A concessionária Norte Energia, dona da hidrelétrica de Belo Monte, desistiu de seu plano de queimar mais de 3,5 mil metros cúbicos de madeira, dos quais mais de 2 mil m³ são espécies nobres e protegidas por lei federal, material que encheria 120 caminhões de toras. A desistência ocorre após o plano da companhia ser revelado pelo Estadão e já foi informada pela empresa ao Ibama.
Por meio de documento enviado ao órgão federal na segunda-feira, a dona da hidrelétrica em operação no Pará solicitou a "suspensão da consulta acerca da destinação da madeira situada nos pátios da UHE (usina hidrelétrica) Belo Monte para a produção de biorredutor energético destinado ao processo fabril de siderurgia".
Na reportagem, publicada na última quarta-feira, o <b>Estadão</b> detalhou que a Norte Energia havia pedido, no dia 1º de setembro, o "uso de madeira para fins energéticos". Nesse pedido, a Norte Energia afirmava que fez um levantamento das "condições físicas dos estoques de toras nos pátios" da usina, entre dezembro de 2020 e abril deste ano, e chegou à conclusão de que possui "3.502,40 m³ de toras de madeira, estocadas, que ainda apresentam condições de utilização".
O objetivo era usar o material para alimentar os fornos da siderúrgica Sinobras, uma das sócias da Norte Energia. "A empresa Sinobras (Siderúrgica Norte Brasil S.A.) contatou a Norte Energia, demonstrando interesse no aproveitamento de toda a madeira situada nos pátios da usina Belo Monte para a produção de biorredutor energético, destinado ao processo fabril de siderurgia da empresa", dizia a concessionária no documento.
A Norte Energia é uma concessionária formada por empresas do Grupo Eletrobras (49,98%), fundos Petros e Funcef (20%), Neoenergia (10%), Vale e Cemig (9%), Light e Cemig (9,77%), Sinobras (1%) e JMalucelli Energia (0,25%).
Questionada ontem sobre sua decisão, a Norte Energia afirmou que "decidiu reavaliar o destino do remanescente de produtos madeireiros objeto da consulta recente ao órgão licenciador" e confirmou que a suspensão da consulta já foi informada ao Ibama. "É importante esclarecer que a maior parte da madeira protegida por lei extraída para a implementação da usina tem sido utilizada em múltiplas ações sociais, que beneficiam moradores de comunidades na área de influência da usina, tais como ribeirinhos e comunidades indígenas, na construção e reforma de pontes, escolas, postos de saúde, equipamentos de lazer, entre outros", declarou a empresa.
<b>Reação</b>
Após a publicação da reportagem sobre o plano da concessionária, o governo do Pará reagiu com indignação e afirmou que adotaria medidas para evitar que o material fosse transformado em cinzas. "O governo do Pará informa que toma conhecimento do caso através da denúncia do jornal <b>O Estado de S. Paulo</b> e que considera inadmissível esta agressão aos nossos recursos naturais." Acrescentou que "vai buscar, por meios legais, receber as madeiras para dar uma destinação social".
Na semana passada, a Norte Energia foi questionada sobre o plano para queimar o material, bem como sobre a reação do governo do Pará, mas não se manifestou a respeito.
O inventário das madeiras depositadas no entorno da hidrelétrica também revelou que, além dos 3,5 mil m³ de toras que se pretendia queimar, há um volume de material que apodreceu. São 18.497 metros cúbicos de madeira tidos como não aproveitáveis.
A retirada total da vegetação em Belo Monte, em 2015, teve o propósito de dar espaço ao reservatório de 478 quilômetros quadrados criado no Rio Xingu, além do canal artificial de mais 20 quilômetros da hidrelétrica, estruturas que afetaram diretamente os municípios de Altamira e Vitória do Xingu.
A remoção da vegetação foi autorizada pelo Ibama, com acompanhamento das autoridades responsáveis. Por lei, porém, todo material extraído tem de ser catalogado e destinado, seja via doações ou utilização na própria obra. Ocorre que milhares de troncos estão há mais de seis anos apodrecendo a céu aberto.
Nos bastidores, há relatos de que o excesso de burocracia dificulta a destinação do material. "Existe dificuldade de prefeituras e outros interessados de retirar e transportar tal madeira, especialmente por conta do valor de fretes cobrados por terceiros", informou o Ibama.
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>