A presidente do Banco Central Europeu (BCE), Christine Lagarde, afirmou que as projeções e dados mais recentes permitiram que a instituição cortasse os juros em 25 pontos-base em sua última reunião, mas renovou o alerta de que esse processo de relaxamento "não é linear" nem será determinado a priori, dependente da análise dos dados e do cenário em geral a cada reunião. Ela falou em painel organizado pelo próprio BCE em Sintra, Portugal, ao lado do presidente do BC brasileiro, Roberto Campos Neto, e do presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central americano), Jerome Powell.
Lagarde previu que a inflação em um ano na zona do euro deve estar em "pouco mais de 2%", mas também projetou que haverá sobressaltos, além de renovar em mais de um momento de sua participação a postura cautelosa, com reavaliação do quadro a cada reunião, nas próximas decisões de juros, levando em conta as decisões de outros bancos centrais, como obviamente o próprio quadro na zona do euro.
A dirigente considerou que a inflação de serviços na região ainda está em nível elevado, mas também recordou que ela não precisará cair até 2%, pois a de bens mostra mais fraqueza e as duas podem se equilibrar, para o índice geral ficar na meta. De qualquer modo, Lagarde se disse bastante atenta aos componentes da inflação de serviços e as razões desse nível atual, além de recordar que a inflação no mês passado veio mais baixa que a anterior, "o que é bom", com o BCE "bastante avançado" na trajetória de desinflação almejada.
Na atividade econômica, Lagarde disse esperar que a recuperação persista, mas também disse vê "muitas incertezas", por isso o foco em avaliar os dados. As projeções e os indicadores permitiram o corte de 25 pontos-base nas últimas reunião e a expectativa recente do BCE é que a inflação chegue à meta de 2% no quarto trimestre de 2025. Ao comentar o desemprego, disse esperar que a taxa siga no nível atual, na zona do euro, em meio a recordes de baixa nesse indicador.
Lagarde lembrou também que o ciclo anterior de alta de juros foi "sem precedentes", em meio a variados choques. Ela disse que o BCE continua a monitorar riscos "o tempo todo", entre eles os geopolíticos no seu entorno.
Ao ser perguntada sobre o processo eleitoral na França e seus riscos, Lagarde se recusou a entrar nesse assunto. "Nosso mandato é estabilidade de preços e faremos isso", garantiu. Ao mesmo tempo, admitiu que a questão fiscal "importa enormemente", mas lembrou que já há um arcabouço na zona do euro para controlar essa frente. A presidente do BCE disse que as regras fiscais precisam ser respeitadas, nesse contexto.
Ao ser questionada sobre o quadro no comércio global e seus efeitos na política monetária, Lagarde disse que não vê agora a aplicação de tantas tarifas como oito anos atrás e que esse fator parece mais estável. Por outro lado, há uma crescente preocupante de medidas de proteção comercial, acrescentou.
Em outro momento do painel, Lagarde disse que o BCE tem usado inteligência artificial (IA) em seu trabalho, "buscando um ambiente seguro" e evitando "ficar reféns" de empresas que desejam dados confidenciais, afirmou. Segundo ela, a IA é usada em modelos, bem como na mineração de linguagem em dados não estruturados. O impacto da IA no crescimento, no emprego e na produtividade "ainda está por ser determinado", ponderou.