Em meio à disparada do dólar ante o real nas últimas semanas, o Banco Central surpreendeu o mercado financeiro e interrompeu o ciclo de cortes de juros no Brasil, iniciado em outubro de 2016. O Comitê de Política Monetária (Copom) do BC anunciou no início da noite da última quarta-feira, 16, a manutenção da Selic (a taxa básica da economia) em 6,5% ao ano. Foi a primeira manutenção após 12 decisões consecutivas de corte. A instituição também deixou claro que, nos próximos meses, manterá a Selic no nível atual.
O anúncio de ontem contrariou a maior parte dos economistas do mercado, que esperavam por um último corte da Selic. De 55 instituições financeiras consultadas pelo Projeções Broadcast, 53 projetavam corte de 0,25 ponto porcentual, para 6,25% ao ano, enquanto apenas duas – o Bank of America Merrill Lynch e a Flag Asset – esperavam pela manutenção da taxa.
A decisão do Copom foi surpreendente até porque, nas últimas semanas, o presidente do BC, Ilan Goldfajn, manteve a ênfase na inflação e na atividade como os principais fatores de influência sobre a política monetária. Em 8 de maio, último dia antes de os dirigentes do BC entrarem no período de “silêncio do Copom”, quando não são mais feitas declarações públicas sobre juros, Goldfajn havia reafirmado, em entrevista à GloboNews, que o Banco Central, “num regime de metas de inflação, olha para inflação, atividade; é isso o que importa na decisão”.
Para a gestora de renda fixa da Mongeral Aegon Investimentos, Patricia Pereira, a decisão do BC até tem respaldo nos fundamentos econômicos, mas Goldfajn induziu o mercado a apostar que haveria mais um corte. “Não fosse a entrevista, a aposta majoritária seria para manutenção dos 6,5%”, disse Patricia. “Isso afeta a credibilidade em relação às próximas comunicações.”
Na última quarta-feira, ao justificar a decisão de manter a Selic, o Copom afirmou que “o cenário externo tornou-se mais desafiador e apresentou volatilidade”. O BC pontuou que, com o processo de alta de juros em economias desenvolvidas, como os Estados Unidos, houve “ajustes nos mercados financeiros internacionais”. “Como resultado, houve redução do apetite ao risco em relação a economias emergentes.”
No Brasil, o fator mais visível desses ajustes foi a alta do dólar em relação ao real. Do fim de março até a sessão desta quarta-feira, a moeda americana disparou mais de 11%, para R$ 3,6755. Esse avanço do dólar, na visão dos economistas, vai, mais cedo ou mais tarde, ter impacto na inflação. Mas, como a atividade segue fraca, muitos profissionais avaliavam que a pressão da alta do dólar sobre os preços seria menor.
O BC, no entanto, deu peso ao movimento de alta do dólar em sua decisão. “Esses choques (externos) podem alterar o balanço de riscos ao reduzir as chances de a inflação ficar abaixo da meta no horizonte relevante”, defendeu a instituição. O aumento do dólar pode encarecer produtos e serviços importados consumidos no Brasil e pressionar a inflação. O Banco Central eleva ou reduz a Selic justamente para controlar a alta dos preços.
Cautela
“A decisão do Copom de manter a taxa, em vez de reduzir como havia indicado, demonstra viés cauteloso frente à depreciação do câmbio e à volatilidade dos ativos internos”, avaliou o economista-chefe do Santander, Maurício Molon.
“O BC foi extremamente prudente e responsável com o futuro. Se ele reduz a Selic nesta reunião, a possibilidade de saída de dólares do País ficaria maior e teríamos uma desvalorização ainda mais intensa do real”, afirmou Paulo Dutra, coordenador do curso de economia da Faap. Isso ocorreria porque o investimento estrangeiro no Brasil ficaria menos atrativo, num momento em que os EUA estão elevando sua taxa de juros.
Neste cenário, conforme Dutra, a divisa americana poderia chegar à casa dos R$ 4,00, pressionando também os preços internos. “O custo de produtos e insumos importados ficaria muito alto. Dependendo do tamanho do impacto, a medida de aumento da taxa de juros lá na frente, para compensar a alta dos preços, poderia ser muito maior do que a manutenção agora”, acrescentou. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.