Se há um mês poucos especialistas acreditavam na conclusão do acordo mundial para a redução das emissões de gases do efeito estufa, hoje os ânimos estão mudados. A negociação da Conferência das Partes sobre Mudança Climática (COP20) será aberta hoje, em Lima, sob o impacto de duas iniciativas prévias: o acerto entre Estados Unidos e China e a proposta “conciliadora” do Brasil.
A discussão deve ser encerrada no dia 12, segundo os otimistas, com um rascunho de acordo. A expectativa é de finalização do texto pelos chefes de Estado de 192 países em Paris, em novembro de 2015. Se vingar, na 21.ª Conferência das Partes sobre Mudança Climática (COP21), o acordo substituirá o Protocolo de Kyoto em 2020 e dará ao mundo a chance de evitar o aumento superior a 2ºC na temperatura média até 2100. Ações voluntárias de governos e iniciativas de empresas e da sociedade civil – todas bem-vindas – serão insuficientes. Sem acordo, o Painel Intergovernamental de Mudança Climática (IPCC) calcula a elevação da temperatura entre 4ºC e 5ºC.
“Os ânimos certamente serão outros. Estou otimista com a conclusão do esboço em Lima, de forma a haver tempo suficiente para a conclusão em Paris”, afirmou Carlos Nobre, secretário de Pesquisa e Desenvolvimento do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI). “A proposta do Brasil tem potencial para destravar a negociação”, resumiu Carlos Klint, secretário de Mudança Climática do Ministério do Meio Ambiente (MMA).
A proposta brasileira, segundo Nobre, pode acabar com as quedas de braço entre países desenvolvidos e em desenvolvimento, entre os mais e os menos emissores e entre os que começaram a lançar os gases na atmosfera nas duas últimas décadas e os que o fazem desde a Revolução Industrial. A China, campeã em emissões de gás carbônico (CO2) em 2013, e os Estados Unidos, líder em emissões acumuladas desde 1751, foram responsáveis pelo impasse de Copenhague, em 2009.
O texto propõe que os países desenvolvidos apresentem os compromissos mais ambiciosos de redução. Ao redor desse núcleo, vão oscilar os demais, com objetivos menores, mas engajados em rumar para o núcleo de maior ambição. Em tese, cada país oferecerá o que puder, conforme seu grau de desenvolvimento. “Em vez de uma pilha de compromissos, teremos um documento-base. Vai acabar o ciclo das negociações. A COP passará para o modo de adoção do acordo”, explicou Nobre.
Responsabilidade comum. Esse modelo preserva o princípio defendido pelo Brasil nas negociações sobre mudança climática: a responsabilidade comum, mas diferenciada entre os países e conforme a capacidade de cada um. Como nas COPs anteriores, o País tende a atuar como um dos principais atores em Lima. Diante do fracasso de Copenhague, assumiu o compromisso voluntário de reduzir as emissões de 36,1% a 38,9% até 2020. Grande parte da promessa será cumprida por meio de redução do desmatamento, que caiu 18% na Amazônia Legal nos 12 meses encerrados em julho, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). “Sem sombra de dúvidas, esse dado vai reforçar a posição do Brasil na COP”, afirmou Klint. “Deixamos de emitir 710 milhões de toneladas de CO2, o equivalente a um ano de emissões do Reino Unido.”
O impasse entre China e EUA tende a ser diluído em Lima pelo acordo prévio. O governo americano prometeu emitir 26% a 28% menos até 2025, diante dos dados de 2005. Em 2050, essa redução será de 80%. A China não elevará as emissões depois de 2030, quando as fontes renováveis responderão por 20% de sua matriz energética.
A União Europeia, entre as economias desenvolvidas, tende a ser a maior fonte de pressões. Voluntariamente, o bloco assumiu a meta de reduzir suas emissões, em 2030, para 40% do volume registrado em 1990.
O acordo sino-americano é tímido, na opinião de Nobre, mas tem potencial para eliminar a atual inércia nas negociações. Para Sérgio Abranches, esse acerto é factível porque consta dos planos quinquenais chineses. Do lado americano, não haverá tempo suficiente nem amparo do Congresso para ser adotado. A iniciativa, porém, diminuirá a chance de “fracasso retumbante” da COP. “Não há inocente nesse jogo.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.