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‘Belos Sonhos’ inaugura evento que terá mais de 300 filmes

Há menos de duas semanas – no domingo, 9 -, em entrevista ao jornal “O Estado de S. Paulo”, Renata de Almeida disse que uma Mostra com homenagens a Marco Bellocchio e Andrzej Wajda só poderia ser política. O que ela não sabia é que, justamente naquele fim de semana, Wajda estava morrendo em Varsóvia, aos 90 anos. A homenagem da Mostra para ele virou póstuma. A de Bellocchio terá nesta quarta-feira, 19, o autor na tela, com a exibição de Fai Bei Sogni para convidados, no Auditório Ibirapuera, e, a partir de sexta, 21, na cidade, para múltiplas atividades. Bellocchio vem ministrar uma masterclass, participar de debate – com o crítico do Estado, Luiz Zanin Oricchio – e ainda vai apresentar as sessões de seus filmes no fim de semana.

Seus filmes, no plural. Porque a Mostra não exibe apenas o programa duplo formado pelo longa Belos Sonhos e o curta operístico Pagliacci/Palhaços. Promove a revisão também de clássicos como De Punhos Cerrados e A China Está Próxima, que marcaram a explosão de Bellocchio nos anos 1960, e segue mostrando uma fase mais recente, com obras como Bom-Dia Noite, Vencer e Irmãs Jamais, todos dos anos 2000. No total, 12 filmes. Grande Bellocchio. De todos os diretores de sua geração, ele não só é um sobrevivente como permanece guerreiro, fazendo um cinema crítico e contestador. Isso tem lhe valido não poucos dissabores. Há alguns anos, tentaram – alguns críticos menores – desautorizar sua obra, porque os filmes, em parceria com a Rai Cinema, sem a qual não existiria cinema italiano contemporâneo, o comprometeriam com Silvio Berlusconi.

Fai Bei Sogni, Tenha Belos Sonhos, ou somente Belos Sonhos. Bellocchio estreou seu longa em maio, na Quinzena dos Realizadores do Festival de Cannes, que também o homenageou. A apresentação, na abertura, foi um acontecimento. Belos Sonhos possui elementos de outros filmes do diretor. Algo da revolta de De Punhos Cerrados, ou o clima de O Sorriso de Minha Mãe, de 2002. Mas se destaca como talvez o filme mais emocional (emocionante?) de Bellocchio nos últimos anos. Pode ser que isso se deva ao fato de ser uma adaptação – do relato autobiográfico do jornalista Massimo Gramellini. Bellocchio se apropriou dessa história para fazer dela um relato pessoal. Seus temas estão todos presentes – famílias disfuncionais, carência materna. E a sua vontade – sempre – de dar um testemunho sobre a história da Itália.

O filme começa contando a história de um garoto e sua mãe. Ela morre, e há um segredo envolvendo essa morte, que vai ser desvendado ao longo da narrativa. Massimo cresce, vira homem. A Itália muda com ele. Bellocchio vale-se do futebol, de informações que passam pela TV. O fervor da massa torcedora do Torino em 1969, uma imagem de Raffaella Carrà dançando na TV. Toda a Itália vai abrindo seus segredos nesses detalhes. Vai ser uma belíssima abertura para a Mostra, que completa 40 anos. Nos próximos dias, e até 2 de novembro, serão apresentados 322 filmes de 50 países em 42 salas de 35 pontos de exibição pela cidade de São Paulo. Muitos filmes novos, inéditos, centenas deles. A competição de novos diretores. Os tesouros restaurados. As retrospectivas de Bellocchio, Wajda e William Friedkin, que também virá à cidade para uma masterclass.

Na sua 40.ª edição, a Mostra tem tanta história que se pode dar ao luxo de ser autorreferente. Em homenagem a Hector Babenco, exibe o longa de estreia do diretor, que venceu a 1.ª Mostra – Lúcio Flávio, o Passageiro da Agonia. Traz a íntegra do Decálogo, de Krzysztof Kieslowski. E, para acompanhar Elle, o novo e sensacional thriller de Paul Verhoeven, resgata um filme antigo de 1983, Quarto Homem. O cinéfilo já sabe. A Mostra é uma imensa festa de cinema. Mudou a forma de se ver cinema no Brasil. E mantém, na 40.ª edição, os conceitos estabelecidos por seu criador, Leon Cakoff, morto em 2011. Respeito à diversidade, uma aposta radical no novo. Você compra o ingresso, entra não importa em que sala. O filme vai valer a pena. E todos os programas serão precedidos pela vinheta criada a partir do cartaz desenhado por Marco Bellocchio. Wajda, ele. Os srs. Política, na Mostra também política.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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