A Jovem Guarda não se restringiu ao antigo auditório da TV Record, na Rua da Consolação. O rock que chegava ao Brasil com mais força a partir de 1966, contrapunha a calmaria dos antecedentes samba-canção e bossa nova e, pela primeira vez, criava uma música feita e consumida exclusivamente por jovens. Longe da Record, onde o artefato era detonado, jovens viviam a chegada do rock-n-roll como se percebessem que testemunhavam a escrita da própria história.
Os Jordans, grupo pré-Jovem Guarda surgido na Mooca paulistana em 1956, em atividade até hoje com Aladdin, Sival, Tony e Foguinho, tiveram a mais sensacional das histórias de bastidores, uma das muitas retratadas no documentário Jovem Aos 50, de Sergio Baldassarini Junior, em cartaz nos cinemas.
A banda já era grande no Brasil quando saiu em viagem pela Europa. Em Madri, resolveram comprar seus próprios discos para cobrar da gravadora no Brasil os direitos autorais por aquelas vendas. Da Espanha, foram para Londres. Num final de tarde, entraram em um restaurante indicado por um amigo para comer macarronada. Irupê, o saxofonista, se levantou e foi ao banheiro. Ao voltar, estava mais branco que o normal. “O Ringo Starr está ali.” A banda não deu atenção. “Vamos que eu mostro a vocês.” Antes que se levantasse, vieram todos eles, John, Paul, George e Ringo. Cruzaram com os brasileiros, sorriram e saíram do restaurante. Os Jordans foram atrás, bateram na porta do prédio onde entraram os Beatles e conseguiram gravar, em um resto de filme, cenas do encontro mais improvável com o qual poderiam sonhar. As cenas estão no documentário.
Antes de dar título a todo o movimento, Jovem Guarda era apenas o nome do programa da TV Record. Sua abrangência, no entanto, foi bem maior do que aquela circunscrição e seu fim, mais de 50 anos depois, também ganhou uma contestação inédita. “Não entendo ainda como não tentaram colocar ninguém no lugar de Roberto Carlos”, disse Jerry Adriani em recente entrevista. O fim do programa foi proclamado pouco tempo depois da conversão do artista em cantor romântico, em 1968. “Acho muito estranho, é como se houvesse uma pressão nos bastidores (feita pelos militares) para o fim do programa.”
Erasmo Carlos costuma dizer o mesmo que Wanderléa quando fala dos anos em que recebia as pedradas da patrulha de esquerda. “Eu só lia a seção de esportes dos jornais. Não fazia ideia do que estava acontecendo.” Wanderléa resume: “A maior ditadura que existia estava dentro de casa. E a gente só queria ser feliz.”
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.