Mundo das Palavras

Bassel, mártir da rebeldia na internet

No cartaz com que acompanhava a passeata, a senhora lamentava: nem todos os opositores da Ditadura Militar Pós-1964 foram mortos. Dias depois, o dirigente da CUT ameaçava pegar em armas na defesa do governo Dilma. Está, assim, de volta o fantasma da morte ao cenário das disputas políticas do país. 
 
O clima de confronto radical nos faz retroceder quase meio século, até quando o guerrilheiro argentino Ernesto Che Guevara foi executado na aldeia de La Higuera, no interior da Bolívia. Naquele período, jovens brasileirosque lutavam – uns, com armas, outros, desarmados – contra os militaresforam mortos nas prisões, como queria aquela senhora. Eles admiravam Che, que morreu no vigor dos seus 39 anos de idade. E, tinha expressado na seguinte frase seu entendimento sobre a obrigação moral que, segundo ele, deveria levar os jovens a se integrarem numa revolução social armada em países controlados por governos autoritários: “a vida não pode se tornar um vício do qual não tenhamos meios de nos libertar”.  Alegrias e sobressaltos advindos da conquista de diploma, ou numa carreira profissional, ou em casamento com filhos e netos eram, para Che, luxos dispensáveis. 
 
Hoje, aquele tipo de imolação deveria parecer anacrônico e desnecessário entre nós. Mas quer ressurgir no clima de radicalização em que mergulhamos. No Exterior, a imolação de jovens continua ocorrendo, como poderá comprovar quem tiver contratado o serviço da Netflix, assistindo ao documentário “Chicagogirl: The social network takes a on dictador”, com legendas em Português. No filme, está a saga de um novo tipo de Guevara, embora contem apenas com simples celulares. São jovens que se mantém firmes na busca de uma revolução social na Síria, até serem alvejados por atiradores pagos por Bashar al-Assad. 
 
O ditador manda eliminarestes jovens porque eles não aceitam o isolamento da Síria depois que Bashar expulsou do país todos os correspondentes estrangeiros. Com as câmeras de seus celulares, os jovenscaptam cenas de repressão e extermínio da população e a divulgam através da internet. Um deles, BasselShehadeh, produziu a maior parte do material editado no documentário, após sacrificar seu mestrado na Universidade Syracuse, dos Estados Unidos, onde dispunha de bolsa de estudos. Quando o filme foi concluído, Bassel já estava morto. Ele não era brasileiro, nem atuou após o Golpe Militar de 1964. Por estas razões, seu assassinato não pôde alegrar aquela senhora da passeata.
 

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