Estadão

Após morte de Michel Nisenbaum, entidades judaicas criticam atuação de Lula

Entidades representantes da comunidade judaica do Brasil receberam a notícia da morte de Michel Nisenbaum, brasileiro assassinado pelos terroristas do Hamas no sul de Israel em 7 de outubro de 2023, e que teve o corpo levado para a Faixa de Gaza, com tristeza e críticas à atuação do governo de Luiz Inácio Lula da Silva em relação ao caso.

O corpo de Nisenbaum retornou a Israel após uma operação das Forças de Defesa de Israel (FDI) nesta sexta-feira, 24, que também recuperou os restos mortais do franco-mexicano Orión Hernández Radoux e do israelense Hanan Yablonka.

"Quando um grupo de palestinos de Gaza com passaporte brasileiro chegaram ao Brasil o presidente Lula afirmou que nenhum brasileiro ficaria para trás, mas na cabeça dele ele só estava se referindo aos palestinos", afirma o presidente da Federação Israelita do Estado de São Paulo (Fisesp), Marcos Knobel, em entrevista ao <b>Estadão</b>. Knobel está em Israel, junto com uma comitiva de 43 líderes comunitários brasileiros que conversaram com autoridades israelenses e familiares de reféns, incluindo a sobrinha de Nisenbaum, Ayala Harel.

Segundo Knobel, a entidade judaica sentiu que o governo Lula poderia ter feito mais em relação ao brasileiro. "O presidente do Brasil se diz muito amigo do Irã, o Hamas chegou a elogiar o governo brasileiro e um deputado do PT tirou uma foto com um líder do Hamas. O governo poderia ter feito muito mais para libertar o Michel ou para que tivéssemos a confirmação da morte do brasileiro e a recuperação do corpo".

De acordo com informações do Exército de Israel, o brasileiro foi morto por terroristas do Hamas durante o ataque no sul do país no dia 7 de outubro e seu corpo foi levado para a Faixa de Gaza. "Israel já trocou prisioneiros por restos mortais de israelenses, ter o corpo era muito importante para cumprir o ritual do enterro e poderíamos ter tido esta notícia antes se o governo brasileiro tivesse feito mais", aponta Knobel.

Já o Itamaraty também se pronunciou após a confirmação da morte de Nisenbaum e enviou uma nota ao <b>Estadão</b> detalhando os esforços do governo brasileiro para a libertação de Nisenbaum. "Desde que tomou conhecimento do fato, o governo brasileiro empenhou-se em sucessivas gestões para a libertação do cidadão brasileiro, por meio de diálogo constante com autoridades e forças de segurança israelenses e com demais atores internacionais relevantes", apontou o Itamaraty, que ressaltou que o assunto foi tratado em uma reunião entre o chanceler brasileiro Mauro Vieira e o então chanceler israelense Eli Cohen em Buenos Aires.

"Foi também objeto de diversos contatos mantidos pelo Ministro Mauro Vieira com interlocutores da região e de organismos como a Cruz Vermelha, inclusive durante as recentes viagens que realizou ao Oriente Médio e a Nova York para sessão aberta do Conselho de Segurança da ONU, em abril", destaca a nota

<b>Visita ao Brasil</b>

A filha de Nisenbaum, Hen Mahluf, e a irmã do brasileiro, Mary Shohat, participaram de uma viagem ao lado de outros familiares de reféns sul-americanos em dezembro do ano passado para Argentina, Uruguai e Brasil. Em Brasília, os familiares do brasileiro se encontraram com o presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, após intermediação do senador Jaques Wagner, que é judeu. Já na capital paulista, as famílias dos reféns participaram de eventos com autoridades e de uma coletiva de imprensa no clube Hebraica.

Em entrevista ao <b>Estadão</b>, Mary Shohat afirmou que esperava que a visita fizesse alguma diferença para a libertação do irmão.

Duas semanas após os ataques terroristas do Hamas, o Itamaraty reconheceu o desaparecimento do brasileiro no dia 21 de outubro, segundo nota enviada ao <b>Estadão</b>. A chancelaria brasileira apontou que a família de Nisenbaum comunicou o ocorrido para a embaixada do Brasil em Tel-Aviv antes de o governo israelense reconhecer que o brasileiro estava entre os sequestrados.
O embaixador do Brasil em Israel, Frederico Mayer, só se encontrou com Mary Shohat, irmã de Michel Nisenbaum, no dia 30 de novembro, após as autoridades israelenses informarem a situação do brasileiro para a embaixada.

