O Relatório Trimestral de Inflação (RTI) divulgado nesta quinta-feira, 31, pelo Banco Central (BC) reforça a necessidade e tempestividade de ajuste fiscal. “Considerando que o ajuste fiscal também possui suas próprias defasagens entre a discussão e a adoção das medidas e seus resultados, quanto mais tempestiva for a implementação do processo em curso, mais rápida será a retomada de uma trajetória favorável para a dívida pública e para a confiança de famílias e empresas”, aponta.
Na avaliação do Comitê de Política Monetária (Copom), a geração de superávits primários contribui para criar uma percepção positiva sobre o ambiente macroeconômico no médio e no longo prazo, diminuindo o custo de financiamento da dívida pública. “Além disso, uma política fiscal mais contida repercutirá favoravelmente sobre o custo de capital de modo geral, o que, por sua vez, estimulará o investimento privado no médio e no longo prazo”, diz o texto.
O BC considera que os resultados fiscais têm ocorrido em velocidade inferior à inicialmente prevista e avalia como fundamental que seja mantida a determinação para a retomada de resultados primários positivos que, gradualmente, atinjam magnitude suficiente para estabilizar e, posteriormente, reduzir a trajetória do endividamento público como proporção do PIB.
Sobre a inflação, o Copom avalia que foram afetadas, ainda que em menor grau, pelo nível elevado da inflação corrente, pela dispersão de aumentos de preços, pelos efeitos residuais do processo de ajuste de preços relativos observado em 2015 e pelas incertezas quanto ao processo de recuperação dos resultados fiscais.
“Esses fatos constituem claro e importante sinal sobre a deterioração recente do balanço de riscos da economia, e demandam monitoramento para definição dos próximos passos na estratégia de política monetária”, afirma.
Negociações salariais
O RTI repetiu que um dos mecanismos que favorecem a persistência da alta de preços deriva da possibilidade de as negociações salariais atribuírem peso excessivo à inflação passada, em detrimento da inflação futura.
Desta forma, pontua a diretoria do BC, a dinâmica salarial permanece originando pressões inflacionárias de custos, não obstante o processo de distensão em curso no mercado de trabalho e a ocorrência de variações reais de salários mais condizentes com as estimativas de ganhos de produtividade do trabalho.
A autoridade monetária observa que a margem de ociosidade no mercado de trabalho encontra-se elevada, mas pondera a possibilidade de concessão de elevados aumentos de salários nominais também ter repercussões negativas sobre a percepção de sustentabilidade do balanço consolidado das contas do setor público.
“Neste ponto, cumpre registrar que a teoria – no que é respaldada pela experiência internacional – ensina que moderação salarial constitui elemento-chave para a obtenção de um ambiente macroeconômico com estabilidade de preços”, completa o documento.
Retirada de termo
O documento do BC repetiu a ata da última reunião do Copom e retirou a expressão “especialmente” ao citar que o colegiado deve ficar vigilante para garantir que pressões detectadas em horizontes mais curtos não se propaguem para horizontes mais longos.
No último RTI, de dezembro, a diretoria do BC avaliava que a política monetária deveria permanecer “especialmente vigilante”.
O documento repete que riscos baixos para a inflação subjacente no curto prazo tendem a potencializar os efeitos das ações de política monetária, fazendo com que elas possam afetar, de forma mais duradoura, a dinâmica da inflação plena no futuro.
Demanda agregada
O Relatório Trimestral de Inflação passou a dizer que a expansão da demanda agregada está “mais favorável” a crescimento potencial. No relatório anterior, a autoridade monetária se limitava a dizer que há espaço para uma composição e ritmo do crescimento no médio prazo em direção ao crescimento potencial. A ata da última reunião do Copom já trazia a expressão “mais favorável”.
Neste parágrafo, o BC incluiu que é importante perseverar na promoção de reformas estruturais de forma a assegurar a consolidação fiscal em prazos mais longos.
