Em uma mansão em Los Angeles, Jamie Hince e Alison Mosshart, guitarra e voz do duo quentíssimo The Kills, se reuniram para gravar mais um álbum. Já era tempo. A dupla nunca passara mais de três anos sem um disco. Cinco anos haviam voado, contudo. Rápidos demais. “É uma das questões que mais fazem para a gente: por que demoraram tanto para gravar um novo disco?”, diz Hince, ao telefone. “E, olha, para a gente, não pareceu tanto tempo assim.”
O Kills que volta ao Brasil como atração do Rock in Rio na noite de 21 de setembro, no Palco Sunset, mesma data que Bon Jovi, Alter Bridge, Tears For Fears e Jota Quest (veja mais ao lado), já não é o mesmo da última turnê deles por aqui. No fim de 2011, a banda passou três dias no Brasil e fez três shows (dois em São Paulo, como parte do festival Popload Gig, e um no Rio). A banda é a mais indie de um festival dominado por atrações gigantescas, responsáveis por levar 80 mil por noite à Cidade do Rock.
“Acho que gosto da intensidade de turnês como aquela”, relembra Hince, que esteve na capital paulista outras vezes “em visitas a alguns amigos”. “São Paulo, para mim, é um dos melhores lugares do mundo depois que você entende como ela funciona”, elogia.
“Com o tempo, contudo, passamos a entender que não é preciso fazer aquele tipo de turnê”, ele continua. “No começo da nossa carreira, nossa, tocávamos demais. Todas as noites. Quando chegávamos no fim de uma turnê, estávamos exaustos. Era visível como estávamos acabados. Agora, ficamos na estrada por quatro ou cinco semanas e tiramos um tempo para descansar. Visitamos lugares incríveis demais nessas turnês para ficarmos trancados em camarins e casas de shows.”
Não são, contudo, os 15 anos de Kills e os 48 de existência de Hince os responsáveis por mudar a perspectiva dele sobre o mundo ao seu redor. Nos cinco anos, a vida do Kills se transformou. Ela se mudou para Austin, no Texas, para trabalhar em um novo disco do The Death Weather, supergrupo formado ainda por Jack White, Dean Fertita (do Queens of the Stone Age) e Jack Lawrence (do The Raconteurs e The Greenhornes) – o trabalho, Dodge and Burn, saiu em 2015. A vida de Hince se metamorfoseou ainda mais.
E a mudança de Londres para a ensolarada Los Angeles foi somente a última delas.
Em 2015, chegou ao fim o casamento de quatro anos dele com a supermodelo Kate Moss. O guitarrista também se viu sem inspiração para as novas canções. Vazio, na cabeça e no coração, isolou-se. Embarcou em uma viagem de trem pela ferrovia Transiberiana, onde passou duas semanas e percorreu quase 10 mil quilômetros. Voltou com cadernos cheios de letras e pronto para voltar a gravar com o Kills.
Fisicamente, Hince que vai tocar para a multidão carioca também não é mais o mesmo daqueles shows em lugares calorentos e apertados de 2011. Em 2013, Hince fechou a porta do carro na mão esquerda, aquela responsável por manusear o braço das guitarras, fazer acordes e solos. Foram cinco cirurgias para voltar a conseguir tocar o instrumento, mas seu dedo médio não recuperou os movimentos.
Tudo isso está em Ash & Ice, o que faz do álbum do Kills o mais interessante entre os cinco discos lançados pela dupla. Se antes, noitadas insones, bebedeiras e festanças daquelas eram o fio condutor dos trabalhos do duo, agora os temas se adensam. Com a incapacidade de Hince tocar acordes complexos, a guitarra dele agora ressoa como se cantasse ao lado de Mosshart, em um dueto infernal de voz e distorção. Temas como rompimentos se sobressaem entre letras com mensagens mais positivas de “tudo vai dar certo no final”. E prova que o melhor do Kills nunca esteve ao festejar a noite toda e, sim, na manhã seguinte, na ressaca incômoda e no arrependimento. “Sem dúvida alguma, nós mudamos bastante em termos de inspiração”, diz Hince, que segue, “mas continuamos mudando”. Ele dá como exemplo Echo Home, uma canção que fala sobre a casa esvaziada depois que a outra metade do casal já não está mais lá. “Era uma música que tinha um significado para mim. Ao descobrir o que as pessoas pensavam dela, a minha interpretação sobre essa canção também mudou.”
Hince fala com o jornal “O Estado de S. Paulo” da casa onde mora de Los Angeles. Da janela, ele é capaz de ver a mansão onde Ash & Ice foi gravado. Foi a primeira vez que o Kills gravou em outro lugar que não o estúdio de sempre na cidade de Benton Harbour, no estado norte-americano de Michigan. O álbum traz intrínseco em suas canções prioritariamente garage rock, o frescor e o calor da Costa Oeste depois de uma temporada gelada demais. “Percebi como funcionamos nesse disco”, diz Hince, ao fim da entrevista. “O Kills é assim: é a reação a uma ação.”
ATRAÇÕES DO DIA
PALCO SUNSET
Ana Cañas convida Hyldon:
O encontro da voz multifacetada dela com o soul do cantor.
The Pretty Reckless:
Metal alternativo liderado pela ex-atriz da série Gossip Girl.
The Kills:
O garage rock deles tem tanto estilo quanto seus integrantes.
Alice Cooper + Arthur Brown:
Encontro de dois ícones do rock de terror.
PALCO MUNDO
Jota Quest:
Banda mineira com suingue gringo volta pela terceira vez.
Alter Bridge:
Integrantes do Creed reunidos com o vocalista Myles Kennedy.
Tears for Fears:
Eles têm incontáveis hits e farão show nostálgico dos bons.
Bon Jovi:
Mesmo sem Richie Sambora, grupo manteve a boa pegada.
THE KILLS NO ROCK IN RIO
Cidade do Rock. Av. Embaixador Abelardo Bueno, 3401, Barra da Tijuca. Dia 21 de setembro. R$ 455 (ainda há ingressos).
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.