Mundo das Palavras

Ódio às crianças

Coluna semanal do jornalista e doutor em Comunicação Oswaldo Coimbra
Até a pessoa mais estúpida, aquela que nunca pôde refinar suas percepções através da educação formal ou simplesmente do convívio familiar, há de reconhecer o valor da vida humana. Ainda que seja para desrespeitá-lo em si mesmo, numa marginalização social como aquela a que se entregam os atormentados consumidores de crack, nas ruas do nosso país.
 
Até a pessoa mais estúpida, ainda que embrutecida por uma rotina de trabalhos pesados, há de se comover com a fragilidade de uma criança. Com o apelo à proteção dos adultos que contém a inocência dela em relação aos perigos que a rodeiam decorrentes da sua incapacidade de prover a própria subsistência e garantir sua sobrevivência.
 
Até a pessoa mais estúpida, sem condições intelectuais de entender a sua própria complexidade psicológica e a das outras pessoas, há de sentir em si mesma a necessidade de afeto humano, sobretudo daquele provindo de quem reparte com ela a intimidade do seu ambiente caseiro.
 
Por isto, nos deixa perplexos, angustiados, enojados e tristes a repetição da notícia do assassinato de uma criança com a participação da mãe ou pai dela. Como se num único evento se juntasse o desrespeito à vida, a violação da fragilidade infantil e a depravação do afeto familiar.
 
Sem o culto a estes três valores – a vida, a infância, o afeto – o que pode ser a existência de alguém? Por exemplo, a existência do pai que – há já algum tempo -, rasgou a tela de proteção da janela de seu apartamento para, por ela, atirar sua filhinha? A da mãe, supostamente mais humanizada pela faculdade de Psicologia que cursou, omissa quando – mais recentemente -, seu  novo marido matou com uma injeção seu filhinho, nascido num casamento anterior?  A do cirurgião – agora -, acusado de cumplicidade no assassinato de seu filhinho pela nova mulher com quem vive atualmente?
 
Estes infelizes pais são pessoas doentes? Pobres diabos que parecem gente, mas se comportam como se estivessem exilados entre as pessoas,  desprovidos que estão dos sentimentos e necessidades identificados como característicos dos seres humanos.
Por que a natureza os dotou da capacidade de procriar?
 
O que deveria ser usado para renovar a vida, em sua delicadeza e beleza, se tornou, com eles, prática de uma perversão hedionda.
A Justiça e a Psiquiatria, com certeza, tem meios e recursos para avaliar o que fizeram. Esperamos que façam isto com serenidade, firmeza, equilíbrio e correção. O cirurgião sequer foi julgado ainda. Quem sabe, numa reviravolta das investigações policiais, ele, por milagre, ainda acabe inocentado.
 
Mas, independentemente disto, uma sentença todos eles já cumprem: a de causarem horror às outras pessoas com quem venham a cruzar. No seu bairro, no seu trabalho, na sua escola, alguém gostaria da proximidade forçada com estes desgraçados pais?

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