Para o BC, o cenário central contempla inflação ainda elevada, em decorrência do processo de ajustes de preços relativos ocorridos em 2015, bem como do processo de recomposição de receitas tributárias observado nos níveis federal e estadual, no início deste ano, combinada com ritmo de expansão da atividade inferior ao inicialmente previsto. São ainda aspectos relevantes, segundo o relatório, os impactos nos preços dos ativos de incertezas quanto ao processo de recuperação dos resultados fiscais e sua composição, “especialmente após novo rebaixamento, em fevereiro, da nota de crédito dos títulos soberanos brasileiros por uma agência de avaliação de risco”.
Sobre o cenário internacional, a autoridade monetária destaca que, desde o Relatório anterior, a atividade global mostrou tendência de maior moderação ao longo do horizonte relevante para a política monetária. “A esse respeito, as evidências apontam taxas de crescimento mais modestas e abaixo do crescimento potencial nas economias maduras” diz.
O BC ressalta ainda as incertezas quanto aos desdobramentos da perda de dinamismo na China e suas implicações para a economia mundial. “Nos mercados internacionais, as perspectivas indicam moderação na dinâmica dos preços de commodities”, avalia.
Petróleo
No documento, a autoridade monetária destaca ainda que o aumento das incertezas geradas pelos baixos preços do petróleo e suas implicações para empresas do setor e Países produtores, bem como para os mercados financeiros em geral, geram riscos para a estabilidade financeira global.
“Sobre o petróleo, o Comitê assinala que, independentemente do comportamento dos preços domésticos da gasolina, a evolução dos preços internacionais tende a se transmitir à economia doméstica por meio de cadeias produtivas, como a petroquímica, quanto por intermédio das expectativas de inflação”, avalia.
Boxes
O RTI trouxe um boxe que detalha evidências de que o repasse do câmbio aos preços de importação de bens manufaturados foi incompleto e decrescente nos últimos anos.
De acordo com a autoridade monetária, esse menor repasse, aliado à desaceleração dos preços ao consumidor em escala mundial e ao ritmo decrescente da atividade doméstica, contribuiu para que o aumento dos preços de importação em reais fosse inferior à depreciação cambial a partir de meados de 2014.
O boxe mostra que os preços de importação de bens manufaturados, em reais, cresceram 59,4% de julho de 2014 a dezembro de 2015, enquanto a depreciação nominal do real atingiu 74,0%. Ou seja, houve um recuo de 8,4% nos preços mencionados em dólar no período.
O documento conclui ainda que o recuo dos preços de importação de manufaturados em dólar contribuiu para reduzir a inflação de bens comercializáveis do IPCA desde abril de 2013, contrabalançando os impactos da depreciação cambial em períodos específicos.
As diferentes ações de política monetária dos bancos centrais nos últimos meses evidencia o aumento recente da influência da complexidade do ambiente internacional sobre as decisões de política monetária. A avaliação faz parte de outro boxe do Relatório Trimestral de Inflação com o título “Políticas Monetárias Assimétricas: das taxas negativas na Europa e no Japão aos movimentos de alta na América Latina”.
O boxe descreveu as ações mais recentes de política monetária adotadas por bancos centrais de importantes economias maduras e emergentes. Houve utilização (alguns casos intensificação) de taxas negativas de juros na Europa e no Japão; gradualismo na normalização da taxa de juros nos Estados Unidos da América (EUA); e adoção de posturas mais contracionistas na América Latina.
Hiato do produto
O Relatório Trimestral de Inflação citou novamente que, em termos de conjunto de indicadores de ociosidade da economia, medidas convencionais de hiato do produto encontram-se em território desinflacionário.
Segundo a diretoria do BC, isso está em linha com as taxas recentes de expansão da atividade, mais baixas que o inicialmente previsto. Por isso a autoridade monetária avalia que essas medidas de hiato tendem a permanecer em território desinflacionário nos próximos trimestres.