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Às vésperas de sorteio da Copa, delator acusa futebol russo de doping

A sombra do doping volta a rondar a Rússia, às vésperas de o país receber as seleções que irão participar da Copa do Mundo de 2018. Nesta semana, Moscou organizará o sorteio das chaves do Mundial, uma espécie de ponta pé inicial da Copa.

Mas revelações por parte de advogados do ex-chefe dos laboratórios russos de controle de doping, Grigory Rodchenkov, colocam pressão sobre o Kremlin e sobre a Fifa. Ao jornal britânico The Mail on Sunday, o advogado Jim Walden informou que, dois anos depois de optar por denunciar o sistema de doping de estado na Rússia, seu cliente jamais foi contactado pela Fifa.

Vitaly Mutko, citado como um dos responsáveis por camuflar o doping, foi membro do Conselho da Fifa, presidente do Comitê Organizador da Copa e vice-primeiro ministro da Rússia. Na sexta-feira, durante o sorteio do Mundial, ele e o presidente Vladimir Putin, devem estar presentes.

Rodchenkov teria evidências de que dezenas de jogadores russos, inclusive convocados para a seleção, faziam parte do esquema de doping montado pelo governo. Segundo ele, o time inteiro da Rússia que foi ao Mundial de 2014, no Brasil, precisaria ser investigado.

No ano passado, a partir de seus dados, as investigações da Agência Mundial Antidoping revelam um doping sistemático no futebol russo, colocando pressão sobre a Fifa que, durante anos, afirmou que o doping não era um problema do futebol.

O ex-chefe do laboratório, que fugiu para os Estados Unidos, ainda teria submetido informações ao COI sobre como Mutko se reuniu com ele três vezes em Sochi, em 2014, para discutir casos envolvendo atletas nos Jogos de Inverno daquele ano. Ele ainda conta que os russos pediram que ele interviesse nas amostras de sangue de atletas ucranianos para os contaminar e incriminá-los.

Na Fifa, a entidade diz que as investigações continuam. Mas que não conseguiu falar até hoje com Grigory Rodchenkov. O delator nega que a entidade tenha tentado entrar em contato. Nos últimos meses, a Agência Mundial Antidoping escreveu cartas a todas as federações, inclusive à Fifa, oferecendo ajudar nas investigações e até se apresentando como uma ponte para as evidências.

As constatações fazem parte do trabalho realizado pelo investigador canadense, Richard McLaren. Segundo ele, mais de mil atletas russos em 30 modalidades diferentes foram beneficiados por esquemas que esconderiam o doping.

Emails revelam como as autoridades russas manobraram para camuflar também o doping registrado no futebol. No total, 33 jogadores foram identificados e seus nomes foram entregues para a Fifa para que uma investigação seja realizada. Segundo os emails, estrangeiros também estariam no esquema montado para proteger os atletas.

Num dos contatos entre autoridades russas e o laboratório de Moscou, nomes de jogadores de times da primeira divisão foram apresentados. O pedido era para que fossem alvo de uma operação para impedir que seus testes positivos no doping representassem uma suspensão. A ordem era de mudar o resultado final.

Num outro email, os investigadores encontraram evidências de que, quando o doping envolvia o futebol, a questão deveria ser tratada pela mais alta cúpula do governo. “Futebol – não tocar”, alertava um email do laboratório a funcionários do Ministério dos Esportes. “A decisão do VL é a válida”, indicou. VL era a inicial usada para Vitaly Mutko, ex-ministro de Vladimir Putin e chefe da organização da Copa do Mundo.

Base – O doping ainda envolvia as categorias de base. Num dos emails, de maio de 2014, o chefe do laboratório de controle de doping, Grigory Rodchenkov, escreve ao vice-ministro do Esporte, Alexei Velikodniy. “Caro Alex, é urgente para o time juvenil”, diz o email. “Eles tem um jogo, é futebol”, explica. “Precisamos de um resultado atípico”.

No dia 23 de maio também de 2014, Rodchenkov recebe do vice-ministro um pedido para que “salve” um atacante da seleção juvenil da Rússia, pego com “enormes quantidades de maconha”. “Eles vão jogar no Campeonato Europeu”, explicou o vice-ministro. Visivelmente irritado, o chefe do laboratório escreve: “o que é esse jogador de futebol. Jogue-o para fora do time!!”. Ele também recomenda um “tapa na cara” do jogador. Mas cumpre a ordem.

Antes mesmo disso, no dia 25 de março de 2014, o vice-ministro mandaria ao laboratório um pedido para que fosse “salvo” um “jogador da seleção nacional para o campeonato europeu”. Um dos jogadores teria sido pego com “diurético traimterene (pequeno, mas pode ser claramente visto)”.

Ainda que os dados sejam de uma pequena parte de atletas do futebol, a revelação deveria ter obrigado a Fifa a abrir um procedimento para avaliar o caso e reconhecer que o doping também é um problema do futebol.

Nos últimos anos, a Fifa insistia que o problema era insignificante, com a ausência total de casos de doping em Copas do Mundo, desde o caso de Diego Maradona em 1994. As revelações, porém, indicam que a ideia de que o futebol não seja afetado não se sustenta.

O Estado apurou que, para o presidente da Fifa, Gianni Infantino, a esperança é de que o caso seja resolvido no COI, e que sua entidade não seja obrigada a entrar em rota de coalizão.

Oficialmente, Mutko foi afastado da Fifa. Mas continua sendo a pessoa de contato entre a organização e Vladimir Putin. Para McLaren, é “inconcebível” que o ministro não soubesse do doping de estado promovido em seu país. Mutko foi impedido de viajar ao Rio para os Jogos de 2016. Mas, num sinal de que vai desafiar a entidade antidoping, Putin o escolheu para ocupar o cargo de vice-primeiro-ministro do país.

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