Em derrota sofrida no plenário, o presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), adiou nesta sexta-feira, 26, a votação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que amplia a imunidade parlamentar. Sem acordo com os partidos, Lira desistiu de votar a proposta às pressas e anunciou a criação de uma comissão especial para analisar o texto. A medida ficou conhecida como "PEC da Blindagem" porque limita as situações em que parlamentares podem ser presos, além de proibir o afastamento do mandato por ordem judicial.
Diante da pressão das redes sociais, de críticas do Supremo Tribunal Federal e até mesmo do racha no próprio Centrão, Lira atendeu a pedidos de deputados e disse que a PEC passará antes pelo crivo de uma comissão especial. Foi o primeiro revés sofrido por ele desde que venceu a eleição para o comando da Câmara, no último dia 1.º.
A PEC chegou ao plenário na esteira da prisão do deputado Daniel Silveira (PSL-RJ), que publicou um vídeo fazendo ofensas a integrantes do Supremo e apologia do Ato Institucional n.º 5, o mais violento da ditadura militar. A prisão foi determinada pelo ministro do STF Alexandre de Moraes no dia 16, referendada no plenário da Corte e confirmada pela Câmara.
O cronograma estabelecido por Lira após o revés diz que os partidos devem indicar nomes para o colegiado até a próxima segunda-feira, 1º, mas não há definição sobre quando o grupo começará a trabalhar. Além disso, o lockdown estabelecido no Distrito Federal, para conter a contaminação por covid-19, deve ter novo impacto nas atividades do Congresso.
"Esta Casa de novo hoje (sexta, 26) não consegue consensuar a alteração de um artigo. Nós não conseguimos nos entender. E não será atropelando o regimento que o faremos", disse Lira, ao encerrar a sessão.
O artigo citado pelo presidente da Câmara é o 53 da Constituição, segundo o qual deputados e senadores são invioláveis, "civil e penalmente", por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos. A Carta diz, ainda, que os parlamentares serão submetidos a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal.
A principal polêmica da proposta apresentada pela relatora da PEC, deputada Margarete Coelho (Progressistas-PI), foi sobre a possibilidade de processos contra parlamentares por crimes contra a honra, como calúnia, difamação e injúria. Pelo texto, os congressistas só poderiam ser julgados por procedimento incompatível com o decoro "exclusivamente" no Conselho de Ética da Câmara ou do Senado, e não mais na Justiça.
Alguns partidos, como o PT, discordaram e pediram a retirada do termo "exclusivamente" do artigo, de forma que deputados e senadores pudessem continuar respondendo também na Justiça. A relatora concordou com o pedido, mas, depois, foi a vez do PSL – sigla que até 2019 abrigou o presidente Jair Bolsonaro – ficar contra a proposta.
<b>Debate</b>
Outro ponto de controvérsia foi a definição de quais crimes poderiam resultar na prisão de deputados e senadores. O PT quis ampliar o rol de crimes inafiançáveis e incluir entre eles aqueles que atentassem "contra a democracia ou a existência dos poderes constituídos". O PSL foi novamente contra. Além disso, a bancada do PSD se mostrou dividida. "Se um parlamentar estiver com uma mala de dólares desviados da sociedade não poderá ser preso em flagrante. Isso é anticristão", criticou Fábio Trad (PSD-MS).
O deputado Paulo Teixeira (PT-SP) disse, por sua vez, que Daniel Silveira nem mesmo seria preso se a PEC fosse aprovada daquela forma. "Essa proposta abre a porta para, no futuro, outros deputados quererem guerrear contra o Supremo", afirmou Teixeira. "Esta PEC terá o nome de PEC Daniel Silveira. O que se pretende aprovando esse texto é dizer que a prisão dele foi ilegal. Nós estamos pensando na crise institucional maior que pode advir dessa votação", emendou o petista.
Lira demonstrou irritação e disse ficar "muito triste" com os adjetivos com os quais a PEC estava sendo rotulada. Além de se referir a ela como "blindagem", a oposição também a chamou de "PEC da Impunidade". "Deveria ser da democracia", rebateu o presidente da Câmara.
A proposta prevê que, no caso de prisão em flagrante, como foi a de Silveira, o parlamentar seja encaminhado à Câmara ou Senado, permanecendo sob a custódia "até o pronunciamento definitivo do plenário". Nos bastidores, integrantes do STF questionaram a viabilidade da medida.
Na prática, as dificuldades para aprovação do texto cresceram depois que ele foi aceito pelo plenário, na noite de quarta-feira. Anteontem, a sessão se arrastou por seis horas, mas, diante da resistência da oposição e até de aliados do presidente da Câmara, a votação foi adiada.
Sem acordo com o PT e o PSL, as duas maiores bancadas da Casa, a avaliação de deputados do Centrão, ontem, foi a de que a proposta não teria o respaldo necessário para ser aprovada em primeiro turno. Mais cedo, um requerimento para tentar obstruir a votação foi derrotado com apenas 302 votos, seis a menos do que os 308 necessários para aprovar a PEC.
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>