Especialistas em Direito do Trabalho definem que o assédio, seja ele moral ou sexual, é um espécie de degradação do ambiente de trabalho, que por determinadas condutas abusivas, às vezes desenfreadas, de superiores hierárquicos sobre os seus subordinados torna impossível a continuidade da relação trabalhista.
O mestre em Direito do Trabalho e professor da pós-graduação da PUC-SP, Ricardo Pereira de Freitas Guimarães explica que o assédio moral é caracterizado, principalmente, pela violação da dignidade profissional de um trabalhador. “Este tipo de assédio pode ocorrer de forma sutil, num gesto como um simples “balançar de cabeça no sentido negativo”, desde que reiterado quando manifestada uma opinião sobre um trabalho em reunião, ou mesmo um sorriso carregado de cinismo, também em reiteradas vezes, por um colega de trabalho. E também de outras formas como a retirada aos poucos de funções que antes eram delegadas para determinado empregado; passar a não convidar determinado empregado para frequentar reuniões que outrora participava; retirada de instrumentos de trabalho; transferências de setor; entre outros”, exemplifica.
Freitas Guimarães salienta que essas atitudes, quando reiteradas, demonstram, por meio de ordens e gestos, que aquela pessoa, seja chefe ou colega de trabalho, não contribui em nada para o sucesso do ambiente de trabalho. “Essa atitudes criam um desgaste no íntimo do trabalhador assediado, muitas vezes até fisiológico, o que pode provocar uma série de problemas para a empresa e para o trabalhador”, afirma.
A advogada Rosanne Maranhão, sócia do Braga e Balaban Advogados, que também é mestre em Direito Político e Econômico, destaca que o assédio é um tipo de violência que expõe os trabalhadores a situações vexatórias, constrangedoras e humilhantes. “Esses atos visam humilhar, desqualificar e desestabilizar, emocionalmente, a relação da vítima com a organização e o ambiente de trabalho”.
Perfil
O perfil do assediador, segundo os especialistas, é de um superior, ou seja, aquele chefe que agride o subordinado. Entretanto, um colega também pode agredir outro colega, quando este, por exemplo, ganha uma promoção. “Geralmente, os assediadores são pessoas com sentimento de grandeza, prepotentes, arrogantes, egocêntricos etc. Em suma, são indivíduos que não admitem ser questionados ou censurados e, na maioria das vezes, são insensíveis, inescrupulosos e invejosos”, revela Rosanne Maranhão.
A advogada trabalhista Renata Macedo do Lago, do Rodrigues Jr. Advogados, avalia que um fato recorrente é o assédio de chefes inseguros a seus subordinados, temendo que estes lhe tomem o cargo. “No caso do assédio sexual, os assediadores são, em sua maioria, homens e as vítimas, geralmente, mulheres. Mas é evidente que o assédio pode ser perpetrado tanto de mulheres contra homens como entre as mulheres e entre os homens”, aponta.
Para Rosanne Maranhão entre as vítimas, em sua maioria, estão os trabalhadores honestos, perfeccionistas e que não faltam ao trabalho. “Os empregados mais solitários, sensíveis, portadores de alguma deficiência ou com problemas de saúde, podem ser um bom alvo de assédio. Ainda não podemos esquecer aqueles que têm orientação sexual ou crença religiosa diferente daquela do agressor e das mulheres casadas, grávidas ou com filhos pequenos”, lembra a advogada.
Provas
O professor Freitas Guimarães revela que um dos grandes problemas que envolvem o assédio no trabalho é a comprovação do fato e das circunstâncias. As principais provas para configuração do assédio são e-mails, bilhetes, presentes e, principalmente, colegas de trabalho que sejam testemunhas dos fatos.
“Em regra, não é uma prova fácil de ser produzida em juízo, pois, por óbvio, os atos atentatórios quase nunca são escancarados, mas sim aproveitando-se da surdina”, afirma a advogada do Rodrigues Jr. Advogados.
Segundo Rosanne Maranhão, o primeiro passo para denunciar o assédio é romper o silêncio. “A vítima deve dizer não ao assediador, contar para os colegas de trabalhado o que está acontecendo e comunicar o fato ao setor de recursos humanos da empresa e ao seu sindicato. E, no caso de assédio sexual, registrar a ocorrência na Delegacia da Mulher ou, na falta dessa, em uma delegacia comum. Deve também comunicar o fato à Superintendência Regional do Trabalho e Emprego, em sua localidade”, orienta.
Assédio sexual é crime
O assédio sexual é uma forma de abuso de poder que visa à intimidação da vítima, em sua maioria mulheres, com o objetivo de obter vantagem, ou favorecimento de ordem sexual, por meio de chantagens ou propostas antiéticas. Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT) cerca de 52% das mulheres economicamente ativas de todo o mundo já sofreram assédio sexual.
De acordo com a advogada Renata do Lago, a chantagem sexual é um ato praticado por superior hierárquico, capaz de oferecer uma promoção, por exemplo. Já no caso da intimidação, esta pode ser caracterizada pelas populares “cantadas”, brincadeiras indesejadas, de mau gosto, inoportunas, abusivas e, muitas vezes, excessivas.
Os especialistas alertam que o assédio sexual é crime, previsto na Lei nº 10.224 de 15/05/2011, que deu redação ao artigo 216-A do Código Penal, com pena prevista de detenção de um a dois anos. A legislação trabalhista, porém, é omissa quanto ao assunto. Na prática, as sanções ao assediador variam desde advertências, para casos “mais leves”, até a aplicação da justa causa.
Empresas devem investir em prevenção
A desenfreada busca pelo sucesso financeiro de algumas empresas não pode deixar escapar a sua atenção a prevenção do assédio. Segundo especialistas, as ações preventivas são necessárias para evitar que determinadas companhias tenham a imagem arranhada ou destruída ao longo do tempo, além de eventuais problemas no Judiciário.
Na visão do professor Freitas Guimarães, as empresas devem criar mecanismos internos e políticas de liderança. “A prevenção é postura que atinge a todos pois o Estado, que por nós é financiado, gasta menos com os doentes; e a empresa mantém sua imagem um ambiente produtivo que tem como consequência o sucesso econômico, além do empregado manter incólume sua saúde. Necessário compreender que essa é a verdadeira função social da empresa, qual seja, tratar o empregado sempre com dignidade”, alerta.
A advogada Renata do Lago concorda e orienta as empresas a adotarem ações que inibam comportamentos assediadores, como a criação de canais de comunicação, inclusive com opção de garantia de sigilo. “É necessário orientar e prevenir. Realização de palestras e discussões voltadas aos temas de maneira aberta e até a regularização da forma de tratamento entre colegas, por meio de diálogos com gestores de RH são alguns caminhos importantes”.
Em 2013, o Ministério do Trabalho e Emprego lançou uma cartilha explicando as formas de assédio e até ações preventivas que a empresa pode adotar. A cartilha pode ser consultada na página do ministério na internet: http://portal.mte.gov.br/data/files/8A7C812D3CB9D387013CFE571F747A6E/CARTILHAASSEDIOMORALESEXUAL%20web.pdf