Porteiro em um dos cerca de 140 prédios que estão no entorno do Minhocão, hoje Elevado Presidente João Goulart, Edison Jorge, de 43 anos, é testemunha das mudanças da paisagem da região. Há dez anos, quando começou a trabalhar ali, via anúncios publicitários gigantescos – em geral protagonizados por belas mulheres seminuas – em todas as empenas cegas que sua vista alcançasse. Alguns meses depois, com a legislação em vigor e a todo vapor, cada dia a mais era uma mulher a menos no horizonte de Jorge. “Passei a observar que a maioria dos prédios estava era precisando de uma pintura, uma reforminha, não é?”, diz ele.
Se tirou a poluição visual, por outro lado a Lei Cidade Limpa escancarou a deterioração dos edifícios da região. “Mesmo assim ficou melhor. Eu gosto de arquitetura, então, com a saída dos anúncios, pelo menos consigo ver como são os prédios de verdade”, afirma a empresária Meire Grilli, de 60 anos, que há 20 é proprietária de uma banca de jornais vizinha do Elevado.
O panorama estético do entorno só começou a melhorar mesmo mais recentemente, graças a duas ações que vêm dando ao Minhocão uma característica contemporânea: o grafite e os jardins verticais.
“Eu, que vivi a cidade antes da Lei Cidade Limpa, sou obrigado a reconhecer: não fosse pela implementação dela, não teríamos espaço para nossas criações hoje”, afirma o paisagista Guil Blanche, de 26 anos, idealizador do projeto do Corredor Verde do Minhocão – que até o fim deste ano deve implementar jardins em dez empenas cegas onde antes o que se viam eram anúncios publicitários. “Reconheço que eram uma fonte de receita importante para aqueles condomínios. Mas, se antes o que havia era uma paisagem virtual, hoje podemos observar a paisagem real da cidade.”
Atualmente, seis edifícios já têm um projeto paisagístico executado. Um sétimo está em construção e outros três em projeto. Um deles, idealizado pela artista plástica Erika Verzutti, de 45 anos, será um diálogo com esse passado não tão longínquo assim: o mosaico formado pelas plantas ali dependuradas vai criar um desenho que lembrará as curvas de uma mulher. Em referência óbvia ao tempo em que os anúncios de lingerie dominavam a paisagem e tentavam distrair a atenção dos 70 mil motoristas que, todos os dias, passam pelo Minhocão.
Síndica e moradora de um dos primeiros prédios a receber o jardim vertical, a autônoma Vera Lúcia Francisca de Jesus, de 53 anos, é só elogios. “Eu moro aqui desde 1997, então passei por essas fases todas”, conta ela. “O que via da janela era totalmente diferente de hoje.”
Vera admite que, como moradora de um condomínio, o valor arrecadado com o espaço arrendado para a publicidade era interessante para as economias do prédio. “Mas o que havia era uma beleza enganosa. A poluição, o barulho e a sensação de morar mal eram muito maior do que hoje”, acredita. “Há uma carência muito grande do verde. Esses jardins contribuem para diminuir essa sensação. Parece que até o ar que respiramos fica melhor.”
Transformação
O porteiro Edison Jorge concorda. Suas idas e vindas para o trabalho andam melhores, mais coloridas, menos acinzentadas. “Grafite eu acho uma coisa muito legal”, avalia. “E o jardim assim, dependurado no prédio, parece compensar um pouco a falta de árvores. No fundo, sem aquele monte de propaganda, o Minhocão ficou melhor.”
As transformações ali acabaram se tornando um símbolo dos resultados da lei. “Foi preciso muita coragem e comprometimento para implementá-la (a lei)”, diz o arquiteto e urbanista Henrique de Carvalho, do ateliê Tanta. “Esta lei nos mostra que, quando decidida, a gestão municipal pode fazer mudanças importantes em pouco tempo.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.