Os três autores do pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff acolhido nesta quarta-feira, 2, pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) – os juristas Hélio Bicudo, Miguel Reale Júnior e Janaína Paschoal -, se disseram surpresos com a decisão e minimizaram o fato de, segundo eles, o peemedebista ter agido para retaliar o governo.
“Eu já não esperava mais que isso acontecesse e estava pensando sobre quais as providências poderíamos tomar para não passar em branco. Mas Cunha, enfim, despachou. E não fez nada mais do que a obrigação dele”, disse Bicudo.
Depois de apresentar uma primeira versão considerada frágil pelos técnicos da Casa, o trio elaborou um novo pedido que incluiu as chamadas “pedaladas fiscais” (prática de atrasar repasses a bancos públicos para o pagamento de programas como o Bolsa Família) realizadas em 2015.
O documento assinado pelos juristas foi escolhido como a peça de resistência da oposição pelo simbolismo, já que Bicudo foi um quadro importante do PT e Reale, que é ligado ao PSDB, foi ministro da Justiça de Fernando Henrique Cardoso.
“Não foi coincidência que Cunha tenha decidido acolher o impeachment no momento que deputados do PT decidiram votar favoravelmente à sua cassação no Conselho de Ética. Foi uma chantagem explícita, mas Cunha escreveu certo por linhas tortas”, diz Reale Júnior.
Para Janaína Paschoal, as motivações de Cunha “não tiram a legitimidade” do processo. “Foi uma surpresa para mim. Eu já não esperava mais. Não sei qual foi a motivação, mas ela não tira a legitimidade do processo”, afirma.
O documento tem três pilares, sendo o principal deles as chamadas pedaladas fiscais – o atraso do repasse de recursos a bancos federais para o pagamento de programas como o Bolsa Família. A nova versão incluiu o argumento de que essa prática se repetiu em 2015.
Os juristas também alegam que as dívidas do governo com os bancos públicos não foram incluídas na Dívida Líquida do Setor Público, que serve para conferir o cumprimento das metas fiscais e a presidente Dilma Rousseff teria sido omissa nos casos de corrupção na Petrobras. Uma terceira argumentação é que o TCU apontou que em 2014 o governo Dilma publicou decretos que abriam crédito suplementar para despesas do governo sem autorização do Congresso Nacional.
Argumentos
A avaliação dos juristas é que as pedaladas e o decreto são as questões mais graves presentes no documento, embora elas não sejam tão facilmente compreendidas pela população como a suposta omissão da presidente nos casos de corrupção na Petrobras.
“Parece ser um argumento técnico e contábil, mas não é. Se isso não tivesse ocorrido, não estaríamos na situação de depressão econômica que estamos”, diz Reale Júnior. “Já no caso da Petrobras há uma percepção mais direta”, avalia Reale Júnior. Ele reconhece, porém, que o processo no Congresso Nacional será muito mais político do que técnico.
“O processo de fato e mais político nesse instante em que a situação de desalento com a presidente é muito grande. A população não confia mais nela”, diz. “Agora é com a Câmara dos Deputados”, finaliza Hélio Bicudo. Em entrevista nesta quarta-feira, o senador Aécio Neves, presidente nacional do PSDB, classificou como “extremamente consistente” o pedido do trio.
Idas e vindas
O presidente da Câmara mudou várias vezes de posição sobre a admissibilidade do pedido de impeachment.
Sua primeira opinião, emitida em abril, durante um evento organizado pelo empresário tucano João Doria Jr, foi que as pedaladas “não sustentavam” o impedimento por terem ocorrido no mandato anterior.
Menos de um mês depois, porém, o peemedebista recebeu manifestantes anti-Dilma em seu gabinete. Em seguida, Cunha se aproximou do PSDB e deu vários sinais de que acataria o pedido. Ao mesmo tempo fazia sinalizações para os governistas de que poderia postergar a decisão indefinidamente. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.