Mundo das Palavras

A maldição de Trump

O pintor sírio Abdalla Omari, exilado na Bélgica, tem encantado críticos de Arte de muitos países com tradições culturais completamente diferentes, ao usar como personagens de seus quadros políticos poderosos como a chanceler alemã Angela Merkel e o líder norte-coreano Kim Jong-na. Omari os retrata na mesma situação de vulnerabilidade enfrentada por milhões de patrícios seus, desde 2011, quando na Síria eclodiu uma guerra civil que já matou cerca de 400 mil pessoas. Os quadros tem recebido acolhida favorável nos Estados Unidos, na França, no Líbano, nos Emirados Árabes Unidos, na Geórgia, no Reino Unido, na Dinamarca, na Alemanha, na Polônia e em outros países.
 
Neles, estas conhecidas personalidades mundiais – supostamente bem protegidas -, mostram aparências físicas marcadas pelo mesmo sofrimento observados nos milhões de refugiados sírios, em imagens distribuídas por agências internacionais de notícias. 
 
Os quadros do sírio tem sido encarados como alerta contundente sobre a universal e atemporal fragilidade humana. Há nestas pinturas algo comparável, dentro da História da Cultura Ocidental, a admoestação feita por Agostinho de Hipona. O doutor da Igreja Católica, nascido no ano de 354 em Tagaste, antiga Numídia, no norte da África, conhecido como Santo Agostinho, criou uma frase que, ao longo dos séculos, vem sendo empregada no combate à soberba de pessoas poderosas esquecidas da crua realidade que compartilham com todos os homens. Ele escreveu: “Inter feces et urinam nascimur” (Entre fezes e urina nascemos). 
 
Advertência semelhante veio do maior dramaturgo de todos os tempos, William Shakespeare, nascido em 1564. Na sua peça “Hamlet” o protagonista diz que o mais portentoso dos reis pode vir, um dia, a passear pelos intestinos de um mendigo. Pois, morto, pode se tornar comida de algum verme, mais tarde, engolido por um animal cuja carne vire alimento humano. 
 
Ninguém como Donald Trump, presidente dos Estados Unidos, concentra hoje tanto poder e exibe tanta arrogância diante de desprotegidos expatriados – sobretudo, mexicanos e muçulmanos forçados a saírem de seus países, por circunstâncias econômico-políticas, onde tinham trabalho, lar e convívio com parentes e amigos, isto é, tudo aquilo que torna suportáveis as agruras inafastáveis.  Ele próprio, no entanto, é filho e neto de expatriados, dois imigrantes alemãos chamados Frederick Trump. Seus três primeiros filhos – Donald Jr., Ivanka, e Eric – eles os teve com uma expatriada, a imigrante checha Ivana Zelnicková. E, seu caçula – Barron – igualmente saiu do ventre de outra expatriada, a eslovena Melania Knauss. 
 
Nada, portanto, mais justo que Omari tenha tratado Trump de modo diferenciado. Pintando-o, como refugiado. Com a desolação de quem carrega uma menina – na idade de Kai Madison, neta dele -, no braço esquerdo. E, na sua mão direita, exibe o que conseguiu salvar do restante de sua família: uma velha fotografia.
 

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