Um grupo de 461 diáconos, bispos e padres da Igreja Católica divulgou um manifesto contra o projeto de lei que equipara o aborto realizado após 22 semanas de gestação ao crime de homicídio. Em caso de aprovação do projeto, a lei passaria a criminalizar até aquelas que recorrem à interrupção da gravidez após sofrerem estupro.
O coletivo Padres da Caminhada diz que não é favor do aborto, mas contra "a substituição de políticas públicas por leis punitivas às vítimas de estupro e abuso, imputando-lhes um crime seguido de pena maior do que o dos estupradores".
Segundo o manifesto, o Projeto de Lei do Aborto "acarreta a grave consequência de penalizar as mulheres pobres que não podem sequer usar o sistema público de saúde".
"Esta vingança social acarreta a grave consequência de penalizar as mulheres pobres que não podem sequer usar o sistema público de saúde. Ademais, a criminalização das mulheres não diminui o número de abortos. Impede apenas que seja feito de maneira segura", diz um dos trechos do manifesto.
Em outro trecho, os religiosos dizem que "criminalizar uma mulher vítima de estupro e abuso é violentá-la novamente".
"Que nossos legisladores sejam sinceros e tenham discernimento para perceber a condição sofredora da imensa maioria do povo brasileiro, particularmente das mulheres, e abraçá-las e protegê-las com a mais profunda humanidade. Que tenham sensibilidade para perceber que nossas ruas estão ensanguentadas e nossa infância abandonada e, consequentemente, não elaborem projetos eleitoreiros perversos, brincando com vidas humanas pobres, desvalidas e invisíveis", dizem.
Atualmente, o aborto é permitido em três situações no Brasil: quando a mulher corre risco de morte e não há outro jeito para salvá-la, em casos de fetos com anencefalia (ausência de cérebro ou de parte dele) e em casos de estupro. Mesmo com a previsão legal, casos em que pessoas recorrem ao direito e enfrentam dificuldades para acessá-lo são recorrentes.
Segundo o Código Penal, não há punição para quem realiza o aborto quando a gravidez for resultante da violência sexual, e o procedimento pode ser feito sem restrição de tempo. Também não são punidos os casos em que realizar o aborto é a única forma de salvar a vida da gestante.
Com exceção desses dois casos, a legislação vigente prevê penas para as gestantes e para os médicos ou outras pessoas que provoquem o aborto. Para as pessoas grávidas, o Código prevê a detenção de um a três anos, enquanto para os terceiros, de um a quatro anos caso provoquem o aborto com o consentimento da gestante, e de três a 10 anos nos casos em que a grávida não tenha consentido.
Na prática, o novo texto propõe que o aborto legal seja criminalizado acima de 22 semanas, em todos os casos previstos. A pena aplicada passaria a ser equivalente a de homicídio simples, de seis a 20 anos de reclusão, inclusive nos casos de estupro. Atualmente, a pena média para estupradores é de 6 a 10 anos.