Variedades

Autor evoca estrutura do grande Stephen King

No era do retorno dos clássicos e de seus blockbusters, o palhaço Pennywise, de It – A Coisa (1986), não teve descanso no cinema e tudo pode ser motivo para desfilar o clown com seus balões capazes de amedrontar adultos por muitas temporadas. Só que, mais importante que o figurão, a grandeza dessa obra de Stephen King está em produzir um terror interno pautado pelos medos profundos que conectam sete amigos. Essa é a mesma quantidade de personagens em Dostoievski Trip, que estreia neste sábado, 28, no Centro Cultural Banco do Brasil e uma cena particular sugere relações.

Para além do número cabalístico, a cidade de Derry foi palco para uma história escrita sem pensar nos limites do tempo e cheia de detalhes sobre a personalidade e a rotina das crianças que viram o palhaço monstruoso que se alimenta de medo, ao qual elas juraram combater até o fim.

Na peça, o autor russo Vladimir Sorokin se utiliza da estrutura narrativa em uma cena com grandes solilóquios. Nela, Aury Porto, Edgar Castro, Luah Guimarãez, Lúcia Romano, Marcos Damigo, Sergio Siviero e Vanderlei Bernardino tecem memórias no ambiente sonoro de Guilherme Calzavara. Tal qual as lembranças, o caminho percorrido também é sinuoso e sem destino aparente. Há uma esfera psicanalítica que se impõe, muito embora não tenha sido abordada diretamente pela direção. Assim, com o tempo, os relatos vão dando as mãos, interligando pessoas tanto pelo aspecto inútil de hábitos quanto pelo desejo de sobreviver, o que se confirma com as projeções e os depoimentos de moradores da Maloca Jaceguai, expulsos em uma operação de reintegração de posse.

Se a diretora acha que o autor conseguiu unir uma inspiração aparentemente tão distante de Dostoievski, por outro lado Sorokin comenta a produção literária e – por que não? – artística, também sujeita ao mero lugar de produto, que pode ser usado e descartado em seguida. King e Dostoievski podem não ter tantas relações imediatas, mas o medo que devasta a História é uma ferramenta que serve bem na mão dos poderosos.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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