Azul comemora folga no caixa e mira em crescimento da demanda

A companhia Azul agarrou algumas oportunidades no mercado para se financiar e, depois de um terceiro trimestre difícil, avança com planos para a retomada do negócio no Brasil. Entre as janelas de oportunidade estão o mercado doméstico em constante melhora, com aposta de ganho no segmento corporativo no ano que vem. A base para esse otimismo está em uma posição de caixa privilegiada: são R$ 4 bilhões disponíveis depois de a empresa levantar R$ 1,745 bilhão em debêntures conversíveis. "Conseguimos suportar a nossa operação por mais de cinco anos", apontou o presidente da empresa, John Peter Rodgerson, em teleconferência.

A Azul registrou um prejuízo líquido de R$ 1,226 bilhão no terceiro trimestre de 2020, aumento de 122,7% na comparação com o prejuízo de R$ 550 milhões de igual trimestre de 2019. A receita líquida foi de R$ 805,3 milhões, queda de 73% no ano, mas um aumento de 100,5% comparado ao trimestre imediatamente anterior.

Já a receita líquida de Cargas e outras receitas cresceram 26,6% na comparação com o terceiro trimestre de 2019, totalizando R$ 180,8 milhões, relacionado principalmente com a melhora no desempenho da operação de cargas. O braço tem trazido uma boa sustentação ao setor aéreo durante o período de pandemia.

A segunda onda de covid-19 no Brasil ainda é uma incógnita, mas a aposta dos executivos é que ela não deverá ser um problema por aqui. Mesmo assim, a empresa tem outros US$ 100 milhões que pode levantar com uma emissão complementar de debêntures garantida pelos investidores âncora Knighthead Capital Management (o mesmo que colaborou com a recuperação judicial da Latam) e a Certares Management LLC.

A empresa tem um ano para decidir se levanta ou não o recurso adicional, mas Rodgerson disse que o cenário favorável o torna cada vez menos necessário. Já o BNDES está oficialmente fora da mesa, segundo o executivo. "Não precisamos de recursos do BNDES. Já informamos que não vamos usar".

Depois de uma intensa renegociação com arrendadores de aeronaves e outros parceiros, a empresa conseguiu uma economia de R$ 8,4 bilhões entre março 2020 e dezembro 2021. A aérea negociou também redução de salário temporária com funcionários. Apenas no que diz respeito aos arrendamentos operacionais, a companhia estima um pagamento de aproximadamente R$ 324 milhões no quarto trimestre, uma queda de 60% na comparação com o plano original.

Com o mercado mais favorável, a empresa projetou uma queima de caixa média por dia de R$ 1,5 milhão no quarto trimestre, sem amortização de dívida programada. A conta anterior da empresa apontava para um gasto por dia R$ 2,5 milhões nos últimos três meses deste ano. A empresa pode até gerar caixa no primeiro trimestre de 2021, embora isso não signifique ainda uma retomada para o terreno positivo, disse o diretor vice-presidente Financeiro e de Relações com Investidores da aérea, Alexandre Wagner Malfitani.

A Azul espera operar em dezembro mais de 80% da capacidade doméstica do ano passado. Em termos de malha, até dezembro, espera voar para 113 destinos, uma recuperação quase completa em comparação aos 116 destinos atendidos antes da crise. "Estimamos que entre 70% e 80% da nossa demanda corporativa deve voltar entre junho ou julho do ano que vem", disse o diretor vice-presidente de Receitas da Azul, Abhi Manoj Shah.

O executivo falou que as empresas estão adotando políticas individuais para definir quando retomar as viagens corporativas. "Em setores como o financeiro a demanda está mais fraca, mas no setor de óleo e gás estamos com uma boa recuperação (na casa de 50%)", comentou. A volta dos clientes corporativos, disse, tem acontecido com mais força, sobretudo na região Norte e Nordeste.

<b>Foco local</b>

No mercado internacional, a postura é de cautela. "Nosso foco é o doméstico hoje. O único mercado que estamos prontos para abrir quando chegar uma autorização dos Estados Unidos é o de Orlando", disse Shah. "Não esperamos nenhum crescimento internacional no ano que vem. Vamos continuar conservadores no segmento internacional e voar o widebody (aviões maiores) domesticamente", afirmou.

A empresa tem dez modelos Airbus na sua frota com capacidade entre 242 e 298 lugares. A frota operacional de passageiros no fim do trimestre era de 139 aeronaves, crescimento de 6,1% no ano.

<b>Avaliações</b>

A equipe do Citi apontou o resultado da Azul como neutro. O prejuízo por ação ajustado no terceiro trimestre foi de R$ 3,57, contra uma estimativa da casa de prejuízo por ação de R$ 2,88. Mas o Citi destacou que a capacidade doméstica prevista da Azul de 80% para dezembro – sendo que 76% das rotas da empresa são exclusivas – traz conforto para o cenário de retomada.

Já o Safra mantém uma visão cautelosa para a Azul, em meio a previsões nada positivas para retomada da economia no mundo por conta de uma segunda onda da covid-19. O analista Luiz Peçanha disse considerar as perspectivas muito negativas e ainda imprevisíveis para o setor de aviação civil. "Apesar dos esforços da empresa para enfrentar os impactos de curto prazo da fraca demanda, as perdas devem continuar a se acumular devido aos altos custos de correção das empresas. Em caso de recuperação da demanda mais rápida do que o esperado, a postergação de custos deve manter as margens pressionadas, postergando sua recuperação financeira".

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