O governo da Alemanha protagonizou nesta sexta-feira, 28, um momento raro ao reconhecer formalmente como genocídio os crimes cometidos por suas tropas coloniais, no início do século 20, contra as etnias herero e nama, da Namíbia. O ministro alemão das Relações Exteriores, Heiko Maas, prometeu pagar ao país mais de 1 bilhão (R$ 6,3 bilhões) em projetos de desenvolvimento.
"À luz da responsabilidade histórica e moral da Alemanha, pedimos perdão à Namíbia e aos descendentes das vítimas pelas atrocidades cometidas", afirmou Maas. "Não se pode apagar o passado. Mas o reconhecimento da falha e o pedido de desculpas são um passo importante para superarmos o passado e construirmos juntos o futuro."
O reconhecimento veio mais de 100 anos após o genocídio. A Alemanha perdeu suas colônias após a 1.ª Guerra e seu passado imperial acabou ignorado por historiadores e políticos, mais focados no legado dos nazistas, incluindo o Holocausto.
O anúncio foi feito após mais de cinco anos de negociações entre os governos da Alemanha e da Namíbia, onde a notícia foi recebida com cautela como um "primeiro passo na direção certa", segundo Alfredo Hengari, porta-voz do presidente, Hage Geingob. Nas próximas semanas, Geingob organizará encontros com autoridades das comunidades de hereros e namas para detalhar o acordo com a Alemanha.
O governo alemão rejeitou as reparações diretas, algo que os descendentes das vítimas haviam pedido, e disse que projetos de desenvolvimento na Namíbia serão realizados ao longo de 30 anos. O processo de reparação atraiu críticas generalizadas de descendentes das vítimas, que dizem ter sido deixados de fora de qualquer compensação. Líderes das duas comunidades dizem que Berlim não deveria ter se desculpado diretamente com o Estado namibiano, que não existia na época e não tem autoridade para falar em nome das etnias.
<b>Genocídio</b>
A Namíbia foi colonizada pela Alemanha entre 1884 e 1915. Ao menos 60 mil hereros e quase 10 mil namas foram assassinados por colonos e pelo Exército imperial, entre 1904 e 1908. Para vários historiadores, tratou-se do primeiro genocídio do século 20.
Em uma tentativa de reconciliação, em 2019, a Alemanha entregou à Namíbia os ossos de membros das tribos herero e nama que haviam sido exterminados. O gesto foi considerado insuficiente pelos descendentes e pelas autoridades namibianas, que exigiam um pedido oficial de desculpas e uma compensação.
Em várias ocasiões, a Alemanha alegou que milhões de euros foram repassados à Namíbia desde sua independência, em 1990, para contribuir com seu desenvolvimento.
As tribos herero representam atualmente quase 7% da população da Namíbia – no início do século 20, eram 40%. Privados de suas terras e de seu gado, os hereros se revoltaram em 1904 contra os colonos alemães e mataram mais de cem deles. Enviado para reprimir a rebelião, o general alemão Lothar von Trotha ordenou o extermínio. Os namas se revoltaram um ano mais tarde e sofreram o mesmo destino.
As forças coloniais alemãs usaram técnicas genocidas: massacres em larga escala, exílio no Deserto de Kalahari, onde milhares de pessoas morreram de sede, e campos de concentração, como Shark Island.
Restos de ossos, em particular os crânios das vítimas, foram enviados à Alemanha para experimentos científicos de caráter racial. O médico Eugen Fischer, que trabalhou em Shark Island e cujos escritos influenciaram Adolf Hitler, pretendia demonstrar a "superioridade da raça ariana". (COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS)
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>