Mundo das Palavras

Angústia nas vésperas da eleição

Faz poucos dias que ocorreu. as já parece um fato antigo. Tão soterrado ficou na lembrança dos eleitores brasileiros pelo incessante acúmulo de acontecimentos chocantes registrados diariamente na atual disputa pela presidência da República. Na verdade, foi apenas a manifestação de um candidato com ínfimo índice de aceitação entre os eleitores. Que não ocupou mais de um minuto, ao longo daquelas duras horas de  transmissão por rede de televisão do último debate de candidatos, antes do primeiro turno da eleição. Mas a manifestação de Guilherme Boulos pareceu tão sincera entre tantas mentiras que invadiram esta campanha eleitoral que, imediatamente, se tornou um dos assuntos mais comentados nas redes sociais. E, no dia seguinte, apareceu nas páginas das principais publicações do País. 
 
Boulos disse, na ocasião, que a situação atual do País se parece muito com a existente na fase de implantação da Ditadura Militar de 1964. Angustiado diante das câmeras da emissora de televisão, acrescentou: “Muita gente morreu, muita gente foi torturada. Por isto, não quero que as minhas filhas cresçam num país sob uma ditadura”.
 
Quando a ditadura acabaou, Boulos tinha somente dois anos de idade. Casado, pai de duas filhas, ele podia estar lembrando, durante o debate, do que soube sobre as 113 jovens presas e torturadas, nos Anos de Chumbo da Ditadura. Tragédia de que a opinião pública nacional só tomou conhecimento – ainda parcialmente – em 1985, quando foi lançado o livro “Brasil, Nunca Mais”, com o apoio do arcebispo de São Paulo dom Paulo Evaristo Arns. Só quatro anos mais tarde, o destino, nas prisões, daquelas jovens, foi amplamente mostrado. No filme-documentário “Que bom te ver viva”, de Lúcia Murat.
 
A muitos brasileiros, então, chegaram informações sobre como elas foram agredidas, desde a fase inicial de suas prisões. E torturadas nos interrogatórios com equipamentos como a coroa de ferro. Que esmagava crânios humanos. E, a “cadeira de dragão”, dotada de assentos de placas eletrificadas. Inclusive, as que, naquele momento, estavam grávidas. Uma delas, a paraense, de 25 anos, Hecilda Mary Veiga Fonteneles de Lima, entrou num estado de inquietação  profundo devido à ameaça de parto prematuro. Seu filho, Paulo Fonteneles, nasceu com “acentuados reflexos somáticos”. Outra jovem, a vendedora Helena Mota Quintela, de 28 anos, ouviu dos seus interrogadores a ameaça de ter seu filho arrancado “à ponta de faca”.
 
Das oito mulheres entrevistadas por Lúcia Murat, três foram torturadas grávidas.  Regina Toscano perdeu seu filho. Ela revelou ter sido presa quando distribuía panfletos políticos. E que a violência começou naquele momento. Regina afirmou. “Eu fui despida e procuraram arma até na minha vagina, embora soubessem que eu nada tinha. Foi algo feito para me degradar”.
 
Aqueles dramas das jovens prisioneiras políticas da Ditadura Militar tinham sido lembrados, na véspera do debate televisionado – revelou Boulos – por Stanislaw Szermeta, avô das filhas dele e seu sogro. Ele é um veterano líder operário. E também foi preso e torturado naquele período. 
 
 

 

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