A Fifa continua encontrando resistência em seu plano de realizar a Copa do Mundo a cada dois anos. Na quarta-feira, foi a vez da Conmebol bater o pé contra o projeto da entidade máxima do futebol. O Conselho da confederação sul-americana se reuniu em Luque, no Paraguai, para debater o assunto. Ao fim da reunião, uma nota oficial foi divulgada com um posicionamento contrário à ideia, afirmando que as seleções da América do Sul não vão participar do torneio no novo formato.
"O projeto em questão vira as costas a quase 100 anos de tradição do futebol mundial, ignorando a história de um dos eventos esportivos mais importantes do planeta", disse a Conmebol.
Anteriormente, a Uefa havia sido a primeira federação a se levantar contra o projeto de mudanças no calendário internacional. Por mais de uma vez nos últimos dois meses, o presidente da entidade, o esloveno Aleksander Ceferin, se manifestou de maneira contrária, inclusive destacando ter o apoio da Conmebol para barrar a ideia.
Na terça-feira, o jornal francês <b>Le Monde</b> publicou a informação de que a Uefa, confederação que comanda o futebol europeu, corre riscos de arcar com um prejuízo de três bilhões de libras, cerca de R$ 20 bilhões, se a Copa for realizada a cada dois anos. Para ter melhor dimensão dessa possível perda financeira, o órgão contratou em setembro um estudo independente, conduzido pela Oliver & Ohlbaum Associates.
O responsável por liderar este projeto é Arsène Wenger, ex-técnico do Arsenal, hoje Diretor de Desenvolvimento de Futebol na Fifa. Ao jornal francês <b>LÉquipe</b>, o francês admitiu que as propostas trabalhadas até o momento não têm como principal finalidade os fins econômicos, mas sim a melhora da qualidade das partidas e a frequência das competições.
Eduardo Carlezzo, advogado especializado em direito desportivo, explica que, apesar da declaração de Wenger, há sim interesses financeiros por parte da entidade. "A Copa do Mundo de seleções é o trem pagador da Fifa. Sem ela, a entidade teria enormes dificuldades em se sustentar. Obviamente, aumentando a periodicidade a receita também aumentaria, o que por consequência leva ao aumento do poder financeiro da Fifa e da capacidade de distribuir recursos às federações nacionais", esclareceu.
Carlezzo ainda caracteriza a proposta da Fifa de realizar o mundial a cada dois anos como esportivamente descabida e totalmente injustificável. "Isso faz menos sentido ainda quando sabemos que existe um calendário de jogos que atualmente já é complicado e é danoso para os clubes. Se isso realmente sair do papel, será muito prejudicial aos clubes. Seria o mundial de seleções a cada 2 anos um contragolpe da Fifa na Uefa? O jogo que está sendo jogado nos bastidores é pesado e não está claro para onde rumam estas competições", completou.
Outro ponto que passou a ser debatido é a perda de atratividade da Copa do Mundo, uma vez que as pessoas teriam um intervalo de tempo menor para esperar o início do torneio. Segundo dados da Fifa, a última edição, sediada na Rússia, alcançou recorde de audiência, com mais de 3,5 bilhões de telespectadores. De acordo com a entidade, 3,572 bilhões de telespectadores – mais da metade da população mundial com 4 anos de idade ou mais – assistiram a alguma parte da cobertura oficial, que foi transmitida ao vivo em todos os territórios do planeta entre 14 de junho e 15 de julho de 2018.
Rene Salviano, executivo de marketing que lançou neste ano a HeatMap, agência de marketing esportivo focada em captação de patrocínios, acredita que a diminuição do intervalo entre uma Copa e outra pode trazer efeitos positivos.
"A Fifa pode trazer novidades para o futebol, seja na inovação das regras de jogo ou até mesmo do formato de disputa. A briga por audiência é cada vez maior, porém, com algumas mudanças, a entidade deixará este esporte ainda mais atrativo para os fãs. Evidente que o futebol é um esporte de grande apelo, sobretudo no Brasil, mas é possível levar novidades que tragam uma modernização e que façam brilhar os olhos dos torcedores pelos seus 90 minutos", acrescentou Salviano.
Para Marcelo Palaia, professor e especialista em marketing esportivo, a mudança na periodicidade do torneio não deve afetar a audiência e o interesse do público no geral. "Não acredito que vá impactar tanto na audiência e interesse do público no geral. A Uefa Champions League (Liga dos Campeões da Europa) e a Copa Libertadores da América são ótimos exemplos, uma vez que são torneios que acontecem todos os anos e sempre mobilizam milhares de pessoas que acompanham e gostam de futebol".