Em um pregão marcado pela realização de lucros, após cinco dias consecutivos de alta, o Ibovespa desacelerou, sem conseguir sustentar os 108 mil pontos conquistados na véspera. Além disso, os fatores que levaram à alta sustentada nos últimos dias, ou se dissiparam ou tiveram menos força nesta quinta-feira, 9, com as bolsas americanas sem fôlego e as commodities desacelerando.
No cenário doméstico, o investidor também digere o tom mais duro do comunicado do Comitê de Política Monetária (Copom) ontem e observa, ainda de forma lateral, com maus olhos a indicação do presidente Jair Bolsonaro de quer usar parte do espaço liberado nos gastos pela PEC dos Precatórios para dar um reajuste aos servidores públicos. Assim, o índice terminou o dia em queda de 1,67%, aos 106.291,24 pontos.
"Era esperado aumento de 150 pontos-base por parte do BC, mas existia uma esperança de que o Copom fosse um pouco menos agressivo nos próximos passos. Isso não aconteceu, o que, na minha opinião, é positivo", afirma Mauro Morelli, estrategista-chefe da Davos Investimentos, completando: "O mercado reage de forma negativa no curto prazo, porque isso significa uma possibilidade maior de recessão e isso é ruim para a Bolsa. Mas, no médio prazo, ter um BC com mais credibilidade e com a certeza maior de que vai lutar contra a inflação, é algo que deve ser encarado de forma positiva".
O cenário de juro mais alto prejudica o setor de varejo – com desempenho muito atrelado ao crédito -, que cai de forma robusta hoje. O índice setorial de consumo caiu 2,34% hoje, com ambos os papéis das Lojas Americanas (LAME4 e AMER3) e Magazine Luiza entre as principais baixas do índice. O mesmo ocorre com o índice que mede o desempenho das ações do setor imobiliário, que derreteu 2,94%.
Além disso, a Bolsa reflete a percepção de que, com um patamar de juro a dois dígitos por um tempo mais dilatado em 2022, haverá uma migração natural de ativos de risco para renda fixa. "Principal driver é o movimento do Copom, que coloca uma trajetória de juro que vai ser, ao menos aos olhos de parte dos analistas de mercado, mais alto. E juro mais alto indica bolsa mais baixa", indica o estrategista da Modalmais, Felipe Sichel.
Em relação à sinalização dada pelo presidente Bolsonaro ontem, de reajuste ao funcionalismo, Sichel explica que o mercado ainda monitora o fato de forma lateral, mas há uma preocupação com a tendência de aumento de gastos pré-eleitoral. "Bolsonaro tem adotado tom mais alinhado à base ideológica, isso se reverte, dado a posição que pesquisas apontam no momento, em medidas de aumento do gasto. Mas a gente precisa entender o que vai realmente se concretizar", completa.
Lá fora, os índices de Nova York, que vinham dando impulso ao Ibovespa nos últimos dias, tiveram um dia misto, mas sem fôlego, com Dow Jones fechando estável após ensaiar alta modesta durante todo o dia e S&P500 em queda de 0,72%. Nasdaq, por sua vez, teve queda um pouco mais robusta, de 1,43%. As bolsas americanas operam em compasso de cautela, à espera dos dados de inflação ao consumidor, amanhã, e ainda de olho no noticiário sobre a variante Ômicron.
As commodities, que também ajudaram o índice brasileiro nos últimos dias, tiveram uma sessão negativa, tanto para o petróleo quanto para o minério de ferro. Pesam o dólar mais forte no exterior e as incertezas em relação à variante Ômicron do coronavírus, após o Reino Unido ter imposto novas restrições à mobilidade na Inglaterra.
Assim, Petrobras e Vale recuavam hoje, ainda que, na semana, acumulem altas significativas, com as ações ordinárias da petroleira subindo mais de 3% e a mineradora, acima de 4%. A despeito do comportamento das commodities, a CSN tinha uma das principais altas do Ibovespa hoje, subindo 1,49%.
Apesar da queda de hoje, o Ibovespa ainda acumula alta de 1,16% na semana e 4,29% no mês. Para o CIO e sócio fundador da Kilima Asset, Eduardo Levy, o mercado ainda tem condições de sustentar um rali de fim de ano e afirma que "não se surpreenderia" se a bolsa voltasse ao patamar dos 112 mil pontos em dezembro. Ele ressalta que houve um movimento importante de entrada de estrangeiros, sobretudo nos últimos pregões.
"Houve uma qualidade diferente do comprador (nos últimos dias). Grandes compradores dos 100 aos 108 mil pontos foram estrangeiros, enquanto brasileiros vendiam suas posições. O investidor estrangeiro vem comprando ao longo do ano, a qualidade do investimento tem sido boa, isso mostra que Brasil está barato no olhar do estrangeiro", apontou.