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ARTIGO – Em tempo de pandemia, “heróis das estradas” seguem relegados após greve de 2018

Algumas ações do governo federal foram realizadas, mas na prática pouco se mudou na vida dos motoristas

Nesse momento de crise mundial ocasionado pelo novo coronavírus, diversas profissões demostraram ser essenciais para a manutenção mínima da rotina da vida humana. Dentre esses profissionais estão os motoristas que transportam cargas em diferentes regiões do país.

Consciente dessa importância, algumas instituições vêm realizando ações para agradecer e valorizar esses profissionais que, mesmo durante a pandemia, continuam trabalhando levar o suprimento necessário para população.

A Volvo Caminhões apresentou a campanha “Heroes of the Road”. A concessionaria CCR distribuiu 50 mil refeições gratuitas aos caminhoneiros. Já o Ministério da Infraestrutura e o Serpro aperfeiçoaram o aplicativo InfraBr, que passou a fornecer informações sobre o acesso a suprimentos essenciais para os motoristas durante suas viagens. Além de agradecer, as iniciativas reforçam a compreensão da importância do transporte de cargas na vida das pessoas e o no desenvolvimento econômico.

Um evento que demostrou a relevância do transporte de carga e dos motoristas foi a greve dos caminhoneiros, em 2018, que durou 10 dias. Período suficiente para esvaziar prateleiras nos varejistas, levar escassez de combustíveis, paralisar diversas empresas de diferentes segmentos por falta de insumos, entre outras situações.

Apesar das evidentes razões para chamarmos os motoristas que transportam cargas por toda parte do Brasil de “Heróis das Estradas”, há uma série de desafios com a qual esses profissionais se deparam diariamente para exercer sua profissão. Um ponto importante a ser considerado é que do total de veículos disponíveis para prestar serviço de transporte de carga rodoviários, aproximadamente 40% são pequenos transportadores e/ou motoristas autônomos. E são exatamente esses prestadores que sentem no seu dia-a-dia as precariedades do sistema de transporte.

Esse foi um dos temas debatidos na Conferência Internacional sobre Redes de Empresas e Gestão de Logística – NETLOG – que ocorreu na semana seguinte à finalização da greve dos caminhões.

Entre as precariedades apontadas estão as más condições das rodovias brasileiras, que geram perdas de vidas, além dos prejuízos ambientais e econômicos. A falta de qualidade nas rodovias acelera o desgaste mais rápido dos veículos, aumentando os custos de manutenção e tornando a atividade mais lenta e acentuando a exposição a acidentes.

O mercado de frete é bastante competitivo e, como estratégia para reduzir custos e otimizar suas operações, as transportadoras terceirizam seus serviços aos motoristas autônomos, que praticam preços inferiores aos considerados aceitáveis, dado ao seu baixo poder de negociação e, muitas vezes, por desconhecerem seus custos totais reais.

Outra situação é a condição dos veículos. 36,5% dos motoristas autônomos conduzem veículos com idade superior a 23 anos. Entre os agregados esse percentual é de 27,5%. Esses heróis também relatam o não pagamento de saldos dos fretes e estadias por parte de algumas transportadoras e embarcadores. Os motoristas, por não terem instruções e/ou disponibilidades de tempo, acabam arcando também com esse prejuízo.

Essa é uma pequena amostra das diversas dificuldades vivenciadas diariamente por esses profissionais. Elas comprovam mais uma vez que os motoristas são essenciais para população e para a economia. Mas, poucas coisas mudaram nos seus cotidianos após a greve de 2018. Espera-se que findado o período de pandemia, esses “Heróis das Estradas” não sejam novamente esquecidos e que ações eficazes sejam realizadas para valorizar e melhorar o seu dia-a-dia.

Algumas ações do governo federal foram realizadas, como a Política Nacional de Pisos Mínimos do Transporte Rodoviário de Cargas e o programa Roda Bem Caminhoneiro, mas na prática pouco se mudou na vida dos motoristas.

Uillicre J. Silva é pesquisador, professor e coordenador do curso de Logística e Administração no Centro Paula Souza. É mestre em Administração, pós-graduado em Logística Empresarial, e graduado em Administração de Empresas, com mais de 20 anos de experiência na área.

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