No mesmo dia, Lula apontou pela primeira vez que um brasileiro de fato estava entre os sequestrados e afirmou que conversou sobre o tema com autoridades do Catar, em uma visita ao país do Oriente Médio no ano passado. O Catar tem relações próximas com o Hamas por abrigar o seu escritório político e atua como negociador em conversas por cessar-fogo entre o grupo terrorista e Israel.

Mas após as declarações, Lula falou pouco sobre o assunto e preferiu focar em suas críticas a atuação de Israel na Faixa de Gaza, apontando que Israel comete genocídio no enclave palestino. O presidente brasileiro também comparou a atuação das Forças de Defesa de Israel (FDI) em Gaza com as praticas da Alemanha Nazista sob Adolf Hitler. Durante o regime nazista, que ocorreu entre 1933 e 1945, 6 milhões de judeus foram mortos.

"Se o presidente Lula fosse tão enfático na libertação dos reféns da mesma forma que critica Israel, da mesma forma que fala que o país é genocida, ele poderia ter conseguido alguma coisa a mais", opina Knobel.

<b>Sobrinha acreditava que Michel estava vivo</b>

A delegação brasileira que está em Israel se encontrou com a sobrinha de Nisenbaum, Ayala Harel, na terça-feira, 21. Luiz Kignel, vice-presidente da Confederação Israelita do Brasil (CONIB) e integrante da comitiva, afirmou que ela mantinha esperanças de que o tio pudesse estar vivo.

"A sobrinha do Michel estava muito esperançosa e acreditava que existia uma possibilidade do tio dela estar vivo. Foram mais de 230 dias de sofrimento para a família dela", apontou Kignel. "A delegação brasileira recebeu esta notícia com muita consternação. Estamos recebendo cada vez mais notícias de que reféns morreram em Gaza e Israel está fazendo a sua obrigação que é resgatá-los".

Harel pediu que a delegação de brasileiros entrasse em contato com o presidente Lula, para que ele negociasse a libertação de Nisenbaum. Ela gravou um vídeo em inglês no dia do encontro com a comitiva segurando um cartaz com uma foto do brasileiro e exigindo a sua libertação.

<b>Quem é Michel Nisenbaum</b>

O brasileiro nasceu em Niterói e tinha 59 anos. Ele deixa duas filhas e seis netos. Nisenbaum trabalhava como guia turístico em Israel, mas também exerceu funções variadas como motorista, entregador e prestador de serviços de informática.

O brasileiro se mudou para Israel com 12 anos e formou família no país. No dia 7 de outubro do ano passado o brasileiro saiu de sua casa em Sderot, cidade próxima a fronteira com o enclave palestino, para buscar a sua neta de 4 anos que estava em uma base militar no sul de Israel, mas não chegou ao local e não atendeu o telefone. Após diversas ligações de sua filha, Hen Mahluf, um terrorista do Hamas atendeu o celular e passou a falar em árabe, depois gritou a palavra Hamas e desligou.

Desde então os familiares do brasileiro não sabiam mais nada sobre o seu paradeiro. Seu carro foi encontrado incinerado em uma estrada no sul de Israel e o computador do brasileiro estava em Gaza.

<b>Repercussões</b>

O presidente Lula lamentou a morte do brasileiro na rede social X. Segundo um auxiliar do ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, que foi ouvido pela reportagem do <b>Estadão</b>, o chanceler brasileiro conversou sobre uma possível libertação de Nisenbaum com mais de 15 interlocutores e que sempre era uma questão presente nas discussões sobre a guerra na Faixa de Gaza, mas que havia uma dificuldade de obter informações sobre a situação do brasileiro..

Em nota, a Conib também lamentou a morte de Michel Nisenbaum e enviou condolências à família do brasileiro. "É com profunda tristeza que a Conib e a comunidade judaica brasileira recebem a notícia de que o corpo do brasileiro Michel Nisenbaum foi encontrado pelas Forças de Defesa de Israel em Gaza. A Conib envia condolências à família de Michel, mais uma vítima inocente do ataque bárbaro do grupo terrorista Hamas contra Israel em 7 de outubro, que deu início a esta guerra".

A Fisesp também se pronunciou, ressaltando que é necessário "empenho de todos para a volta de todos os reféns". "Em nome da comunidade judaica de São Paulo, lamentamos muito a morte de Michel, nos solidarizamos com a família Nisenbaum, com os quais estivemos juntos nesta semana em Israel". (COM JÉSSICA PETROVNA)

Posso ajudar?