É da própria natureza de um texto a manutenção de ligação estreita com a realidade externa a ele. Porque as palavras que o compõem são signos, Na linguagem oral, conjuntos de sons de fonemas, apenas. Na linguagem escrita, expressão gráfico-visual das letras, também. E signo, como sabemos, é sinal, algo que remete – representa – outra coisa. Fumaça pode ser signo de incêndio. A luz vermelha no semáforo avisa o pedestre para não avançar além da calçada.
Mas, além desta dimensão que o liga à realidade externa, o texto tem, também, outra, com a qual estamos familiarizados, embora nem sempre tenhamos consciência disto. A dimensão, voltada para dentro de dele mesmo. Um texto é um “sistema concluído”, “um conjunto hierarquizado de configurações estruturais internas”, observa Eduardo Guimarães, em “Texto e Argumentação”. Se os elementos internos dele não estivessem organizados dentro de uma estrutura – facilmente identificável tanto por quem o produz como pela pessoa a quem ele é destinado – ficaria reduzido a uma lista de palavras sem nexo. É o que ocorreria, por exemplo, na frase anterior a esta, neste texto, na qual as palavras estão organizadas com um intuito: a defesa de um ponto de vista. Desorganizadas, poderiam ficar assim: estrutura, elementos, produz, internos, familiar, organizados, nexo, texto, familiar etc. Não comporiam um texto.
Uma organização das palavras como esta que acabou de ser usada, isto é, tendo em vista a apresentação de um ponto de vista, nós empregamos incontáveis vezes, num único dia, nos textos que criamos em casa, na escola, no trabalho, entre amigos. Quantos pontos de vista expressamos, nestas ocasiões! Dizemos: “Que dia chato eu tive!”. “Acho que vou perder meu emprego”. “Tenho certeza: meu time vai ser campeão este ano”. “Parece que a Laurinha quer namorar comigo”. E, se queremos que nosso interlocutor compartilhe conosco de qualquer destes pontos de vista, depois de expressá-lo, enfileiramos diante dele as nossas razões, os nossos motivos. Em geral, constituídos de fatos e testemunhos (aquilo que outras pessoas nos disseram) absorvidos por nós com maior ou menor grau de objetividade.
Com isto – com o ponto de vista acompanhado de sua fundamentação – montamos uma estrutura para o nosso texto, seja ele oral ou escrito. Uma estrutura dissertativa. Damos a ele uma unidade, dentro da qual seus elementos não estão dispersos, amontoados, mas relacionados, uns com os outros, cada qual desempenhando uma função complementada pelas funções exercidas pelos demais.
“Tópico frasal”, assim é chamado o trecho do texto no qual nosso ponto de vista está contido, dentro do vocabulário que designa os elementos da estrutura dissertativa. Os trechos que lhe dão sustentação correspondem ao “desenvolvimento”.
O mesmo processo – o de buscar uma organização para aquilo que dizemos oralmente ou por escrito – nós seguimos, quando, em vez de expressar um ponto de vista, queremos apenas contar algo que nos aconteceu ou que presenciamos, ou, simplesmente descrever uma pessoa ou um objeto. Nestes casos empregamos os elementos próprios das estruturas narrativa e descritiva, igualmente muito familiares a nós.
Oswaldo Coimbra é jornalista e pós-doutor em Jornalismo pela ECA/USP