O atraso na coleta do Censo Demográfico 2022 "traz riscos à qualidade da informação", alertou nesta quinta-feira, 8, o sindicato nacional dos servidores do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o ASSIGBE-SN.
"De forma mais imediata, é preciso alertar que o simples prolongamento da coleta traz riscos à qualidade da informação, na medida em que as entrevistas se distanciam da data de referência do censo (31 de julho)", escreveu o sindicato, em comunicado.
O IBGE informou na última terça-feira, 6, ter prorrogado novamente a coleta em campo do Censo. O prazo foi estendido de dezembro até, no mínimo, o fim de janeiro. O trabalho de levantamento de informações, que teve início em 1º de agosto deste ano, estava previsto inicialmente para ser concluído no fim de outubro.
"Um quarto da população brasileira (cerca de 50 milhões de pessoas), ainda não foi contabilizada pelo Censo 2022. Trata-se de um imenso atraso na operação, tanto em relação ao seu planejamento (era esperado que o Censo terminasse até o final de outubro) quanto se comparado ao recenseamento de 2010, que no mês de novembro já divulgava resultados substanciais", lamentou o sindicato.
Segundo o ASSIBGE-SN, o problema é sistêmico, uma vez que houve atraso em todas as unidades da federação, sendo possível já vislumbrar que "o recenseamento só poderá ser concluído com o prosseguimento da coleta nos primeiros meses de 2023".
"Essa situação não é de modo algum uma surpresa. As dificuldades do Censo revelam o processo de desmonte do IBGE, há muito apontado pela ASSIBGE. Mais especificamente, já em 2019 a ASSIBGE alertava que o corte orçamentário do Censo e a alteração de seu projeto técnico – determinados pelo Ministro Paulo Guedes e acatados pela direção por ele nomeada no IBGE – traziam sérios riscos à operação censitária", declarou o sindicato.
Os técnicos do IBGE orçaram inicialmente a operação censitária em R$ 3,1 bilhões, para que ocorresse em 2020. No entanto, a verba acabou cortada para R$ 2,3 bilhões, e os questionários foram enxugados.
Em função da pandemia de covid-19, o levantamento foi adiado para 2021, mas acabou inviabilizado naquele ano por falta de destinação de orçamento pelo governo federal. Após decisão do Supremo Tribunal Federal, o governo do presidente Jair Bolsonaro ficou obrigado a disponibilizar recursos para a realização do Censo em 2022.
O sindicato avalia que o orçamento inicialmente proposto, de R$ 3,1 bilhões, precisaria ser corrigido pela inflação para R$3,7 bilhões para que o Censo fosse conduzido de forma adequada.
"Para comparação, em 2010 a população brasileira era 10% menor do que a atual, mas ainda assim o orçamento do Censo de 2010, atualizado pela inflação, equivaleria a R$ 3,4 bilhões em 2022. A desidratação do orçamento implicou na compactação de toda estrutura do Censo: redução das equipes, diminuição na divulgação, corte no número de equipamentos e combustível, e finalmente, redução nos valores pagos aos recenseadores e supervisores", enumerou o sindicato.
Apesar dos esforços para flexibilizar regras de contratação e melhorar a remuneração de recenseadores, o instituto permanece ainda com dificuldades de preencher as vagas necessárias em determinados locais. Como consequência, os dados sobre a população de estados e municípios que serão entregues ao Tribunal de Contas da União (TCU) em 26 de dezembro ainda precisarão ser completados, em parte, com estimativas populacionais feitas com base nos dados do novo censo. As informações sobre contingentes populacionais são usadas no rateio do Fundo de Participação de Estados e Municípios.
"As baixas remunerações dos recenseadores provocaram pouca procura por vagas, alta desistências e produção de questionário em ritmo lento. De um total de cerca de 180 mil recenseadores previstos para estarem trabalhando no auge da operação, apenas 140 mil estavam contratados no mês de outubro, e desse total apenas 95 mil eram considerados produtivos, o que corresponde a 52% do total de vagas disponíveis e previstas para a operação", avaliou o ASSIBGE-SN.
Em todo o País, o IBGE contava com 60.611 recenseadores em ação no início desta semana, cerca de um terço de todas as vagas disponibilizadas. A redução no quadro de servidores efetivos também é um empecilho ao bom andamento do trabalho censitário, aponta a entidade que representa os funcionários do órgão.
"Enquanto na operação censitária de 2010 o IBGE contava com 7 mil funcionários efetivos, no momento o instituto conta com pouco mais de 4 mil. O quadro reduzido resultou em uma série de gargalos na área técnica, administrativa e de informática. Para organização da rede de coleta censitária, o IBGE teve que contratar trabalhadores temporários para preencher 1.343 vagas para Coordenador de Subárea temporário (CCS) e 31 vaga para Coordenador de Área, postos estratégicos para assegurar agilidade e qualidade no Censo e que eram ocupados, nas edições anteriores, por funcionários do quadro. Sem trabalhadores experientes e conhecedores do território e dos trâmites do IBGE, o desenrolar da operação se tornou mais lento e aumentou o desencontro de informações", alegou o sindicato.
A nota acrescenta que o último concurso para o órgão foi realizado em 2016, o que fez os trabalhadores temporários (mesmo excluindo o pessoal contratado para o Censo Demográfico) responderem por 60% da força de trabalho do instituto.
"O atraso no recenseamento permitiu a adoção, justificada como emergencial, de uma série de adaptações que precarizam o processo de trabalho: contratação sem processo seletivo, afrouxamento dos requisitos para contratação, redução do treinamento, remanejamento não planejado de pessoal das pesquisas regulares para o recenseamento, flexibilização no plano de supervisão, cancelamento de feriados e contratação de consultores. Todas essas ações improvisadas acendem o sinal de alerta para o uso do Censo como um balão de ensaio de formas cada vez mais precárias de trabalho – o que traria enormes prejuízos à produção estatística", opinou o sindicato.
"Nesse momento em que o Brasil entra em fase de reconstrução política, social e econômica, o atraso do Censo demonstra a impossibilidade de uma produção estatística consistente sem que haja a reconstrução do IBGE e do sistema estatístico nacional. A ASSIBGE-SN reforça a necessidade de concurso público, orçamento e autonomia técnica para o IBGE visando a reconstituição da capacidade técnica e operacional do órgão. Sem essas condições elementares, aumenta o risco do Brasil sofrer um apagão estatístico que afetará o planejamento das políticas públicas e o conhecimento da realidade brasileira."