O novo arcabouço fiscal divulgado nesta quinta-feira, 30, pelo Ministério da Fazenda pode ajudar estabilizar a trajetória da dívida pública, mas ainda deixa dúvidas em aberto, sobretudo em relação a mecanismos para controle de gastos, avaliam especialistas ouvidos pelo <b>Estadão</b>.
Isso porque a regra estabelece não só um teto, mas também um piso mínimo para as despesas – um crescimento de 0,6% ao ano acima da inflação. "Nos momentos em que a arrecadação crescer menos ou cair, a gente não vai conseguir cortar despesas, até mesmo para cumprir o mínimo de despesa que está no arcabouço", avalia a economista-chefe do Credit Suisse no Brasil, Solange Srour. "Esse arcabouço tinha de vir junto com uma reforma de gasto para ser crível nos momentos em que o PIB não cresce."
Já o economista-chefe da Warren Rena, Felipe Salto, avalia que esse piso funciona como uma espécie de "proteção" para momentos de retração econômica. "O novo arcabouço fiscal prevê que a despesa crescerá a 70% da taxa de crescimento da arrecadação, mas limitada a no máximo 2,5% e mínimo 0,6%. Esse intervalo evitará que se gaste muito em tempos de vacas gordas e que falte o fundamental em períodos de baixa do ciclo", afirma Salto, ex-secretário da Fazenda e Planejamento de São Paulo.
Ele exalta a combinação de um mecanismo de controle de gastos com metas de resultado primário e afirma que a regra apresentada deverá melhorar a trajetória projetada para a dívida pública.
A diretora da Instituição Fiscal Independente, Vilma da Conceição Pinto, diz que é positiva a projeção do governo de zerar o rombo das contas públicas em 2024 e gerar superávit primário de 0,5% do PIB em 2024 e 1% do PIB em 2026 – último ano do governo Lula -, mas avalia que é preciso sinalizar com quais mecanismos esse resultado será alcançado. Só será sustentável se esse superávit for realizado por meio de medidas de caráter estrutural", afirma.
Salto pondera que as metas de resultado primário fixadas são ambiciosas e dependeriam de um forte aumento da arrecadação. "De todo modo, mesmo sem isso, a aplicação do controle de gastos ajudaria a melhorar o esforço primário ao longo do tempo e produziria efeitos relevantes sobre a trajetória da dívida em relação ao PIB."
Vilma pontua que, apesar de a nova âncora trazer mais flexibilidade para a gestão das contas públicas em relação ao teto de gastos – regra que limita o crescimento das despesas à variação da inflação -, a vinculação das despesas ao crescimento da arrecadação pode gerar o incentivo de busca por receitas não recorrentes.
"Pesa a boa intenção de se preservar os investimentos públicos; mas, ao se criar um piso (pela inflação), a regra também aumenta a rigidez da atual estrutura orçamentária", diz a diretora da IFI.
<b>Detalhamento</b>
O pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV) Fabio Giambiagi avalia que faltou detalhamento na divulgação do arcabouço fiscal. "Depois de semanas de suspense, esperavam-se explicações mais convincentes acerca de como o governo pretende transitar os próximos três a quatro anos em matéria fiscal", diz.
Ele sugere que, em abril, com a divulgação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), o governo divulgue um quadro detalhado, de 2023 a 2026, de qual é cenário básico com o qual as autoridades trabalham para o comportamento das receitas e despesas.
"Na receita, decompondo em IPI, IR, IOF, Cofins, PIS-Pasep, CSLL, receitas de exploração de recursos naturais, dividendos e concessões. E, no lado das despesas, mostrando a evolução das principais rubricas: pessoal, INSS, FAT, LOAS, Fundeb, subsídios, sentenças judiciais, Bolsa Família, saúde e educação e outras despesas", diz.
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>