimento que lhe dá relevância. E sim a inacreditável alteração dos sentidos que provoca.
Como descreveu a poeta, o amor, neste caso, é uma droga pesada. Quem não a quer? Mesmo que seja apenas para explorar novas áreas de sua própria constituição psíquica. Aquelas que dão a sensação metafísica de termos alcançado um nível de calor afetivo muito acima do que os demais seres humanos julgam possível alcançar, numa quebra violenta da temperatura morna que nos mantém vivos apenas para cumprir a enfadonha rotina das obrigação diárias.
Não é à toa que apaixonamento envolve sexo, a área da existência humana de onde os antigos mestres de seminários religiosos extraíam um modo de ilustrar as delícias do paraíso celeste. Eles não diziam que "o céu é um orgasmo eterno"? Pois bem, o orgasmo com apaixonamento é, sem dúvida, o máximo que um ser humano pode atingir na busca pela felicidade posta a seu alcance.