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Bebês são resfriados para evitar sequelas

Depois de dar à luz três crianças, a doméstica Julia Rose Alves da Silva Sapucaia, de 31 anos, considerava-se uma especialista em cuidados básicos com recém-nascidos. “A primeira coisa que a gente faz na gravidez é comprar bastante roupinha para agasalhar o bebê quando nasce. Ele não pode perder calor”, pensava ela. Mas com Lorenzo, seu quarto filho, aconteceu o contrário. Logo após ser retirado do útero da mãe, no dia 10 de maio de 2016, o menino foi levado para a UTI neonatal da Santa Casa de São Paulo para ser resfriado, ou seja, ter a temperatura corporal reduzida. O procedimento era a aposta dos médicos para salvar a vida do menino. E deu certo.

Por complicações na gravidez de Julia, Lorenzo ficou sem oxigenação no momento do parto. A condição, chamada de encefalopatia hipóxico-isquêmica, pode provocar a morte da criança ou deixar sequelas neurológicas graves, como paralisia cerebral. No caso de Lorenzo, ambos os desfechos foram evitados pela técnica de hipotermia terapêutica neuroprotetora, procedimento em que o recém-nascido tem sua temperatura corporal reduzida para 33 a 34°C – 3 graus abaixo da normal – como forma de frear as lesões cerebrais iniciadas na asfixia ocorrida no parto.

“Por meio da técnica, conseguimos diminuir o metabolismo do bebê e, com isso, reduzir a liberação de substâncias que aumentariam as lesões cerebrais provocadas pela privação de oxigênio no momento do nascimento”, explica Mauricio Magalhães, chefe do setor de neonatologia da Santa Casa e professor da Faculdade de Ciências Médicas da instituição. O resfriamento é feito por meio de um colchão ou bolsa térmica e o bebê passa por monitoramento cerebral durante todo o período.

Para que o procedimento tenha sucesso, ele deve ser iniciado em até seis horas após o parto e a criança deve ser mantida em temperatura mais baixa por três dias. “Após a hipotermia, o bebê vai sendo reaquecido lentamente, em cerca de meio grau por hora”, diz Magalhães, um dos pioneiros a trazer a técnica ao Brasil, em 2009. Hoje, outros hospitais e maternidades de São Paulo realizam o procedimento, como São Luiz, Santa Joana e Albert Einstein.

A Santa Casa acaba de completar a marca de cem bebês submetidos ao procedimento. Apenas 3% deles não resistiram às complicações do parto e 2% desenvolveram sequelas neurológicas mesmo passando pela hipotermia, índice muito abaixo do registrado entre crianças que não foram resfriadas.

Segundo Magalhães, o índice de bebês com quadro de encefalopatia hipóxico-isquêmica que morrem após o parto chega a 25% quando a hipotermia não é realizada. E entre os que sobrevivem, até 75% podem ter algum dano se a intervenção não é feita. “A técnica reduz o risco de sequelas, mas, infelizmente, no Brasil, somente 5% dos bebês nascidos com a condição são submetidos ao procedimento”, afirma o especialista.
Confiança nos médicos. No caso do bebê Lorenzo, hoje com 11 meses, a mãe conta que estranhou ao vê-lo “gelado e só de fraldinha” na UTI, mas diz que “confiou nos médicos” pois sabia que aquela era a única opção para evitar o pior.

“O quadro dele era muito grave. Ele foi entubado. Naquele momento eu nem estava pensando em possíveis sequelas, eu tinha medo de ele nem sequer sobreviver”, conta Julia.

Hoje, os médicos até se surpreendem com o desenvolvimento do menino, que tem alcançado algumas habilidades em um prazo mais rápido do que outras crianças da sua idade. “Ele não ficou com nenhuma sequela, é muito esperto e ativo e começou a andar com 8 meses”, conta a mãe, orgulhosa.

Miguel, hoje com 2 anos e 7 meses, foi outro bebê a ficar sem nenhuma sequela, mesmo após passar cinco minutos sem oxigênio no momento do nascimento. “Talvez ele teria tido outro destino se nascesse em um hospital que não adota a hipotermia porque, se cinco minutos é muito tempo para alguém ficar sem ar, imagina para um bebezinho”, diz a atendente Diane Rodrigues da Silva, de 26 anos, mãe do menino.

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