Conhecido por seu estilo bad boy e pelo falatório sem reservas, o chef Anthony Bourdain – encontrado morto na sexta-feira, 8, aos 61 anos, após se enforcar num quarto de hotel em Estrasburgo, na França – era uma das maiores celebridades do mundo da gastronomia. Não exatamente por sua comida, apesar de ter sido um cozinheiro talentoso, mas pela carreira que construiu a partir da publicação de seu primeiro livro, Cozinha Confidencial, em 2000, em que revelou os bastidores da cozinha profissional sem pudor.
O cozinheiro nova-iorquino trabalhou por décadas em restaurantes da cidade até ganhar projeção localmente, na década de 1990, pelo seu trabalho no Les Halles, um restaurante de acento francês badalado, onde trabalhou por oito anos. Foi lá de dentro que saiu o livro em que revelou, com certa dose de humor e também de crueldade, segredos do mundo dos restaurantes que até então ninguém tinha coragem de contar.
Do livro, saem cozinheiros ilustrados, fielmente, como alcoólatras, drogados e incorrigíveis, coisa impensável de se contar naquela época. Mas não só, pois Bourdain também fala de si como um desses cozinheiros e narra seus dramas pessoais – como o vício em heroína, entre outros. O sucesso mundial do livro, que chegou no ano seguinte ao Brasil pela Companhia das Letras, fez com que Bourdain ganhasse uma nova carreira: a de apresentador de televisão.
Canais de TV souberam aproveitar, em variados programas, o tirocínio de Bourdain. Dois anos após o lançamento do livro, veio o primeiro programa, A Cooks Tour, da Food Network, que durou um ano. Mas, logo depois, em 2005, Bourdain estreou o programa com o qual foi catapultado mundialmente, o Sem Reservas, do Travel Channel.
Foram sete anos no ar, com viagens para várias partes do planeta, das mais turísticas às mais controversas, como um episódio sobre Beirute, que depois ganhou o Emmy. Tony, como era conhecido entre chefs, conseguiu mostrar a gastronomia de diferentes partes do mundo num contexto cultural, ultrapassando a cozinha e as receitas, tratava de costumes, tradições, às vezes até de política. Visitava lugares extremos em diferentes cidades, do boteco pé-sujo ou a barraca na rua até o restaurante mais concorrido. Uma de suas paixões era o Arzak, do chef basco Juan Mari Arzak, com quem tinha uma relação quase de filho para pai. Registrou essa preferência no programa gravado em San Sebástian, na Espanha.
Esteve várias vezes no Brasil e gravou dois programas por aqui. Veio a primeira vez a trabalho em 2003, a convite de Rosa Moraes, diretora do grupo Laureate, da Universidade Anhembi-Morumbi, e Josimar Melo, crítico da Folha, para participar do evento Boa Mesa e dar palestra na universidade. Tinha vindo a São Paulo uma vez e detestado. Nessa viagem, foi à feira, ao D.O.M, ao Jun e ao Litoral Norte (tomou 14 caipirinhas no almoço no Manacá). Saiu declarando amor à cidade.
Em 2007, voltou e repetiu o mesmo roteiro, dessa vez registrando tudo no seu programa Sem Reservas. O segundo programa foi gravado em 2010, quando visitou o Mercado Municipal e provou a comida de rua. E não gostou tanto. Depois da visita, revelou em seu livro Maus Bocados (Companhia das Letras) o que havia achado de São Paulo – “feia como o inferno”, cidade onde a comida japonesa da Liberdade é “muito pesada” e o sanduíche de mortadela do Mercadão “é simples, mas saborosíssimo”.
Após Sem Reservas, trocou a Travel pela CNN, na qual, desde 2013, apresentava o Parts Unknown. Em 2016, por esse programa, recebeu até o então presidente americano Barack Obama num episódio no Vietnã.
Bourdain, que ao longo da carreira na TV escreveu mais uma dezena de livros, estava na França gravando Parts Unknown quando foi encontrado morto no hotel por seu maior amigo, o chef francês radicado nos EUA Eric Ripert. Completaria 62 anos no próximo dia 25.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.