Variedades

Ava Rocha explora novas experimentações no 2º disco solo

Ateia, mas budista vinda de família protestante. Índia, brasileira, colombiana. Cantora, compositora, poeta, cineasta. Mãe, esposa, filha de Glauber Rocha e Paula Gaitán. A complexidade tão humana de Ava Rocha se expõe aos poucos neste segundo disco da carreira, lançado recentemente, pelo selo Disco Maravilha. O álbum saiu em formato digital em março, disponível no site dela, iTunes e serviços de streaming, enquanto o físico está previsto para chegar em maio.

Um disco que fala do próprio umbigo, mas sem esquecer do mundo no qual ela está inserida. Foi uma entrevista em duas partes. A primeira, ao telefone. Ela falava do Rio de Janeiro, justamente no momento no qual o marido há 9 anos, o também cantor e compositor Negro Leo, se despedia para uma turnê fora de casa. A segunda parte é mais como um complemento, por e-mail, numa iniciativa dela. O ponto central era como Ava se via como compositora, o que a inspirava a escrever e de que forma isso acontecia.

Em Ava Patrya Yndia Yracema, nome do novo trabalho, ela assina seis canções, um número que corresponde à metade do total. Uma delas, contudo, escreveu em parceria com Leo, chamada Mar ao Fundo. Uma canção malemolente, com assobio de Leo e o som do vaivém das ondas ao fundo. Ela e ele cantam juntos e, talvez, seja uma canção que represente o que significa essa nova porção de músicas de Ava. É a primeira vez na qual a cantora assina por conta própria, sem a banda que levava o nome dela, com a estreia na música com o disco Diurno. Há ali uma espécie de reflexo da vida na capital fluminense. São canções quentes, espaçosas, executadas por uma banda formada por grandes nomes da música carioca, como Leo, Domenico Lancelotti, Marcelo Callado, Pedro Dantas, Claudio Andrade, Bruno Di Lullo, entre muitos outros. A produção fica por conta de Jonas Sá, que lançou o disco Blam! Blam!, recentemente. Os arranjos de sopros e cordas foram criados por Sá e Daniel Vasques.

O número de parcerias, ajudas e companheirismos tornam impossível dizer se tratar de um trabalho solo – e comprovam a união de uma cena carioca que, já não é de hoje, tem produzido material bastante consistente. “Não entendo muito essa relação do que é banda, o que é solo”, concorda Ava. “Para mim, tudo funciona como um processo de encontro, de invenção. São como filmes, há aquele processo, aquelas questões que existem naquele momento.”

Ela diz que o projeto de banda lançado em 2011 foi encerrado porque era o fim daquele ciclo. “Esse projeto, essa pesquisa, chegou ao fim. Mas não é um fim com espaço definito. A gente pode voltar a se encontrar, com aquela mesma formação”, disse ela, sobre o período ao lado de Daniel Castanheira, Emiliano Sette e Nana Carneiro da Cunha. “Tenho interesse em trabalhar com várias pessoas, com outros projetos. É segundo (disco) por acaso. Tenho certeza que o terceiro será muito diferente. Acho enriquecedor.”

O álbum anterior foi lançado pela gravadora Warner Music. Este, foi todo gestado de forma independente, ou, como Ava gosta de dizer, não “completamente independente”. “Ele dependeu da força de trabalho de vários músicos maravilhosos, do carinho de pessoas que fazem arte por amor, que estão na luta pela sobrevivência, pensando em como tornar a música algo viável.”

O álbum foi gravado entre janeiro e agosto do ano passado, no estúdio Maravilha 8, de Daniel Carvalho, engenheiro de som e filho do baixista Dadi, e do produtor Berna Ceppas. Trabalhar com o selo independente, que também pertence a Carvalho e Ceppas, permitiu o diálogo e a troca de experiências, algo diferente do período no qual foi artista do elenco da Warner Music. “Existiu a possibilidade de pensar num novo modelo. Encontrar novos caminhos. Na Warner, não havia essa possibilidade, mas espero que ela se abra para os novos tempos”, analisa a cantora. “Isso vai ser importante para a indústria como um todo. De toda forma, foram duas experiências legais.”

A relação de Ava com a composição é tão complexa quanto se poderia esperar. “É um exercício de pensar”, disse ela ao telefone. “Compor para mim é quase uma montagem. Não é fácil.” Por escrito, explicou que “compor transcende a composição musical, por isso disse que era uma montagem. Além da coisa da inspiração, tem muito do improviso. A composição me chama porque é um processo poético, de linguagem, de montagem, de invenção.” Por isso, o álbum é um conjunto muito próprio que não se prende a ela. “É como eu criasse uma síntese de mim com relação ao mundo. Sou uma poeira dentro disso e, ao mesmo tempo, um gigante. Quando falo de amor, falo de mim, mas falo do amor universal”, explica. “O disco tem esse contato com o surrealismo.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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