Sete meses após ser suspensa de forma provisória, Beatriz Haddad Maia enfim descobriu nesta segunda-feira qual foi a decisão final da Federação Internacional de Tênis (ITF, na sigla em inglês) sobre seu caso de doping. A número 1 do Brasil levou gancho de 10 meses e poderá voltar a competir em 22 de maio. Como havia o risco de uma punição mais dura, de até quatro anos, recebeu a notícia com alívio.
"Parece que o meu pescoço voltou para o meu corpo", disse a atleta de 23 anos, em entrevista ao <b>Estado</b>. "Consegui provar a minha inocência". Ela testou positivo para metabólitos de SARM S-22 e SARM LGD-4033, substâncias proibidas pela Agência Mundial Antidoping (Wada, na sigla em inglês). Mas sua defesa conseguiu comprovar que o resultado positivo foi resultado de uma contaminação de suplementos vitamínicos que ela vinha ingerindo para complementar sua dieta – a mistura teria acontecido na própria farmácia de manipulação que produziu os suplementos.
Sem jogar desde julho, a tenista foi punida, mesmo provando o consumo acidental das substâncias, porque a ITF e a Wada consideram que cada esportista é responsável pelo que ingere ou consome diariamente. Portanto, a sanção tem caráter de advertência, por punir uma desatenção ou um descuido do atleta.
No entanto, sua punição foi mais longa em comparação a outros tenistas brasileiros que passaram pela mesma situação nos últimos anos. Em sua decisão final, a ITF alega que os casos anteriores, envolvendo tenistas como Thomaz Bellucci e Marcelo Demoliner, serviriam de alerta natural para os demais atletas brasileiros. "Tenho a consciência tranquila e durmo tranquila porque sempre me cuidei da melhor forma", afirmou a tenista, que nunca havia sido flagrada em testes antidoping em sua carreira.
Nesta entrevista exclusiva, concedida poucas horas após receber a notícia da ITF, Bia Haddad relembra os momentos difíceis vividos nos últimos meses, revela aprendizados pessoais e já projeta seu retorno às quadras, em maio.
<b>Aliviada após a decisão final da ITF?</b>
Nossa, parece que o meu pescoço voltou para o meu corpo. Estou bem tranquila agora, muito feliz. Recebi a notícia logo depois do almoço. Foi uma notícia positiva. Poderia ser suspensão de até quatro anos, né? Obviamente, não era algo que nem eu nem nenhum atleta espera. Talvez seja a pior notícia para um atleta. Mas, dos males, o menor. Consegui provar a minha inocência.
<b>A ITF alegou a suspensão mais longa por ter casos semelhantes de brasileiros anteriores ao seu. Disse que você já estaria mais bem informada sobre os riscos de contaminação…</b>
Qualquer atleta está sujeito a qualquer tipo de contaminação. Não acontece somente no suplemento e nem sempre é proposital. Já vimos doping por substâncias em cremes, remédios, hidratante, maquiagem. Estamos sujeitos à contaminação 24 horas por dia. Por mais que esteja no nosso controle o que consumimos, temos que tomar muito cuidado. Sempre fui muito profissional neste aspecto. Nunca aceito água de ninguém. Gatorade só se estiver lacrado. Sempre fui muito cuidadosa. Sempre lavando as mãos, tendo cuidado com as pessoas com quem temos contato. Tenho a consciência tranquila e durmo tranquila porque sempre me cuidei da melhor forma.
<b>Como foram os seus últimos meses?</b>
Foram sete meses nesta espera. Claramente, não é fácil. Nas primeiras noites e primeiras semanas, é difícil para cair a ficha. Foram noite mal dormidas, momentos em que você vê sua família ao seu redor e se sente culpado por uma situação inconveniente, fora do seu controle. Aquela angústia de não jogar Grand Slams e, depois de tantas cirurgias, sofri tanto para voltar ao Top 100.
<b>Desanimou?</b>
Tive momentos duros, de choro, de medo, de pensar: quando será que eu volto a jogar. Será que vão ser quatro anos ou menos (de suspensão)? Não pude nem treinar. E dói muito ver uma Fed Cup e não poder jogar. Mas lidei positivamente, tentando ser forte, com pensamentos bons e pessoas do bem ao redor. Amigos e família são tudo. Também fiz um trabalho super bom com a terapeuta. Coloquei pequenos objetivos no dia a dia, fiz aulas de inglês e de francês, nadei bastante. Comecei a dar um pouco de valor para o dia a dia normal, perto dos familiares. Afinal, foram nove anos morando fora. Fiz coisas normais, como ir ao parque e ver os amigos. Muitas vezes, a gente acaba vivendo numa bolha, do aeroporto para o clube, do clube para o hotel, e para a quadra central, e para entrevista. A vida é muito maior que o tênis. Abri um pouco a cabeça, li mais e percebi que tem pessoas que passam por dificuldades bem maiores que a minha.
<b>Manteve os treinamentos nestes meses?</b>
Não podia treinar, nem em quadra pública por causa da punição. Para evitar problemas, sequer pisava na quadra. Mas cuidei bastante da parte física. Fiz muita aula de spinning, corrida, muita movimentação para manter o físico e a mente sãos. Quem é atleta não consegue parar. Sou acelerada. Também cozinhei muito, fazia quebra-cabeças, aulas online de violão. E aproveitei para estudar mais. Vou me formar em administração daqui a um ano.
<b>Sem disputar torneios, você deixou de receber premiações. Como está sendo esse período?</b>
Foram oito meses sem receber nada. Isso faz bastante diferença. Passei a maior parte do tempo aqui em São Paulo. Financeiramente é um momento mais delicado. Tinha apê em Floripa, mas decidi continuar em SP. Estamos economizando. Agora temos que nos planejar e ver como vão ser as coisas financeiramente. Dinheiro é importante, mas prioridade é voltar a jogar e estar saudável.
<b>Já pensa nos primeiros torneios em seu retorno, em maio?</b>
Vou voltar com os pés no chão em torneios de nível future, na Europa ou nos Estados Unidos, não importa o tamanho. Pode ser ITF de US$ 15 mil, US$ 25 mil. Vou estar feliz. O que mais importa para mim agora é voltar a competir, sentir o frio na barriga. Jogar um 40 iguais no placar, se sentir livre dentro de quadra.