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André Braz: aceleração do IGP-DI reforça dúvidas sobre alimentos e combustíveis

Embora esperada, a aceleração do Índice Geral de Preços – Disponibilidade Interna (IGP-DI) em janeiro, puxada pelos preços das commodities, chama atenção para as principais "dúvidas" para a inflação em 2022, os alimentos e os combustíveis, afirma o coordenador do Índice de Preços do Consumidor do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV), André Braz. Mais cedo, a FGV informou que o IGP-DI subiu 2,01% em janeiro, ante 1,25% em dezembro de 2021.

A alta foi puxada pelo IPA-DI, que mede os preços no atacado, com destaque para as matérias-primas brutas, que saltaram 4,42% em janeiro. Foi o segundo mês seguido de avanço acelerado, ante os 4,40% de dezembro, acendendo o sinal de alerta sobre os preços de commodities alimentícias ou usadas na manufatura, segundo Braz. Para o pesquisador, esse movimento forma um cenário "bem pior" para a inflação ao consumidor em 2022, em que as expectativas caminham mais para 6,0%, acima do teto de meta perseguida pelo Banco Central (BC).

Minério de ferro, milho, soja e algodão foram algumas das matérias-primas que ficaram mais caras. Os motivos por trás dos reajustes são conhecidos, lembra Braz. No caso das agrícolas, a seca no Sul do País na virada do ano quebrou as safras de soja e milho, apontando para restrição na oferta desses grãos e para alta de preços. No caso das matérias-primas metálicas e energéticas, especialmente o petróleo, perspectivas de crescimento global e as tensões diplomáticas entre a Rússia e os países da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), por causa da Ucrânia, têm elevado as cotações.

Braz lembrou que a seca no Sul frustrou as expectativas de um ano mais leve para os preços de alimentos. Depois de saltar em 2020 e subir em torno de 8% em 2021, a perspectiva era de um alívio maior em 2022, com uma safra mais forte. Agora, ao elevar os preços de soja, farelo de soja e milho, a quebra de safra no Sul tende a ter impactos indiretos, sobre os preços das carnes, por exemplo. Mesmo no IPA-DI, os preços das carnes, especialmente suína e frango, que dependem mais da soja e do milho como insumo para ração, ainda estão comportados na leitura de janeiro, mas uma nova rodada de encarecimento dos insumos pode jogar por terra o alívio dos últimos meses.

"Esse prejuízo nas lavouras de ciclo mais longo acaba chegando às proteínas carnes. Algumas carnes estão com numero negativo no IPA-DI de janeiro, mas a seca coloca em xeque o alívio", diz.

A incógnita sobre os preços dos alimentos se repete nos combustíveis. Os rumos das tensões diplomáticas envolvendo a Ucrânia são imprevisíveis, mas a disputa não parece que vai "terminar bem", na visão de Braz. E os combustíveis também têm efeitos indiretos e espalhados, como no transporte de cargas e na mobilidade urbana. Não só os combustíveis, mas os custos de manutenção de veículos como um todo saltaram desde o início da pandemia, o que coloca pressão por reajustes nas tarifas de ônibus urbano, lembra.

Para piorar, o quadro é agravado pelas incertezas quanto ao rumo da taxa de câmbio. O cenário eleitoral tende a levar muita volatilidade às cotações do dólar, especialmente porque sinaliza para o desequilíbrio das contas do governo. As políticas públicas em debate na campanha poderão dar sinais ora de reformas, ora de mais gastos, afirma.

Além disso, em ano eleitoral, os choques de oferta nos alimentos e nos combustíveis podem aumentar a pressão política por subsídios públicos para esses itens, como já vem ocorrendo com as propostas de reduzir impostos sobre diesel e gasolina. Num ciclo vicioso, sinais de maior desequilíbrio nas contas públicas aumentam o risco do País e, consequentemente, a cotação do dólar, alimentando mais inflação.

"Sempre que temos políticas heterodoxas para resolver um problema (de preços), lá na frente, temos que pagar", afirma Braz.

<b>Metas de inflação</b>

Diante da magnitude e da duração de choques de oferta nos preços dos alimentos, dos combustíveis e da energia elétrica, "talvez fosse a hora" de o Conselho Monetário Nacional (CMN) "dar um passo atrás" no processo de redução das metas de inflação perseguidas pelo Banco Central (BC), afirmou André Braz.

O processo de redução gradual da meta de inflação foi iniciado em 2017, no governo Michel Temer (MDB). Desde então, o CMN tem cortado o objetivo em 0,25 ponto porcentual a cada ano. A margem de erro, para mais ou para menos, também foi reduzida de 2,0 para 1,5 ponto porcentual. Em 2017, a meta de inflação era de 4,5%, objetivo que foi mantido para 2018. Em seguida, caiu para 4,25% em 2019 e 4,0% em 2020. Em 2021 foi de 3,75% e, neste ano, é de 3,5%. As reduções estão mantidas para 2023 (3,25%) e 2024 (3,0%).

Na visão de Braz, o processo de redução da meta é "muito arrojado". "E as coisas mudaram. As metas foram arrojadas sem a covid-19. Com a covid-19, são arrojadas demais. Talvez fosse a hora de dar passo atrás", avalia.

Do contrário, "aonde o juro vai chegar?", questionou o pesquisador da FGV. A taxa básica Selic, em elevação desde o início do ano passado, chegou a 10,75% ao ano na semana passada, na última decisão do Comitê de Política Monetária (Copom). "O aumento dos juros é o desespero da política monetária depois que perdeu a âncora fiscal", completa, numa referência às mudanças no "teto de gastos", a regra fiscal que limita o crescimento da despesa pública federal de um ano para o outro à variação da inflação.

Segundo o pesquisador da FGV, o CMN não precisaria abandonar completamente o processo de redução da meta, mexendo no objetivo dos anos em que isso é necessário. Por outro lado, a adoção de uma "meta ajustada" apenas em 2022 pode ser insuficiente. Dado o nível de indexação de preços na economia brasileira, "24 meses é um tempo em que a inflação pode esfriar", enquanto apenas 12 meses pode ser pouco, diz. Após a inflação "esfriar", aí sim, o CMN poderia traçar uma nova trajetória de metas, conclui Braz.

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