Você já ouviu falar da “Blue Monday” (segunda-feira triste, em inglês)? Supostamente, esta segunda-feira é “o dia mais triste do ano”, um termo criado pelo psicólogo Cliff Arnall, em 2004, tendo por base um conjunto de fatores: a meteorologia, as dívidas acumuladas, o tempo desde o Natal, as falhas nas resoluções do Ano Novo e a distância até ao pagamento do próximo salário.
O especialista tinha sido desafiado por uma agência de viagens – a Sky Travel – a encontrar o melhor dia para as pessoas marcarem as férias de verão. O objetivo seria lançar uma promoção nesse dia e alcançar o valor mais alto de vendas. Perante as conclusões do psicólogo, a empresa acabou por utilizar o termo “Blue January” (janeiro triste, em inglês) na campanha publicitária.
Os “cálculos” de Cliff Arnall tiveram origem em dados recolhidos pelo psicólogo, como explicou numa entrevista ao The Daily Telegraph publicada em 2010.
“Inicialmente pediram-me para pensar qual o melhor dia para marcar férias de verão, mas quando comecei a pensar nos motivos para marcar férias, refletindo sobre o que milhares de pessoas me disseram durante os workshops de gestão stress e de felicidade, havia fatores que apontavam para a terceira segunda-feira de janeiro como sendo particularmente depressiva.”
Apesar de ter sido o criador, na altura desta entrevista, Cliff Arnall negava a teoria da Blue Monday, afirmando que os cálculos são pseudociência. O psicólogo chegou mesmo a apelar aos britânicos que “refutem todo o conceito”.
Também o neurocientista Dean Burnett escreveu, num artigo do The Guardian, que estas equações são “uma farsa”. “Mesmo que a maioria destas medidas não fossem absurdas (como é que determinamos a motivação de toda a população?), elas não são compatíveis. Como é que combina quantitativamente ‘o tempo após o Natal’ com a ‘meteorologia’? Não é possível”, afirma.
“E aqui vai o mais importante: existe mesmo um dia mais depressivo do ano? Não. Não, não, não. No. Na. Nein. Non. Nyet. Mhai. Illai. Não. Nee. Ne. Nope. Negatory. Nada. Nem pensar, José. Nil. Nu. Nie. Bu Dui. Iie. Nem. Nullus. Nej. Neen. E caso alguém que fale Klingons leia isto, Ghobe!”
Além do “dia mais triste do ano”, Cliff Arnal calculou também o dia mais feliz: a terceira sexta-feira de junho. Segundo Cliff Arnall, o “cálculo” tem como base as variantes interação social, memórias infantis das férias de verão, possibilidade de sair de casa, o bom tempo e excitação pelas férias.
Um dia triste ou a banalização da depressão?
O conceito de Blue Monday foi criado com o objetivo publicitário e continua a ser usado com esse intuito. No entanto, a utilização deste termo poderá ser considerada sensacionalista e ter um efeito redutor perante os problemas de saúde mental que as pessoas enfrentam. Segundo a Organização Mundial de Saúde, estima-se que 5% dos adultos sofra de depressão.
Stephen Buckley, chefe de informação na instituição de caridade para a saúde mental Mind, alerta que as campanhas publicitárias que se focam na Blue Monday podem contribuir para banalização dos riscos da depressão.
“Um em cada seis de nós irá experimentar depressão em algum momento da vida, e isso pode ter efeitos devastadores em todas as partes da nossa vida”, afirma, em declarações ao The Independent . “Pode deixar uma pessoa sem conseguir dormir, a sentir-se desconectado com os outros e a experienciar pensamentos de suicídio”, acrescenta.
Apesar de reconhecer que algumas das variáveis do “cálculo” possam ter impacto no aparecimento de pensamentos negativos, Stephen Buckley alerta que essa tristeza não deverá ser confundida com uma situação de depressão clínica.
“Ao sugerir que todas as pessoas podem sentir-se deprimidas num único dia, corremos o risco de menosprezar as experiências daqueles que vivem com a doença grave”, afirma.