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Advogados reagem à decisão do STF sobre prisão de réus em 2ª instância

A decisão do Supremo Tribunal Federal que autoriza a prisão de réus já em segunda instância judicial – sem aguardar o trânsito final da sentença e o esgotamento de todos os recursos – acirrou um embate histórico entre defesa e acusação.

De um lado, procuradores da República e delegados de Polícia Federal apontam “avanço” no combate à criminalidade. De outro, advogados e juristas veem “retrocesso” e alertam para “danos irreparáveis” no rastro do novo entendimento da Corte máxima.

O juiz federal Sérgio Moro, da Operação Lava Jato, reforçou sua posição a favor da decisão. “Fechou uma janela da impunidade”. Para ele, “não há violação da presunção de inocência já que a prisão opera somente após um julgamento condenatório, no qual todas as provas foram avaliadas, e ainda por um Tribunal de Apelação”.

A decisão do Supremo foi tomada no julgamento de habeas corpus anteontem para um acusado de roubo em São Paulo. Por sete votos a quatro, os ministros concluíram que a prisão do acusado pode ser executada já em nível de segundo grau.

O decano do Supremo Tribunal Federal, ministro Celso de Mello, declarou que a decisão é uma “inflexão conservadora”. “A questão do erro Judiciário lamentavelmente é sempre possível. De qualquer maneira, houve uma inflexão conservadora do Supremo na restrição do postulado constitucional de estado de inocência”, afirmou.

De acordo com o ministro, apesar de a decisão ter sido tomada em um habeas corpus e, portanto, ser restrita ao caso analisado, o STF firmou um “novo paradigma”. Celso de Mello voltou a defender que as penas não podem ser executadas antes do trânsito em julgado da sentença. “Jamais poderemos abdicar, desconsiderar ou transgredir direitos e garantias fundamentais. E a lei de execução penal é claríssima, fiel à Constituição, ao dizer que não se executa no País, no Brasil, nenhuma pena, seja ela privativa de liberdade, seja ela restritiva de direitos, sem que tenha havido previamente o trânsito em julgado da condenação penal”.

Já o ministro Gilmar Mendes expressou, dessa vez, voto favorável. Ele disse à Rádio Estadão que o sistema criminal brasileiro é “surreal” e que entendeu ser necessário mudar sua posição – antes ele era contrário ao cumprimento da pena de condenados já em segunda instância. “O Brasil é um País um tanto surreal no que diz respeito ao sistema criminal, prende muita gente provisoriamente e depois quando se trata da condenação definitiva não consegue executar.”

Divergência

Fora da Corte Suprema, as opiniões também se dividem. Ordem dos Advogados do Brasil reagiu enfaticamente contra a decisão e alertou, em nota, para os “danos irreparáveis” no rastro da decisão do Supremo. A entidade alega que o princípio constitucional não permite a prisão enquanto houver direito a recurso. “A execução provisória da pena é preocupante em razão do postulado constitucional e da natureza da decisão executada, uma vez que eventualmente reformada, produzirá danos irreparáveis na vida das pessoas que forem encarceradas injustamente.”

O criminalista Fábio Tofic Simantob pronunciou que “respeita a decisão do Supremo”, mas considera que ela “invade a competência do constituinte originário, que estabelece como cláusula pétrea a presunção de inocência até o trânsito em julgado”. “Montesquieu (filósofo francês que viveu de 1689 a 1755) deve ter ficado aborrecido.”

Para o criminalista e ex-presidente nacional da OAB José Roberto Batochio, a decisão do Supremo atenta contra “as liberdades constitucionais”. “A surpreendente decisão do STF implica ruptura da ordem constitucional. Agora, uma outra ordem constitucional foi instituída, não positivada em texto que emana da soberania da Nação, expressa em assembleia nacional constituinte, mas nascida da idiossincrasia da maioria dos membros que compõe a Corte Suprema”, comentou. O criminalista Pierpaolo Bottini disse que o País corre o risco de ver suas prisões superlotadas.

Consonância

Na outra ponta, os delegados de Polícia Federal consideram que a decisão representa “um importante passo para o fim da impunidade em nosso País”. “Recursos protelatórios para o STJ (Superior Tribunal de Justiça) ou STF não terão mais o efeito de impedir a aplicação da lei”, afirmou o delegado Carlos Eduardo Miguel Sobral, presidente da Associação Nacional dos Delegados da PF.

O presidente da Associação dos Juízes Federais (Ajufe), Antônio César Bochenek, disse que a decisão “marca um avanço no processo penal brasileiro”. Os procuradores da República comemoram. “Garantirá maior eficiência e celeridade à prestação jurisdicional”, destacou José Robalinho Cavalcanti, presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República./ Colaborou Beatriz Bulla
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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