Estadão

Antes contrário, governo agora apoia projeto do Centrãoduto

As articulações do Centrão para aprovar no Congresso um projeto que prevê aporte de R$ 100 bilhões na construção de gasodutos contam com o apoio do Palácio do Planalto. Sob o argumento de que a proposta concentrava "a destinação de recursos públicos em infraestrutura, que deveria ter seus investimentos promovidos pelo setor privado", o presidente Jair Bolsonaro chegou a ser contra o plano, mas mudou de ideia. O novo entendimento ocorreu depois que Bolsonaro se assumiu como integrante do Centrão.

Agora, se a proposta não for adiante por meio de emenda parlamentar, o governo já planeja publicar uma medida provisória que viabilize a construção dos gasodutos, segundo interlocutores do presidente.

Como mostrou o <b>Estadão/Broadcast</b>, os empreendimentos beneficiam o empresário Carlos Suarez e seus sócios em oito distribuidoras de gás. Eles são os únicos a ter autorização para distribuir gás encanado em oito Estados do País.

O <b>Estadão/Broadcast</b> apurou que, há cerca duas semanas, o assunto foi discutido em uma reunião entre técnicos dos ministérios de Minas e Energia e da Economia. Os participantes deixaram o encontro certos de que o apoio do governo para aprovar uma proposta de estruturação da rede de gasodutos estava selado. Há, porém, núcleos de resistência à iniciativa. O Ministério da Economia é contra a ideia de sacar até R$ 100 bilhões do pré-sal para financiar a construção dos dutos de gás. Hoje, esse dinheiro vai para o Tesouro Nacional e ajuda o País a fechar suas contas.

Alinhado às estratégias e demandas do Centrão, o governo já deu o primeiro passo para emplacar o projeto bilionário do gás ao sancionar, ainda no ano passado, a Lei de Capitalização da Eletrobras. A proposta incluiu um "jabuti" – emenda parlamentar sem nenhuma relação com o texto original -, exigindo a construção de 8 mil megawatts de geração por usinas elétricas movidas a gás. A maioria delas seria construída nos oito Estados do Norte, Nordeste e Centro-Oeste em que Carlos Suarez e seus sócios – a Gaspetro e governos estaduais – têm exclusividade na distribuição de gás.

Sem os gasodutos, porém, o governo sabe que não há como pôr de pé as usinas porque elas não teriam como receber o gás. É daí que vem a necessidade de construir as tubulações bilionárias para transportar o insumo entre seus pontos de origem e os locais que foram determinados, à revelia de qualquer discussão técnica.

Em setembro de 2020, quando o Centrão ainda não ocupava os principais postos de controle do governo Bolsonaro, o Planalto tratou de derrubar a proposta, e o fez nos termos mais duros. Ao justificar o veto a uma emenda que previa o financiamento público dos gasodutos, Bolsonaro afirmou que a proposta tinha "vício de iniciativa" e que violava a Constituição, além de não apresentar "estimativa do impacto orçamentário e financeiro, gerando aumento de despesa".

À época, o que se pretendia era construir os gasodutos com o desvio de 20% da receita do pré-sal que, hoje, é destinada às áreas de saúde e educação, por meio do chamado fundo social do pré-sal. O governo reagiu e afirmou que o plano do Congresso extrapolava a "competência de gerenciamento do Orçamento federal", ou seja, tentava usurpar uma atribuição que é do Executivo.

Observou, ainda, que o projeto invadia a "conveniência da destinação dos recursos públicos" e levaria à redução dos valores destinados às áreas de educação e saúde pública, "incorrendo em inconstitucionalidade formal por vício de iniciativa, pois apenas o próprio Poder Executivo poderia deflagrar este tipo de proposta".

<b>Privilégio</b>

O governo também indicou o risco de o dinheiro público ser usado com o objetivo de privilegiar determinados negócios alheios ao planejamento da matriz elétrica nacional. "Tem risco potencial de causar distorções nas decisões de investimentos com possibilidade de seleção adversa dos empreendimentos, vez que promove a destinação de recursos públicos em infraestrutura que deveria ter seus investimentos promovidos pelo setor privado, resultando em ineficiências para o setor como um todo", disse Bolsonaro ao justificar o veto à proposta.

De 2020 para cá, os parlamentares tentaram aprovar o "Centrãoduto" em três ocasiões. Nenhuma tentativa teve sucesso. Agora, a nova investida se dá por meio do Projeto de Lei 414, de 2021, que cria um novo marco regulatório do setor elétrico. O plano não é mais sacar recursos do fundo social do pré-sal, mas, sim, bancar as obras com dinheiro da estatal Pré-Sal Petróleo (PPSA), ou seja, utilizar dinheiro que iria para os cofres do Tesouro. Nos dois casos, os custos seriam pagos pelo consumidor, por meio de cobranças extras na conta de luz, ou pelo contribuinte, com saques diretos de recursos da União.

Questionado sobre o assunto, o Ministério da Economia não quis se manifestar. O titular da pasta, Paulo Guedes, também não se pronunciou. A Casa Civil não respondeu ao pedido de esclarecimento.

Apesar de toda a mobilização parlamentar e do próprio governo em relação ao assunto, o Ministério de Minas e Energia informou que "desconhece qualquer iniciativa em relação à construção de gasodutos". O empresário Carlos Suarez e sua sócia, Gaspetro, não se manifestaram.

A estatal PPSA, cortejada pelo atual plano do Centrão como a fonte de financiamento dos gasodutos, declarou, por meio de nota, que os recursos arrecadados são direcionados ao Tesouro Nacional e que não cabe à empresa fazer a gestão desse dinheiro.

"A empresa segue trabalhando para maximizar os resultados econômicos da União na gestão dos contratos de partilha de produção, na representação da União nos acordos de individualização da produção e na gestão da comercialização do petróleo e gás da União", destacou o comunicado da PPSA.

<b>Líder</b>

Ao <b>Estadão/Broadcast</b>, o líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP-PR), expôs o racha sobre o assunto e disse que o governo não vai bancar sozinho a conta dos gasodutos. "O governo pode até apoiar com o BNDES, com alguns incentivos, mas não é responsabilidade do governo fazer os gasodutos", disse Barros, sem detalhar que tipo de medidas poderia ser adotada.

"Nosso modelo está em concessões públicas. Quem ganha a concessão constrói. Se a termoelétrica realmente for inviável, está resolvido, não vai ter termoelétrica", afirmou o aliado de Bolsonaro. As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>

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