A escassez de água na Região Sudeste começou a causar fissuras dentro do governo federal. A crise, que até agora era tratada como um problema restrito ao governo de São Paulo, sendo observada à distância pela União, acabou desembocando em troca de acusações e desentendimentos entre as agências reguladoras.
A Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), responsável pela administração do transporte fluvial no País, acusa a Agência Nacional de Águas (ANA) de ser omissa em sua função de garantir o equilíbrio no uso da água para diferentes propósitos: abastecimento, geração de energia e transporte de carga. A Antaq também disparou críticas contra o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), acusado de privilegiar apenas o plano de geração de energia e ignorar o resto.
“A ANA não faz o básico, que é garantir o uso múltiplo da água. Nem a ANA nem o ONS respeitam essa regra. Não somos consultados em nada, quem decide tudo são eles. Ficamos sabendo das decisões de vazão do Tietê-Paraná na última hora. Todos simplesmente ignoram a navegação”, disse ao Estado o diretor da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), Adalberto Tokarski.
O diretor da ANA, Vicente Andreu, reagiu às acusações. “A Antaq reclama, mas a verdade é que eles nunca apresentaram uma solução. Uso múltiplo da água não significa uso equivalente. O departamento hidroviário de São Paulo apresentou duas propostas para o ONS para resolver o problema. A Antaq nunca apresentou uma proposta”, afirmou.
O ONS afirma que as decisões sobre a vazão dos rios são técnicas e decididas pelos membros do Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico, ligado ao Ministério de Minas e Energia.
O clima na Antaq é de indignação. As rusgas entre as agências reguladoras começaram a surgir em maio, com a redução de vazão de água nas hidrelétricas do sistema Tietê-Paraná. A medida afetou diretamente o tráfego de barcaças na hidrovia, que é a mais movimentada do País. Há quase um mês, as operações foram completamente paralisadas.
O diretor da agência, Adalberto Tokarski, fez um levantamento sobre o reflexo da retenção de água na Tietê-Paraná para a movimentação de carga. “Entre maio e novembro do ano passado, 2 milhões de toneladas de soja e milho passaram por essa hidrovia. Neste ano, se ela permanecer intrafegável nesse período, serão colocados 45 mil caminhões a mais nas estradas da região, para causar, mais uma vez, aquelas filas imensas nos portos do Sudeste. Isso é um absurdo.”
Questionada sobre o assunto, a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, saiu em defesa da ANA. Em entrevista ao Estado, disse que a Antaq não propõe soluções para a situação. “A ANA tem uma proposta clara sobre hidrovia, e é verdade que o ONS tem uma certa resistência a isso. Mas a Antaq nunca soube discutir esse assunto. Ela não está preparada para esse debate político”, disse Izabella. “Por que a Antaq não constrói o diálogo? Por que não procura o seu ministro para discutir o tema? Se a situação está no limite, em vez de ficar acusando, o que ela deveria fazer é provocar o debate e tentar construir o marco regulatório que viabilize isso.” Para a diretoria da Antaq, as suas propostas são constantemente rejeitadas. Adalberto Tokarski diz que os problemas de navegação também começaram a afetar operações no rio São Francisco, onde empresas estão paralisando o transporte de carga e demitindo funcionários. A queixa foi levada à Comissão de Infraestrutura do Senado. “Ninguém está dizendo que não se deve gerar energia ou abastecer a população com água. O que está em questão é a forma de gestão. O uso da água é mal feito”, disse o diretor da agência. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.