As áreas jurídicas do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal se manifestaram contra a concessão de uma liminar pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para antecipar os termos do acordo de recuperação fiscal firmado entre a União e o Estado do Rio de Janeiro.
As duas instituições financeiras apontaram ao relator da matéria, ministro Luiz Fux, uma série de inseguranças, como a possibilidade de a liminar não ser confirmada pelo plenário da corte ou até mesmo de as alterações legislativas necessárias para que o governo do Rio contrate novos empréstimos sejam rejeitadas posteriormente pelo Congresso Nacional, tornando as operações nulas.
Há dez dias, o Estado do Rio ingressou com uma ação no Supremo para pedir a antecipação dos termos do acordo assinado com a União. Na semana passada, o governador do Rio, Luiz Fernando Pezão (PMDB), fez uma peregrinação pelos corredores do STF em busca de apoio. A expectativa era de que Fux pautasse a ação para julgamento esta semana.
Os pedidos do governo fluminense focaram no afastamento de artigos da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) que vedam a concessão de novos empréstimos a Estados ou municípios que extrapolaram limites de gastos com pessoal ou endividamento, como é o caso do Rio.
Para isso, o Estado invoca o artigo 65 da LRF, que prevê a exceção em caso de calamidade pública. O objetivo do Rio é obter autorização prévia para contratar R$ 6,5 bilhões em novos financiamentos, oferecendo como garantia a futura venda da Companhia Estadual de Águas e Esgotos (Cedae) e royalties de petróleo.
O jurídico do Banco do Brasil foi enfático ao argumentar que a lei brasileira caracteriza como calamidade pública a situação provocada por um “desastre”, natural ou resultado de eventos adversos. Para a instituição, no caso do Rio de Janeiro, não foi comprovada qualquer anormalidade imprevisível decorrente de fato da natureza que tenha causado instabilidade social e institucional no Estado. O BB defende ainda que o decreto de calamidade financeira editado pelo Rio, bem como seu reconhecimento pelo Legislativo estadual, é inconstitucional.
O Banco do Brasil ainda destaca que o Orçamento do Rio em 2017 prevê despesas de pessoal em 74% da Receita Corrente Líquida (RCL), muito acima do limite de 60% da LRF. “Não se trata, como se vê, de situação de calamidade pública, mas sim de aspectos de desajuste nas contas públicas, principalmente pelo descumprimento dos limites da LRF com despesas de pessoal”, diz o banco na petição.
A instituição ainda argumenta que a “regra de ouro” do direito financeiro impede que as despesas correntes sejam financiadas com operações de crédito – justamente o que pretende o Estado do Rio, que quer usar o novo empréstimo para pagar salários atrasados.
“Não há dúvidas de que o Estado é obrigado a promover os direitos fundamentais, da mesma forma que, por outro lado, apresenta-se falacioso afirmar que em razão da referida atribuição constitucional possam ser flexibilizadas as disposições atinentes à responsabilidade fiscal”, diz o BB.
O jurídico do Banco do Brasil produziu uma peça de 39 páginas e se posicionou contra não apenas à liminar, mas a qualquer tipo de tutela antecipada dos termos do acordo, mesmo que referendada pelo plenário do STF.
Para a instituição financeira, não há motivos para se precipitar e demandar o afastamento de dispositivos da lei em vigor, já que o próprio acordo prevê que a União encaminhará projeto ao Congresso Nacional para criar as condições o arcabouço legal necessários.
O Banco do Brasil ainda cita sua autonomia e livre iniciativa para conceder ou não uma operação de crédito, que “dependerá da conveniência da instituição financeira sob o aspecto negocial, notadamente por se tratar de sociedade de economia mista regida pelas regras de direito privado e, consequentemente, protegida pelos princípios da autonomia na gestão, legalidade e livre iniciativa”.
“Ademais, é certo que a realização de operações de crédito pelo ente federado em um cenário onde se prevê redução nas receitas, conforme documentos acostados aos autos pelo próprio autor, apenas acarretará um ilusório alívio inicial, mas que não será sustentável, pois a dívida contraída deverá ser paga em data futura”, diz o BB.
Caixa
A Caixa Econômica Federal, por sua vez, mencionou incertezas jurídicas em relação à devolução do dinheiro pelo Estado do Rio caso a liminar não seja confirmada em plenário ou o acordo acabe sendo rejeitado pelo Congresso Nacional. Na peça, que tem nove páginas, a Caixa diz que a ação do Rio está calcada na situação de penúria financeira do Estado, “sem que haja um norte próximo e visível de superávit”.
“Isso quer dizer que, uma vez liberada qualquer quantia pelas instituições financeiras, por força de medida liminar, e não sendo a liminar ao final confirmada, o tomador do empréstimo devolverá apenas o principal (sem juros e demais encargos) e – o que é pior, não se sabe quando essa quantia será devolvida, diante da completa incapacidade financeira do ERJ, deslocando o prejuízo ao mercado financeiro”, argumenta a Caixa.
“Portanto, o risco recai totalmente sobre as instituições financeiras concedentes do mútuo, que serão fortemente impactadas pela insegurança jurídica trazida por uma ordem liminar precária, que venha a autorizar as tomadas de crédito”, acrescenta a instituição. Com isso, a Caixa pede que a liminar seja negada. Caso seja acatada pelo ministro Fux, que sejam “modulados os efeitos” de eventual revogação da liminar, que resultaria da nulidade da operação.