A guerra na Ucrânia completa um ano hoje com americanos e europeus cada vez mais envolvidos no conflito, e uma tensão cada vez maior dos Estados Unidos com Rússia e China, rivais históricos que voltam a se alinhar. A guerra deixou mais de 280 mil mortos em ambos os lados, segundo estimativas, e 13 milhões de pessoas deixaram suas casas na Ucrânia. O conflito também popularizou os drones suicidas.
A cada incursão russa em território da Ucrânia ao longo destes 12 meses de conflito, alianças e acordos internacionais tiveram de se rearranjar.
Americanos e europeus, que vinham de anos de distanciamento e atritos durante o mandato de Donald Trump em Washington, reaproximaram-se com rapidez em torno da Otan para dar suporte à Ucrânia e conter o avanço russo rumo o Ocidente.
O apoio aberto a Kiev – algo que nem sequer parecia próximo antes da invasão – materializou-se de maneira mais simbólica na segunda-feira, quando o presidente dos EUA, Joe Biden, fez uma visita-surpresa à Ucrânia, em uma rara aparição de um chefe de Estado americano em uma zona de guerra onde os EUA ou seus aliados não têm controle sobre o espaço aéreo.
"Um ano depois, Kiev está de pé", disse Biden em um discurso na capital ucraniana, ao lado do presidente Volodmir Zelenski. "E a Ucrânia está de pé. A democracia está de pé. Os americanos estão com vocês, e o mundo está com vocês."
<b>GASTOS</b>
Mas o apoio da aliança não se limitou a declarações e reprimendas diplomáticas. Só em ajuda militar, os EUA enviaram o equivalente a US$ 25 bilhões (R$ 129 bilhões), segundo um balanço do Departamento de Estado americano. A conta não considera gastos com ajuda humanitária e financeira o que elevaria o valor total a quase US$ 50 bilhões (R$ 258 bi), de acordo com estimativas do Council of Foreign Relations, nem soma os valores dos tanques e blindados prometidos no começo do mês.
Ao todo, os países da Otan enviaram mais de US$ 80 bilhões (R$ 413 bi) em 2022, segundo o Kiel Institute for the World Economy, um centro de estudos alemão. O volume de recursos e armamentos levou alguns analistas a considerar que o conflito na Ucrânia se transformou em uma guerra por procuração da Otan, com o objetivo de conter a Rússia.
Em contrapartida, há quem defenda que os envios feitos pela aliança atlântica sejam apenas o meio necessário para Kiev manter a soberania de seu território, diante da agressão de uma potência militar, que fere o direito internacional.
A Otan está sendo reconstruída para deter a Rússia em tempos de paz e responder com força assim que ela ameaça invadir o território de seus membros. "Estamos aprimorando rapidamente a prontidão de nossas forças", disse à revista The Economist o general britânico Sir Tim Radford, segundo na cadeia de comando do Exército britânico. "E nossa capacidade de resposta militar geral está aumentando exponencialmente."
<b>COOPERAÇÃO</b>
O patamar atual de cooperação da Otan com a Ucrânia não foi instantâneo e uniforme. A construção da frente de apoio passou por longas rodadas de negociação entre os líderes de vários países, a fim de superar preocupações que iam de novos avanços da Rússia contra a Europa central a outras represálias, como o corte do fornecimento de gás natural na Europa. Mas os temores foram superados diante da ameaça russa.
"A Otan nunca esteve unida desde a Guerra Fria. E isso é muito comum – e é um paradoxo da política internacional: você só une quando há um inimigo comum", disse ao Estadão o historiador russo-americano Leon Aron, diretor de Estudos Russos no American Enterprise Institute.
<b>SUPERAÇÃO</b>
Desde as primeiras negociações sobre sanções coletivas contra a Rússia até as negociações mais recentes, sobre o envio dos tanques, posições divergentes entre as potências militares ocidentais foram acolhidas e superadas coletivamente. Quando o chanceler alemão, Olaf Scholz, exigiu que os EUA enviassem tanques M1 Abrams à Ucrânia para que a Alemanha liberasse o envio de seus Leopard 2, Biden se comprometeu a liberar dezenas de unidades, mesmo considerando que sua aplicação no campo de batalha seria limitada por questões técnicas.
A cada novo pacote proposto, os países têm entrado em deliberação em suas instituições internas e, posteriormente, com os demais parceiros. Essa dinâmica acabou sendo, de acordo com Aron, um trunfo para a aliança e para a Ucrânia, pois criou um fluxo de envio militar que cresceu de forma escalonada, sem provocar uma reação explosiva de Moscou.
<b>AVANÇO GRADUAL</b>
"Se a Otan tivesse começado, desde o início, a entregar todo o poder de fogo e tecnologia militar à Ucrânia, isso teria assustado muito a Rússia – e teria realmente ameaçado levar a uma guerra entre Rússia e Otan. Mesmo com o ritmo mais lento, Putin ameaçou com o uso de armas nucleares táticas. Se a Otan entregasse tudo imediatamente, correria o risco de encarar o perigo de um erro de análise russo", disse Aron.
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>